Capítulo 6

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A viagem de ônibus parecia que iria durar pra sempre. O fato de eu estar sem celular , notebook ou qualquer outro eletrônico que pudesse me ajudar a passar o tempo, não ajudou em nada o meu mau humor. 

A senhora ao meu lado roncava alto e eu constantemente tinha que lhe dar um cutucão para que saísse de cima de mim e parasse de  babar enquanto dormia no meu ombro. Já não bastava aquela cadeira desconfortável e aquele ar condicionado que hora funcionava, hora não. 

Processar o que tinha acontecido nas últimas horas era um trabalho árduo que eu tinha quase desistido de fazer. Lucas tinha falado para minha família que eu neguei por meses dinheiro para o tratamento da sua mãe doente . Meu pai ficou enfurecido comigo e me colocou num ônibus rumo a Parnaí com nada além de algumas roupas (que eu consegui colocar na mala nos dez minutos que ele me deu enquanto fiscalizava o que eu poderia levar ou não.)

A nossa viagem que deveria ser em família, de carro e só daqui a alguns dias se tornou uma "oportunidade para que eu pudesse valorizar a vida", segundo as palavras do meu pai. Eu nem tinha certeza se meus tios poderiam me receber, meu pai estava tão furioso que quando eu perguntei  sobre isso , ele disse que resolveria tudo durante as minhas 22 horas de viagem até Parnaí.

Graças a Deus minha mãe conseguiu contrabandear algumas notas de cem para o bolso da minha mochila enquanto me abraçava, se não fosse isso, eu não teria nem como comer nas paradas dessa viagem dos infernos e ter algum dinheiro para voltar caso fosse necessário. 

O ônibus parou num posto e o motorista avisou que teríamos 30 minutos. 

- Desculpa, falta muito ainda para chegarmos? - Perguntei para o ele enquanto esticava as pernas do lado de fora do ônibus. 

- Você vai saltar aonde? - Ele me respondeu enquanto acendia um cigarro.

- Parnaí 

- Você tem pelo menos umas 18 horas ainda pela frente. 

- Você está brincando comigo? Parece que eu passei dois dias nesse ônibus já. 

- Por que você não compra um comprimido para dormir no posto? Quem sabe você apaga e perde algumas horas.  

Não era um má ideia.  O atendente da lojinha do posto me indicou um balcão cheio dos mais variados remédios. De dor de cabeça a enjoo. 

- Eu quero algo para dormir. Você tem Dramin? - Perguntei para o atendente que parecia estar apenas meio acordado. 

- Tenho.. mas se você quer mesmo dormir devia tentar esse  - Disse ele apontando pra um envelope com o nome "Mata leão" e o desenho de um leão dormindo feliz.

-  É seguro? - Perguntei meio preocupado que aquele remédio poderia literalmente "matar um leão". 

- Nunca ninguém reclamou. Eu tomo um desses e durmo direto por umas 10 horas. 

- Vou levar dois. 

Peguei os envelopes, comprei uma água, um pacote de biscoito e taquei os dois comprimidos para dentro. O remédio funcionava mesmo, pois a última coisa que eu me lembro é de ver a lua e achar graça quando o motorista avisou que estávamos de saída. 

.........

Eu abri os olhos com preguiça e de repente parecia que o tempo não tinha passado nada. Mas como era possível? Eu tinha sonhado com tantas coisas. Os olhos verdes de Lucas , meu pai me vendo afogar no mar e não atendendo aos meus pedidos de socorro, eu indo para a escola pelado, um casebre de madeira , bolo de cenoura com cobertura de chocolate ...

Essa lembrança fez meu estômago roncar alto. Me espreguicei e olhei para fora. Lá estava aquele céu escuro de novo. Olhei para o lado e a senhora babona não estava lá. Reparei mais no ônibus e percebi que quase todos os passageiros tinham sumido.

O preço do nosso amor (Romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora