Capítulo 3

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O golzinho azul marinho descascado de Lucas está no fim da estrada perto do pier como eu imaginava. Ele está sentado no capô de costas para mim, admirando o lago. 

Quando ele pediu que eu o  encontrasse no "nosso lugar de sempre" só poderia ser aqui. Foi aqui que demos o nosso primeiro beijo (quando ele me trazia de volta do "dogão") foi aqui também que ele me pediu em namoro apenas duas semanas depois do nosso primeiro encontro oficial e foi exatamente aqui que ele partiu meu coração. Sendo assim, fazia sentido que seja lá o que fosse acontecer, acontecesse aqui. 

Eu me convenci durante minhas duas ultimas aulas que eu viria aqui para colocar um fim no sofrimento de Lucas. Eu estava disposto a ouvir os seus pedidos de desculpa e também ouvir sobre como a sua vida estava miserável sem a mim. Afinal não era por isso que ele tinha deixado todos aqueles bilhetes de "precisamos conversar?" e tentado de tantas maneiras entrar em contato comigo?    

Uma parte de mim, bem pequenininha, mas que crescia a cada minuto, esperava que ele me agarrasse e me roubasse um beijo. Um daqueles nossos beijos que tiravam o meu folego enquanto minha mão passeava pela nuca dele e ele me puxava para perto pela cintura. 

Afasto a ideia da minha cabeça e saio do carro. Droga como ele está lindo! Ele tirou a jaqueta de couro que estava usando mais cedo, ficando apenas com uma regata branca e sua calça jeans rasgada. 

- Eu tinha esquecido como esse lugar era lindo - Ele diz sem se virar para mim.

- Ué . Faz tempo que você não vem aqui? 

- Desde aquele dia

Ele não precisa me falar a qual dia ele se refere. "Aquele dia" foi o dia que depois de ter sumido uma semana e ficado sem responder minhas as ligações e mensagens , Lucas resolveu aparecer e me mandar uma mensagem dizendo " Precisamos conversar. Me encontre no pier".

Aquela mensagem tinha todos os sinais de alerta. Primeiro que nada bom começa com "precisamos conversar". Ninguém fala "precisamos conversar, fiquei rico!" ou "precisamos conversar, vamos nos casar?". Ainda mais depois de sumir por uma semana inteira.

O outro sinal estava em "no pier". Desde que demos o nosso primeiro beijo naquele lugar, nenhum de nós o chamou mais de "pier". Ele tinha se tornado o "nosso lugar de sempre". Se ele o estava chamando de "pier" significava que algo tinha mudado e esse "algo" era que não existia mais "nosso" nem "sempre".

O problema começou numa bela noite de sábado. Lucas recebeu uma mensagem no seu celular quando nós estávamos em casa procurando alguma coisa na Netflix pra ver. De repente, ele ficou branco como um papel encarando o telefone. Eu perguntei o que era, ele respondeu que não era nada, mas que precisava ir para casa resolver algumas coisas. 

Eu fiquei preocupado, mas ele disse que não era nada sério. Quando já estava dentro do seu carro, ele abaixou a janela e disse

- É.. talvez eu tenha que fazer uma viagem amanhã. Coisa rápida, eu volto na segunda para a aula. Só preciso resolver .. uma parada. 

- Tem certeza que está tudo bem? - Perguntei achando aquilo tudo muito esquisito. 

Se tem uma coisa que eu aprendi sobre Lucas é que ele tem seu próprio jeito de resolver as coisas. Inclusive um jeito muito diferente do meu. Enquanto eu gosto de discutir, argumentar, chorar as pitangas e imaginar tudo o que poderia acontecer com aquele situação, Lucas simplesmente se cala e resolve sem a ajuda de ninguém. 

- Sim, só não ligue lá pra casa. Minha mãe pode ficar preocupada a toa. - Ele me pediu sem olhar nos meus olhos. 

- Tá mas..você tem certeza de que está tudo bem? Tem algo que eu possa fazer para te ajudar? É algo relacionado a dinheiro? Eu posso te emprestar uma grana e ...

Sem esperar eu terminar a frase, Lucas saiu do carro e me tascou um beijo. Não era o nosso beijo de sempre, esse era uma beijo desesperado, rápido , como se ele procurasse respostas naquele beijo. E da mesma maneira que começou, terminou. Num piscar de olhos, Lucas estava arrancando seu golzinho na minha garagem. 

