Capítulo 8

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O tal do mata leão realmente fazia efeito. Mesmo tendo hibernado por quase um dia inteiro, foram necessários poucos minutos para que eu pegasse no sono novamente depois deitar na cama do meu primo para esticar as pernas.

O despertador fez um som agudo e eu tive uma certa dificuldade pra descobrir como fazer ele parar. Por um minuto, a sensação de estar naquele quarto estranho me pegou de surpresa. Eu precisei de alguns segundo para fazer um flashback e acreditar que eu estava mesmo em Parnaí. 

Abri a minha mala e escolhi a roupa menos chamativa que tinha. Se meus primos já me odiavam, eu não iria dar mais munição para eles logo no primeiro dia. "Diferentão". Era essa a palavra que Caleb tinha usado para me descrever. 

Uma busca rápida e eu agradeci ao céus por achar uma calça jeans discreta da calvin klein e um blusão da GAP no meio das minhas outras roupas menos caretas. Não que eu tivesse que me esconder, meu pai havia me garantido que todos da família sabiam que eu era gay, Eu só não sabia o que exatamente eles achavam disso. 

Peguei minha necessaire de viagem, que por sorte eu sempre tenho em casa umas três prontas para qualquer emergência ou viagem de última hora, e uma toalha que estava dobrada na pequena cômoda do quarto. Abri a porta e dei uma olhada para o corredor. Nada.

A casa estava mergulhada num silêncio profundo, o que significava que ninguém tinha chegado para o jantar ainda. Significava também que eu tinha o banheiro só para mim. 

Corri pelo pequeno corredor e me tranquei no banheiro. Para minha surpresa, ele não era tão minúsculo quanto eu teria imaginado. O box cabia duas pessoas e havia um espaço minimamente descente entre o vaso e a pia. 

Tirei a roupa e me joguei debaixo do chuveiro. Quase gemi quando um jato forte e fumegante atingiu as minhas costas. Aquela era definitivamente a melhor coisa que tinha me acontecido nas últimas 24 horas. 

Não havia espaço para colocar nenhuma das minhas coisas no box. O único suporte que estava preso na parede tinha quatro saboneteiras, cada uma de uma cor, quatro barbeadores diferentes e um shampoo daqueles 2x1 do tamanho de uma garrafa de coca cola 2 litros. 

Com um pequeno malabarismo, eu consegui deixar as minhas coisas na janelinha que havia no alto da parede e comecei o meu ritual. Enquanto passava o meu sabonete de rosto um frio na barriga crescente tomava conta de mim. "E se TODOS eles me odiassem?". "Quanto tempo essa viagem vai durar?" "Será que se eu voltasse para casa, meu pai me expulsaria?".

Eu estava pegando a minha mouse de banho quando três batidas fortes quase arrombaram a porta.

- Hora de sair do banho vossa majestade. O jantar está pronto. 

A voz de Caleb ainda carregava aquela ironia mal disfarçada e mesmo atrás da porta eu podia imaginar a sua cara de deboche. Respirei fundo e pulei direto para o shampoo antes de finalmente tomar coragem e desligar o chuveiro. 

Havia algo errado com a tolha que deixaram no "meu" novo quarto. Ela era pequena demais, dura demais e de alguma forma parecia não conseguir absorver a água do meu corpo. Depois de quase um balé para poder me seca, demorei um pouco mais que o necessário para colocar as minhas roupas enquanto avaliava se realmente valia a pena descer para o jantar. 

Outras três batidas chacoalharam o banheiro e quase me fizeram ter um infarte. 

- Você morreu ai dentro? - Perguntou Caleb com a mesma voz irônica.

- Infelizmente não. - Respondi no mesmo tom. 

- Anda logo. Estamos na sala te esperando. Todo mundo tem mais o que fazer além de te esperar para jantar, Vossa Alteza.    

Antes que eu pudesse responder, eu ouvi os seus passos pesados saindo pelo corredor. 

O que eu fiz para merecer ser tratado assim? Eles não me dariam nem uma chance de ouvir o MEU lado da história? Será que se eles soubessem que eu também não queria estar aqui, as coisas seriam mais fáceis? 

Bem, ficar no banheiro pensando nisso definitivamente não iria fazer com que eles gostassem mais de mim. Respirei fundo, tomei coragem e abri a porta. A casa que antes estava tão silenciosa, agora era invadida por vozes que vinham do andar de baixo. 

- Quanto tempo ele ainda vai demorar nessa droga banho? - Disse uma voz muito parecida com a de Caleb, mas com alguma pequena diferença que eu ainda não sabia dizer qual era. 

- Eu quero só ver quanto a conta de água vai vir. O tio Maurício mandou alguma grana para cobrir os gastos do mimadinho? - Essa voz eu não reconhecia mesmo.

- Parem com isso. Não me façam passar vergonha! Ele é primo de vocês! Ele não precisa pagar nada para ficar aqui. - Responde a voz familiar da Tia Joana.

- Ou seja. o tio Maurício não mandou um real para bancar os gastos do filho que toma banho de meia hora. Malditos ricos. A senhora deveria ter negado. Já basta eles quererem vir nas férias acabando com todos os nossos planos , ainda mandam o riquinho antes sem avisar. Dez anos sem lembrar que existíamos, mas quando os bonitos precisam fugir da sua vida de luxo, das mansões e das festas eles brotam na nossa porta. Isso deve ser um maldito safari para eles. Visitar os parentes pobres deve ser a nova moda dos milionários.  

Havia raiva nessa última voz. Raiva não, ódio. Um aperto no meu peito quase me fez chorar. Mas eu engoli as lágrimas antes que elas pudessem cair. Olhando por esse lado, realmente essa situação parecia a pior possível. Mas meu pai tinha contato com a família, não tinha? Por que ele iria insistir na viagem se sabia que provavelmente não seria bem recebido? E pior ainda: porque ele me mandaria para a casa de parentes que ele não falava há dez anos?  

Antes que as perguntas me fizessem desistir, guardei minhas coisas no quarto, troquei a meu blusão básico por um moletom laranja neon com cadarços brancos e aplicação de zebra nas mangas , passei meu melhor perfume importado e desci para enfrentar a família. Se eles queriam o menino mimado, eu sabia interpretar muito bem esse papel.  

O preço do nosso amor (Romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora