Do luxo ao lixo.

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Júlio Narrando.


Eu queria ter algo bem legal para dizer aqui. Falar que eu superei o luto de forma amigável e que meu namoro com a pseudo-amor-da-minha-vida estava dando certo. Que o meu irmão não tinha faltado nenhuma aula e que eu estava trabalhando.

Mas nenhuma dessas coisas haviam acontecido.

A dor do luto da minha mãe era insuportável e superar estava tão insuportável quanto.

Depois de duas semanas – bem bostas, devo acrescentar. O Caio disse que não conseguia mais me manter no emprego e eu aceitei de bom grado a demissão. Meu irmão não ia a aula há duas semanas e ao invés de brigar com ele por um futuro importante, eu estava grato por não ser o único naquela casa que sentia tanta dor que fazer qualquer outra coisa se tornava desnecessário.

Não tinha ninguém pra mandar fazer as coisas que eu tinha que fazer.

Que sentido fazia fazer algo sem a minha mãe?

Na sexta-feira eu acordei quase três horas da tarde com um cheiro de comida invadindo meu quarto.

Imaginei que tivesse sido o João tentando cozinhar algo e me forcei a ficar de pé para ver se ele não estava botando fogo na casa.

Me arrastei pelo quarto até e porta e deixei a mesma aberta enquanto descia as escadas.

- Você tá estragando a única carne que a gente tem no freezer...? – minha frase morreu ao notar a mãe da Alice parada na beira da pia enquanto picava um legume.

Meu segundo susto foi ver que a cozinha estava limpa.

Nada de louça na pia e nem pizzas estragadas jogadas pela mesa e nada disso.

Estava tudo organizado e limpo.

- Bom dia. – disse a Alice passando por mim com uma pilha de roupas e sumindo pela lavanderia.

- O que vocês estão fazendo aqui? – perguntei encarando a Heloísa que se virou para me olhar.

- Bom, nós viemos limpar. – disse como se fosse óbvio.

- Eu ia limpar. – falei baixo enquanto via-a jogar os legumes na água e se virar pra mim.

- Claro que ia. – disse me olhando. – mas nós viemos antes. – falou como se fosse óbvio.

- Pronto, terminei de lavar as últimas roupas. – disse a Alice.

Esfreguei o rosto com as minhas duas mãos.

- Vocês não podem...

- Você tem que deixar esse teu orgulho de lado! – disse a minha namorada me lançando um olhar irritado. – você precisa de nós! Nós somos a sua família, a Júlia ia nos querer aqui, Júlio. De algum jeito, ela confiava em nós para cuidar de vocês.

Encarei a Alice enquanto ela falava.

- Parece ótimo pra mim. – disse o João entrando na cozinha e pegando um copo de água no escorredor.

Eu me virei para voltar para o meu quarto, irritado demais para discutir.

Quando passei pela porta, eu sabia que estava sendo seguido de perto pela Alice e não me virei para olha-la.

- Qual o problema? – perguntou encostando a porta atrás de si.

- Quem te deu permissão para entrar na minha casa e...

Ela me interrompeu.

- Limpar? – perguntou ironicamente. – bom, eu achei que viver em um chiqueiro não era a solução!

A Dama e o VagabundoOnde histórias criam vida. Descubra agora