Capítulo XXV
Carmo estava certo.
A livraria em Nova Campinas estava sendo um sucesso estrondoso, maior do que poderia imaginar nos seus sonhos mais otimistas.
Havia se estabelecido há dois anos e a clientela não parava de crescer.
Decidiu dar um ar retrô ao estabelecimento, com estantes de madeira do século XX, sistema operacional do século XXI, emulado é claro, e decoração do século XXII. Uma salada de estilos que tinha caído no gosto do seu público.
O dia hoje estava particularmente corrido. Chaveiro havia ido buscar uma tonelada de encomendas vindas da Terra, o único lugar onde existiam artesãos de livros. Não havia um só deles nas colônias, nem na lua, nem em Marte.
Chaveiro chegou finalmente. Trazia dúzias de caixas, abarrotadas de livros e mais livros! Tinham que cataloga-los, guarda-los nas estantes e ainda atender os clientes que vinham comprar e sempre puxavam aquele papo amigável sobre literatura. Chaveiro estava suando e bufava como se houvesse corrido uma maratona.
"E aí? Como foi Chaveiro? Veio tudo."
"Sim. E eu acho que tenho uma ótima notícia. Conversei com o Sales enquanto esperava o desembarque das caixas."
"Sei. Vai me dizer que ele quer reajustar os preços de novo? Tá, o trabalho do cara é ótimo, suas reproduções são fantásticas, mas se ele mexer no preço vou ter que mudar de fornecedor."
"Não é nada disso! Não te falei que era boa notícia? Cara, você é um sócio muito chato!"
"Tá bom, qual a ótima notícia então?"
"Sales vai mudar para cá. Não aguenta mais a Terra. Cara, isso vai baratear muito nossos livros, fora a rapidez de entrega!"
"Velho, isso vai ser ótimo."
O pequeno sino pregado próximo a porta então soou, avisando da entrada de um cliente. Era um homem bem vestido, meia idade e ar inteligente. Carmo não lembrava dele pelas redondezas. Ou era um turista ou tinha acabado de se mudar.
"Posso ajudar? Procura algum título em especial?"
"Ah sim,por favor. Trata-se de um romance de ficção-científica, do século XIX se não me engano. Chama-se 'A Eva Futura'. O senhor por acaso o teria em seu estoque?"
"Não, infelizmente não o tenho para pronta entrega, mas posso encomendar se o senhor quiser."
"Ah, mas então o senhor conhece a obra?"
"Sim, conheço. Villiers de L'Isle-Adam é o autor, correto?"
"Perfeito!" Disse o homem visivelmente satisfeito. "Quando acha que vai recebe-lo?"
"Daqui uma semana, sem falta."
"Ora, então estamos combinados."
"Se eu não estiver aqui o senhor pode retirar o livro com meu sócio, o Chaveiro."
"Chaveiro?"
"História longa. Conto ao senhor quando vier tomar um café e não termos tantas caixas para abrir."
"Ficaria honrado. Bom, estamos combinados então senhor..."
"Carmo. E o senhor é?"
"Joaquim. Joaquim Villiers Filho."
"Villiers? Olha que coincidência. O mesmo nome do autor!"
"Sim senhor Carmo. Uma feliz coincidência."
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O Deus da Máquina
Fiksi IlmiahO policial Carmo Miranda tenta desvendar um assassinato que talvez não seja um assassinato. Romance de ficção científica com a pretensão talvez ingênua de entender o que é "ser humano".