A Barreira Entre Nós (FINALIZADO)

Sophie

   Estou no quarto do garoto como sempre. Olho pra cima e vejo um pequeno universo pintado no teto. Estão todos os planetas lá, Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Netuno e Urano. Todos enfileirados rodeando o Sol. Pra mim falta um planeta, o meu planeta. Todos nós temos o nosso próprio mundo, eu tenho o meu, o garoto tem o dele... e assim vamos vivendo. O maior problema da sociedade é que as vezes a visão do mundo de uma pessoa é totalmente diferente da visão do mundo de outra pessoa. Isso não seria uma situação grave se o ser humano fosse menos ignorante em relação aos outros. É por isso que eu digo que é mais fácil para nós julgar do que tentar entender e isso nos torna miseráveis perante aqueles que tentam entender... aqueles poucos que tentam entender. Li uma vez uma citação em um livro que dizia assim, "Os livros me entendem e nunca me abandonam. Assim como eu aparentam ser definidos pelo o que há fora, mas dentro escondem uma história complexa" (A Metamorfose - KenKaneki024) e é exatamente assim comigo, isso é o que eu realmente sou, é isso que os diferentes são. Alguns talvez chamam de falsidade, mas eu acho que é eles que julgam a pessoa pela aparência e não pelo o que tem dentro. Quando leio um livro, não qualquer livro óbvio, estou falando daqueles livros que te fazem refletir sobre cada fato de que já fez em sua vida, é como se eu descobrisse um pouco mais de mim. Acho que no fim de tudo é esse o objetivo do autor, ter uma conexão especial com o leitor, não o físico, mas sim o mental, o interno. Livros que tem tal capacidade são realmente facinantes.
   Sabe, as vezes me imagino como um daqueles planetas no teto do quarto, sempre caminhando ao redor de algo, sempre vivendo dependete de uma coisa, ou melhor, várias coisas. Sempre sendo aquele figurante que se sumisse ninguém se importaria. Claro, o sonho de todos é ser o Sol, o protagonista, o que as pessoas admiram, tem respeito e seguem. Fico imaginando as vezes como deve ser estar no comando, liderando... Desde que eu me lembre eu sempre fui a segunda em tudo, sempre fui jogada para escanteio e isso me incomodava muito, mas com o tempo eu me conformei e nem me importei mais. E agora estou aqui, no quarto de um garoto, deitada na cama dele o olhando para o desenho em seu teto. O que eu estou fazendo? Onde eu estou? Eu só queria ter uma chance de entender tudo.

***

   19:20h e o garoto chegou em casa. Ele estava suado e sujo. Fechou a porta do quarto dele e ficou parado por um momento, sentado na cadeira próxima ao computador. Ele estava ofegante como se estivesse corrido um longo caminho. Depois de uns minutos ele tirou o tênis e a camisa. Eu gritei "Ei!" mas, como sempre, estava claro que ele não conseguia me ouvir. Quando ele ia tirando a calça eu dei um pulo pra trás ao mesmo tempo em que colocava as mãos nos olhos, mas bati em uma estante de livros e isso a fez tremer. Ele certamente percebeu, porque por um segundo hesitou em tirar a calça, mas virou-se, tirou ela e pegou sua toalha. O garoto olhou mais uma vez pro lugar onde eu estava mas, novamente, não parecia estar me vendo. Pensei na possibilidade dele ser cego e surdo, mas logo descartei, era impossível aqueles olhos atentos serem cegos. E então ele entrou no banheiro e foi para o chuveiro. A água caía em seu rosto lindo, e escorria pelo seu corpo. Eu sabia que conhecia ele, sabia que já tinha o visto antes, só não sei de onde. Eu o encarava do quarto, sentada no chão e o admirando. Bati três vezes no chão pra ver se conseguia sua atenção. Ele olhou para o lugar em que eu bati.

- Quem é você? Por que eu não posso te ver? - ele disse, mas eu não respondi, ele não me ouviria mesmo. - Por que não me responde?

   A água caía com força em seus cabelos.

- Por favor fale comigo. - eu não respondi. - Devo estar ficando louco.

   Bati três vezes no chão de novo e ele olhou rapidamente. Eu me levantei, queria falar com ele mas não sabia como. Foi aí que me aproximei do vidro que separava o banheiro do chuveiro, levantei meu dedo e escrevi de um modo que ele pudesse ler "oi".