02. As Flores

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Quando o mundo parecer em demasia acelerado, lembre-se de parar para observar as flores...

As flores vão te lembrar que as coisas simples têm grande valor, que a beleza se encontra nos detalhes, que se pode ser frágil e forte ao mesmo tempo, que as coisas acontecem na sua hora e que sempre podemos voltar a florescer...

Eu olhava fixamente para as palavras espalhadas com graciosidade pelo papel, para outra pessoa provavelmente aquelas palavras seriam apenas mais um texto bonitinho, algo para se colocar na legenda de uma foto, não seria lido mais de uma vez, não mudaria muita coisa, mas para mim foi como um estalo dentro da minha cabeça, lembranças que eu achei estarem perdidas invadiram minha mente, eu via minha avó sorrindo, numa tarde ensolarada em seu jardim apontando para as flores.

Bonitas, coloridas e para ela muito significativas, ela dizia seus nomes como se fossem músicas e seus significados como uma promessa, eu admirava sua capacidade de deixar as flores ainda mais bonitas só falando sobre elas, talvez eu nunca me lembre de todas as flores de seu jardim, mas me lembro das Alstroemerias, um nome peculiar para algo tão bonito, elas eram coloridas e únicas, as pétalas tinham tamanhos e formas diferentes e mesmo assim formavam um desenho harmônico, eu já gostava delas antes de saber seu significado, minha avó me disse que elas significavam amizade e lealdade, ela me contou também que quando presenteamos alguém com Alstroemerias estamos desejando felicidade plena para a pessoa, naquele dia eu decidi que quando eu encontrasse um amigo verdadeiro eu o presentearia com essas flores.... Até hoje nunca dei flores a ninguém...

Eu não fazia ideia de quanto eu sentia falta da minha avó, as lagrimas rolaram pelo meu rosto enquanto eu olhava estático para o caderno, eu me lembro bem do dia em que ela morreu, eu estava no hospital, e faltavam apenas 2 dias pro aniversário de 98 anos dela, ela já não ficava consciente há 3 dias devido aos analgésicos, eu prometi a ela que se ela acordasse no seu aniversário poderia me chamar de margarida quantas vezes quisesse, ela sempre dizia que eu era como uma margarida: inocente e sensível, ela me chamava assim mesmo eu sendo um garoto, não me lembro quando isso começou a me incomodar, talvez na adolescência, talvez um medo ridículo do que os outros iam dizer, mas sei naquele dia daria tudo para ouvi-la me chamar outra vez, então eu prometi , prometi que ela poderia me chamar de margarida, prometi que traria milhões de margaridas, prometi que mudaria meu nome para margarida, mas o câncer não ligou para nenhuma das minhas promessas...

Não me lembro de muita coisa depois daquele dia, me lembro de ter brigado com a minha mãe por causa das flores no funeral, ela queria rosas, mas eu sabia que tinham que ser violetas, minha avó merecia violetas, eu queria camélias também, mas minha vó diria que eu estava sendo exagerado, sei que no final minha mãe colocou algumas violetas pra me agradar, ela nunca entendeu o seu significado, eu só sei que fiquei mais tranquilo depois, mas no fim violetas, camélias, rosas ou margaridas, nenhuma delas me trazia o que prometiam, as semanas passaram e eu acabei com jacintos na minha varanda.

Fiquei pensando depois, não parava para observar as flores desde os jacintos, acho que foi ali, quando os jacintos floresceram, eu não percebi na época, mas agora vejo bem, foi sim quando os jacintos floresceram, quando a minha violeta se foi, foi naquele dia que a margarida começou a se despedaçar...

Notas da autora:

*Violetas: Lealdade, modéstia e simplicidade

* Rosas: seu significado pode mudar com a cor: Rosa - amor; Amarela - Infidelidade; Branca - pureza e amor espiritual; Moscada - beleza caprichosa; Solitária - simplicidade.

*Camélia: virtude, beleza perfeita

*Jacintos: Tristeza Profunda

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