20- Amar mais depressa

4 0 0
                                    

          Desceu pelo corrimão para amar mais depressa, - brinca comigo, por favor? - o infantário todo disponível e os olhos dele na maneira como ela pegava nos legos, queria brincar com ela, não sabe porquê, não imagina porquê, mas algo puxa o pequeno menino para a pequena menina,
há sempre algo que nos puxa para as mais pequenas coisas do mundo, e são elas que nos fazem grandes, não é?,
a educadora sorri, apetece-lhe não esquecer mais esta imagem, a ternura dele a pegar na mão dela, o amor é bonito desde que começa, uma casa gigante a ser construída por blocos de todas as cores, de todos os tamanhos, ela olha-o a medo, esboça um sorriso, passa-lhe mais uma peça, - toma, é para ti - e acaba de produzir a mais pura declaração de amor que o ser humano consegue produzir, - toma, é para ti - ele aceita e constrói, mesmo que sejam os dois já a construir, - brinca comigo, por favor? - e ela disse que não, e brincou.

          Desceu pelo corrimão para amar mais depressa, - lê comigo, por favor? - um pedido desesperado e feliz, só uma criança consegue um estado de desespero feliz, são as primeiras letras que escrevem e deviam ser, se eles soubessem como se des...

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

          Desceu pelo corrimão para amar mais depressa, - lê comigo, por favor? - um pedido desesperado e feliz, só uma criança consegue um estado de desespero feliz, são as primeiras letras que escrevem e deviam ser, se eles soubessem como se desenha um «m», por exemplo, amo-te, não são, ainda não são, daqui a nada talvez, para já são palavras mais simples, ele ao lado dela, não lhe agarra na mão e não lhe indica o caminho do «a» porque não pode, a professora não deixa, mas já se olharam sete ou oito vezes nos últimos minutos, nada ficou por dizer, nunca fica, - queres vir comigo até ao final do abecedário? - há um dicionário completo para conhecer, a felicidade se não é isto é algo muito parecido com isto, - lês comigo, por favor? - e ela disse que não, e leu.

          Desceu pelo corrimão para amar mais depressa, - descobres comigo, por favor? - tocaram-se ao de leve no corredor, o braço esquerdo dela no braço direito dele, ou se calhar foi ao contrário, o braço esquerdo dele no braço direito dela, nã...

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

          Desceu pelo corrimão para amar mais depressa, - descobres comigo, por favor? - tocaram-se ao de leve no corredor, o braço esquerdo dela no braço direito dele, ou se calhar foi ao contrário, o braço esquerdo dele no braço direito dela, não se sabe quem tocou em quem, sabe-se que os dois sentiram o toque como se conhecessem de repente o começo da pele, dois ou três milímetros, meio segundo, não mais, e as veias mais dilatadas do que nunca, a secundária não imagina, mas duas pessoas acabaram de nascer ali, há partes do corpo que surgem do nada, estímulos mentais absurdos, uma conclusão filosófica só ao alcance dos génios, ou dos parvos, - o sentido da vida é de mim para ti - nenhum o diz mas ambos o ouvem, muitos passam anos à espera de uma revelação assim, o corredor cheio, os grupos, as borbulhas, as ansiedades, os pânicos, as invenções, as angústias, o medo disparatado de uma vida pela frente, - descobres comigo, por favor? - e ela disse que não, e descobriu.

Apenas EuOnde histórias criam vida. Descubra agora