O brilho e a lua

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Estava se formando uma pequena quantidade de água em uma pele cinzenta. Não era chuva, pois suas gotas eram bem minúsculas, tratava-se de lágrimas. Preciosa não conseguia fazer mais nada além de chorar. Já tinha se passado uma hora e mais uns longos minutos e estando presa naquela cadeira nada de bom acontecia. Estava com sede, fome e cansaço, suas pernas hora estavam dormentes ou com câimbra, sua cabeça doía e todo o seu corpo parecia estar o mesmo. Estava sem forças e o pior: sem esperanças. Cálaham agora mal falava com ela, seus pensamentos estavam todos direcionados para o seu plano malicioso e seu olhar focava a lua e seus livros. O relógio de péndolo lembrava a todo instante que sua vida duraria só mais alguns minutos, pelo menos achava que ainda seria assim, e ela nem ousava mais a observá-lo. Será que tudo acabaria ali? Preciosa pensou em como seria aquele momento se ela fosse a guerreira que sempre sonhou ser, com certeza mudaria tudo, já teria resolvido as coisas. Mas não era assim. Ela continuava sendo uma garota normal em um século errado.
Ela olha para a lua clara e brilhante, "Bem que poderia ter um eclipse agora." pensou ela. Mas Cálaham não deixaria um detalhisinho passar despercebido.
Seus olhos deslizam para o chão e ela escuta um estrondo vindo de fora.
-Será que os outros convidados já chegaram?
Diz Cálaham com um jeito prazeroso no falar. Outro estrondo.
-Vou receber meus convidados.
-Não...
Preciosa sussurra já quando o homem passa pela porta. Ela tenta desamarrar as cordas mais está muito fraca e acaba se rendendo ao seu próprio cansaço se mantendo imóvel.
-Me solta!
A voz de Deyse ecoa no corredor e segundos depois Cálaham aparece puxando ela e Arthur por algumas cordas.
-Tenho certeza que adorará companhia Senhorita Preciosa.
Ele amarra Arthur a sua direita e a esquerda coloca Deyse que continua gritando e se debatendo.
-Me larga seu monstro, você não tem o direito de me amarrar nessa cadeira!
-Quieta ou terei o prazer de te fazer minha primeira cobaia mocinha.
E depois lá estavam os três, amarrados em um local desconhecido com um homem que destruirá suas vidas de qualquer maneira.
-Você está bem?
Arthur pergunta com um olhar de preocupação.
-Só respirando.
E continua com sua cabeça voltada para o chão.
-Como me encontraram?
Disse em uma frase quase interminável e Deyse a respondeu.
-Eu queria te ligar para se despedir antes de um fim trágico mais você não me atendia. Resolvi então rastrear seu celular porque fiquei preocupada. E aí, descobri que você estava nesse fim de mundo.
Ela observa Preciosa.
-Depois disso avisei ao Arthur.
Ficaram todos quietos, Cálaham voltou a ficar distraído em seus papéis.
-Nós não vamos morrer.
Preciosa fala fazendo um certo esforço.
-O que?
Deyse a olha sem entender.
-Era tudo mentira.
-Tá mais o que ele quer então?
Não deu tempo da garota responder Cálaham voltou com um sorriso largo no rosto e anunciou sua grande notícia.
-Senhoras e Senhores daqui a dez minutos vocês verão a minha total magnitude ser restaurada. Espero que tenham aproveitado a felicidade de vocês porque ela, literalmente, entrarar em extinção.
Ele se vira, coloca luvas em suas mãos e segura uma pedra esquisita em uma delas. Na outra segura um aparelho celular, mexe em alguma coisa nele e depois se aproxima de Preciosa.
-É hora de começar a sofrer, Preciosa.
-Como vai fazer isso.
Ele dá um sorrisinho e mostra a tela de seu aparelho.
-Sabe, adorei essa modernidade.
Um vídeo está sendo reproduzido na tela do celular, uma cena em que Preciosa mais temia em rever: o momento da morte de sua mãe. Aquele ambiente, aquelas roupas, aquelas palavras, tudo aquilo machucava profundamente o peito da jovem que se controlava em não sofrer. Mas ela sofria. Amargamente.
-Chega!
E lágrimas rolaram pelo rosto pálido da garota.
Enquanto isso o brilho em seu cabelo ficava cada vez mais forte, o violeta vibrante se espalhava pelo local o deixando completamente iluminado. Cálaham sorria animadamente vendo, ao mesmo tempo, a desgraça de uma vida e a conquista de sua própria vida. Quando Preciosa já não aguentava mais de tanto chorar, o homem coloca aquela estranha pedra entre o brilho da lua e o violeta dos fios negros da garota e aquele insignificante objeto começa a drenar uma boa parte daquela penetrante luz até todo o resto ficar mais escuro e sombrio.