Os dias que se seguiram foram de espera e agonia. Pensei até em ligar para a polícia depois que ele não deu mais sinal de vida e não atendia as minhas ligações. Ao invés disso,  preferi quebrar a minha promessa e ligar pra a casa dele.  Sua mãe atendeu e me disse que ele tinha ido para a chácara da tia distante e que lá não pegava sinal de celular. Algo no tom de voz dela me incomodou. Era como se ela não quisesse dizer aquelas palavras, mas achei que era coisa da minha cabeça.

A segunda feira chegou e nada de Lucas na Castro e Silva. Os outros dias seguiram da mesma forma e quando eu estava quase surtando aquela fatídica mensagem pedindo um encontro no "pier" chegou. E aqui estávamos de volta, no maldito pier.  

- Então que bom que finalmente você resolveu falar comigo - A voz rouca de Lucas me tirou daquelas lembranças. 

- Na verdade foi um acidente. Eu estava me concentrando em sair do interrogatório da Jénifer quando ouvi meu nome e respondi no automático. - Digo ficando ao seu lado no capo do carro.

- Hum, bem pelo menos funcionou. Achei que teria que te sequestrar para conseguir falar com você. - Ele me dá aquele sorriso torto encantador e meu coração para por um instante.

- Então fala. O que você quer tanto falar comigo? - Digo lançando o melhor olhar de flerte que consigo. Deus o que eu estou fazendo? 

- Eu queria começar te pedindo mais uma vez desculpas. O que eu fiz com você foi ... foi desleal. Eu não sei aonde estava com a cabeça quando aceitei o convite do Michel. - estremeço ao ouvir o nome da víbora - Mas isso já passou. Eu não quero ficar falando dos erros do passado. Eu só preciso ter certeza de que você me perdoou .  - Ele coloca minhas mãos entre as suas. 

 Um conflito acontece dentro de mim, mas ao ver aqueles olhos verde e sentir aquelas mãos macias segurando as minhas eu respondo sem perceber:

- Sim claro. - Digo alto e ansioso demais - Já passou ok?  - Completo tentando recuperar algo da minha dignidade. 

Esse é o mais perto que estive de Lucas em meses. De repente me sinto aquele menino bobo e apaixonado de novo. Durante todo esse tempo era fácil taxar Lucas de vilão enquanto eu fingia que o toque dele não era tão quente, que o perfume dele não era tão gostoso e que a voz dele não arrepiava os pelos da minha nuca.  Mas agora todas essas coisas tentam me convencer de que foi apenas um escorregão da parte dele, de que nós somos feitos um para o outro. 

- Tato você tá me escurando? - Ele me pergunta com olhar preocupado. 

Droga! Devo ter viajado enquanto ele falava alguma coisa importante. 

- Desculpa .. o que você disse? 

- Eu falei que tenho pensado muito em você nesses últimos dias. - Ele se aproxima ainda mais, ficando a poucos centímetros de mim. 

- Ah é? - Pergunto tentando inutilmente disfarçar meu nervosismo. 

- Sim e eu cheguei a conclusão que eu preciso de você. - A voz dele tem um tom quase desesperador e eu me seguro pra não pular seus braços. 

Eu deixo ele ter o tempo dele. Parece que as palavras estão difíceis de se dizer e ele parece lutar internamente com o que vai falar. Ela dá longas respiradas e eu vou ficando mais ansioso a cada segundo. Então é isso. O meu primeiro amor de verdade vai se declarar para mim novamente. Vai dizer que não consegue viver sem mim e que faz o que for preciso para me ter de novo. 

Eu sinto vontade de dizer algo, mas não quero estragar o momento. Tudo o que eu consigo fazer é ficar ali com os olhos arregalados esperando ele terminar sua declaração. 

- Tato minha mãe está doente. - Ele diz finalmente com uma voz de choro. 

Um balde de água fria parece cair na minha cabeça.  Eu pisco várias vezes tentando entender como a declaração de amor que ele estava fazendo para mim se encaixa na mãe dele doente. Talvez ele continue com um " e por isso eu percebi que precisamos dar valor a quem amamos, que a vida é curta demais para se desperdiçar longe de você. " Mas não é isso que ele fala em seguida.





O preço do nosso amor (Romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora