Capítulo XXX - Amor

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Quando finalmente me encontro em frente ao portão do condomínio, chuto-o com toda minha força. Ele abre sem emitir nenhum rangido, e não me dou ao trabalho de fechá-lo quando saio. Caminho pela rua com passos largos, tentando esconder minha face aterrorizada. Espero parecer uma adolescente normal que está caminhando rumo à escola, não uma garotinha assustada por contas das ameças de um... ser humano desprezível.

Embora eu realmente esteja nesse estado.

Consigo andar apenas quatro passos antes de avistar cachos ao vento se aproximando de mim em uma velocidade extrema. Só consigo pensar na figura de Rebecca enquanto ela pula, me agarrando em um abraço exagerado.

Fico perplexa por alguns segundos, porém ela não demora a me largar e começar a procurar algo pelo meu corpo.

- Ele te machucou, certo? Sam, eu vou matá-lo, eu juro! - Fala tão rapidamente que quase não consigo distinguir suas palavras.

- Eu estou bem! - Tento tranquilizá-la, sorrindo. - Eu admito que fiquei com medo o tempo inteiro, mas não aconteceu nada. Quer dizer, só uma ameaça assustadora, mas...

- Ele n-não... - Ela respira fundo para recuperar o fôlego. - ...não tocou em você de nenhuma maneira? Nem com a garrafa?

- Que garrafa? - Franzo a testa. - Reb, você tá bem?

Ela me encara, também franzindo a testa, mas sua expressão logo se modifica para algo próximo de entendimento.

- Ai, droga! - Bate na própria testa. - Ele nos enganou.

- O quê? Do que você está falando?

- Nem queira descobrir. - Sua expressão é séria, e não me deixa a chance de questioná-la mais antes de sair correndo na direção da escola. Relutantemente, sigo-a.

                                                                           *****

Agradeço aos céus pelo fato do porteiro Pedro não estar em seu posto quando passo pelos largos portões, adentrando no território do Conquista. Teoricamente, esse deveria ser o horário do intervalo, mas os grupos que na maioria das vezes se espalham gritando, correndo, conversando e lanchando no pátio não estão por aqui, exceto por duas ou três pessoas que andam ao redor dos bancos.

Inicialmente, estranho, afinal, está tarde demais para todos ainda estarem nas salas. Mas, os olhares significativos de Rebecca para o lado esquerdo do espaço unidos com os gritos, vaias e urros vindos da quadra me lembram que está acontecendo o jogo de basquete entre o segundo e terceiro anos.

E Elias está jogando.

Minhas bochechas ficam vermelhas apenas com a menção à possibilidade de vê-lo jogar. Nunca fui uma fã assídua do time de basquete do nosso ano, mesmo admirando a força de vontade e a habilidade dos garotos, mas isso não significa que não prestei atenção nas dezenas de comentários sobre as jogadas de cada um, e Elias sempre foi um dos mais citados. Segundo a própria Sofia Trindade, ver o garoto correr com a bola quicando próxima a seus pés até alcançar a cesta é como acompanhar a jornada de um deus ascendendo aos céus.

Por isso, não hesito em me virar para correr até o local. Parece egoísta deixar Rebecca para trás, só que estou cansada de ligar. Eu ligo para a tristeza e a mágoa de todos, para Lucas, para o futuro do Conquista, até para as relações pessoas dos meus amigos, mas não tenho tido tempo para ligar para mim mesma. Então, sim, que me crucifiquem, mas eu apenas quero vinte minutos para observar meu... o menino que eu gosto jogar e ao menos imaginar que as inúmeras cestas que ele fará serão em minha homenagem.

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