-Fantástico. Enfim tenho o poder de dominar a todos completamente em minhas mãos.
-Seu psicopata você não tem vergonha do que está fazendo? Você destruiu várias vidas só pra si dar bem na sua.
Desyrée fala aos berros indignada com a cena em que foi obrigada a assistir. Mas Cálaham apenas a olha de longe, normalmente, como se não tivesse mais medo de nada.
-Eu havia lhe dito que seria a minha primeira cobaia e olha, eu estou louco para experimentar isso aqui.
Ele olha para pedra e a aponta para Desyrée que fica apavorada.
-Não...
Preciosa diz em um tom fraco e ninguém conseguiu ouvi-la.
-Você garota ruiva, vai conhecer uma parte sombria da sua vida que irá faze-la sofrer como nunca viu e jamais se esquecera disso.
A pedra começou a brilhar e pequenos raios estranhos vagueam em volta da garota, fazendo ruídos e ecoando vozes assustadoras. Deyse começa a ficar cinza! Da cabeça aos pés. Seu olhar se entristesse e depois baixa a cabeça chorando baixinho como uma criança perdida, sem olhar para mais ninguém.
-Que isso lhes sirvam de exemplo.
Cálaham se aproxima de Arthur que continua calado.
-Eu poderia te fazer meu escravo...
Ele o olha da cabeça aos pés.
-Mas você é fraco e covarde. Só irá me atrasar.
Depois se vira mostrando sua pose confiante.
-Agora me dêem licença, tenho negócios extremamente importantes para resolver.
E pate a porta.
-Vocês estão bem?
Arthur pergunta para as duas com um ar de preocupação.
-Não.
Preciosa responde. Sua voz era rígida, já Desyrée continua alí na mesma.
-Acabou. Estamos perdidos.
Ele tenta olhar nos olhos dela mas ela ainda olha para o chão.
-Podemos sair daqui...
-Pra quê? É o fim, não viu? Já era. Fracassamos, eu fracassei. Como sempre.
O fim da frase saiu quase num sussurro.
-Olha, já que você já aceitou a derrota então não adianta eu falar mais nada. Mas... Eu só quero que saiba que só conseguimos alguma coisa por sua causa. Você teve coragem de enfrentar tudo isso sem medo algum. Você, Preciosa, é mais forte do que cada um de nós. Você sabe disso. Você só não quer enxergar.
Ela levanta a cabeça mas não o encara.
-Eu sei que se a gente sair daqui você arruma um jeito de acabar com esse problema. Você é capaz de tudo, de fazer qualquer coisa. Confia ou... Imagine.
Os olhos da garota brilham com aquela palavra: imaginar. Era só imaginar, sua vida era movida a isso e aos seus pensamentos. Então ela fecha os olhos se concentrando em tudo o que queria e surge do nada em sua mente uma imagem. Aquela garota misteriosa em seu cavalo, ela cavalga rapidamente por entre montanhas de pedra carregando uma pequena caixa de madeira com um coração cravado. E então uma luz forte surge e Preciosa abre os olhos.
-Arthur, eu sei como derrotar o Cálaham.
      *      *
Os três estavam desamarrados e muito debilitados, uma cesta de frutas que estava na mesa de madeira foi rapidamente esvaziada, aliás, não poderiam salvar o mundo de barriga vazia. Arthur faz uns curativos improvisados em Preciosa, dessa vez mais caprichoso, enquanto ela ia falando o que tinha pensado.
-Leve Deyse para um local seguro e procure Cálaham até encontra-lo. Depois me mande uma mensagem para mim saber o local, se encontra-lo.
-Certo e você vai pra onde?
Ela sorri para ele confiante.
-Vou rever uma estante.
Eles saem do casarão e avistam o carro  abandonado na noite anterior, pois já amanhecia.
-Vão no carro eu sigo meu caminho a pé.
Arthur põe Deyse no banco carona e vê Preciosa dando a volta.
-Preciosa espera.
Ela volta e ele a entrega a espada que estava no casarão.
-Toma cuidado.
E lhe da um doce beijo.
Depois se afasta e vai em direção ao carro, não tinham tempo a perder. Ela o olha de longe e gesticula um "Boa sorte" observando o carro se afastar e seguir caminho pela longa estrada. Preciosa vira de costas e encara a densa floresta em sua frente.
-Agora é a minha vez.
E adentra.

A Estante de Corações Partidos. (Em Revisão... Feito Em 2017 Atualizado Em 2024)Onde histórias criam vida. Descubra agora