Dia de Folga

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Capítulo XVII

Não havia muito o que fazer na sexta-feira,  já que Carmo tinha que esperar que Alan fizesse a sua parte do "acordo".
Decidiu então dar uma volta pelo centro velho. Talvez fazer umas compras, quem sabe?
Pensou se deveria chamar Chaveiro para acompanha-lo, mas no final das contas decidiu ir sozinho.
O metrô estava vazio aquele horário, assim como várias das estações, o que fez com que Carmo chegasse bem mais rápido.
Toda essa região, enorme por sinal, era o que havia sobrado da antiga metrópole. Uma cidade viva, que acabou sendo esquecida e desvalorizada depois do advento das arcologias. Aliás, não havia sequer uma delas em todo o centro velho. Eram apenas prédios. Pequenos edifícios de oitenta, no máximo cem andares, onde vendedores ilegais, desabrigados, imigrantes das colônias e foragidos encontravam um local para se estabelecer.
Também era onde se encontrava praticamente de tudo para comprar, desde coisas inofensivas como antiguidades, até coisas que você não deveria estar comprando, como armas não registradas.
As ruas do centro velho eram sujas e confusas. Excetuando-se o metrô, quase todos os meios de transporte que circulavam por ali ainda usavam combustíveis fósseis, o que dava um cheiro, digamos, interessante, a toda aquela região.
Era ali também que praticamente todas as casas de prostituição se encontravam, então não era raro cruzar com belas garotas totalmente nuas caminhando pelas ruas. 
Carmo gostava de uma pequena galeria que existia ali, pois era lá que quase sempre encontrava o que estava procurando. Era um corredor, não muito longo, com pequenas lojas dos dois lados. Chamava se "Galeria Barão Velha". Carmo nunca entendeu muito esse nome, o porque do velha no lugar de velho depois de Barão, mas ao que parece, pelo que um dos proprietários havia lhe dito, "Barão" era o nome da rua antes de tudo ser rebatizado com números, dois ou três séculos atrás. 
Entrou na loja de antiguidades do seu Oscar, especializada em CDs. Ele tinha muita coisa ali do século XX e XXI. Foi do seu Oscar que Carmo havia comprado um CD player com design retrô uns três anos atrás. E o que era mais importante, funcionado perfeitamente. Carmo gastou uma pequena fortuna aquele dia, mas o vendedor garantiu que não se tratava de uma réplica e que apenas algumas poucas peças haviam sido substituídas para que o aparelho voltasse a funcionar. Naqueles tempos as coisas eram feitas para durar!
Os CDs também eram originais em sua maioria. Os que eram reproduções tinham uma pequena estrela preta na capa, no encarte e no CD propriamente dito.
Carmo adorava encartes. As fotos, as letras, o nome das músicas em ordem no índice. E a quantidade de músicas?! Apenas dez ou doze. Carmo achava um charme um CD ter tão poucas músicas. Dava um ar de exclusividade a cada obra. Não era como a rede que tinha bilhões de músicas, da Terra e das colônias,  e que estavam a um toque de distância. Isso era fácil demais, banal demais. A graça estava em garimpar um novo artista. Ouvir uma ou faixa do CD para decidir se queria compra-lo ou não, e sim, isso era permitido na loja do seu Oscar.
"Bom dia seu Oscar."
"Ora, ora. Carmo! Bom dia, bom dia!"
"Como estão as coisas seu Oscar? Enganando muita gente com suas réplicas?"
Oscar riu pois sabia que sua loja era a que mais tinha CDs originais em todo o continente.
"O que está procurando Carmo? Veio com algo em mente?"
"Pior que não. Só dando uma volta mesmo. Gastando o tempo."
" Ah, já que está com tempo deixa eu te mostrar uma coisa que você vai adorar. Vem comigo."
Caminharam até o pequeno estoque, no fundo da loja. Oscar abriu uma das muitas caixas que havia ali e tirou um grande objeto, fino e quadrado, que de um modo estranho e bizarro lembrava um grande estojo de CD.
"Que diabos é isso seu Oscar?!"
"Isso Carmo, é um LP."
"Um o quê?"
"LP Carmo. Long Play. Era assim que se ouvia música antes do CD."
"Seu Oscar, esse troço não cabe na minha bandeja de CD não!"
"Não Carmo, tem um aparelho específico para tocar um LP. Chama-se toca-discos."
"Faz sentido. O senhor tem um desses?"
E ele tinha. Passaram quase a manhã toda ouvindo velhos discos. O som não era como o dos CDs. Havia um chiado nas músicas, que Carmo estranhamente adorou. Não resistiu e acabou comprando o tal do toca-discos e mais uma porção de LPs.
Depois dali, foi almoçar, comprou alguns livros, réplicas, é claro, e finalmente, lá pelas cinco da tarde, voltou para casa.
Tinha sido um dia bem agradável e Carmo estava revigorado para o sábado.
Chegou em casa e só então notou asbcinco ligações perdidas, já que havia se desconectado da rede durante o passeio.
Quatro eram do Chaveiro e a última era de Alan. As coisas, aparentemente, estavam ficando cada vez melhores.

O Deus da MáquinaOnde histórias criam vida. Descubra agora