– Eu ainda não sei, mas se me encherem muito o saco, chuto o balde sem dó...
Era segunda-feira, quase três horas da tarde. Estávamos sentados na quadra descoberta do colégio. Todos os quase quarenta alunos do terceiro ano, das duas turmas. Renan e eu tínhamos escolhido o alto da arquibancada para conversar enquanto o professor novo de Educação Física não chegava. Nossas aulas tinham mudado para as segundas e quartas, diferente dos anos anteriores em que havíamos feito a matéria nas terças e quintas.
O pessoal estava morno, naquela preguiça de começo de semana.
– Se você sair, eu também saio. – comentei. Renan me encarou.
– Você não precisa sair.
– Eu já tinha dito que não ficaria. Não faz sentido eu ficar; quem tem mais motivo para sair é justamente eu.
Ele ponderou um pouco, mas ficou calado por um tempo.
– Carlos não vai deixar passar barato.
– Não estou contando com isso. – soltei um riso irônico.
Renan e eu fazíamos parte da escalação oficial do colégio desde que o time de futebol fora formado, quando ainda estávamos no ensino fundamental. Ele, um ótimo e empenhado atacante. Eu, um meio campo conveniente. O futebol me trouxe muitas coisas boas: condicionamento físico, um pouco de disciplina, uma popularidade que eu não esperava e que ainda não sabia lidar muito bem. Também me trouxe a oportunidade de conhecer as pessoas mais de perto, de trazer para junto de mim as que eu queria que ficassem, como o próprio Renan e o Sander, que a princípio só se aproximou de nós por causa do esporte.
Mas o futebol também me rendia constantes dores de cabeça: meu primo, sendo o capitão, levava pra casa todo o tipo de desaforo possível, e eu era sempre o que estava mais perto para escutar. Ultimamente ele não se reprimia em contar para os meus pais o quanto "futebol era coisa de homem" e eu estava "deixando a desejar" nesse quesito, colocando coisas nas entrelinhas que, ainda bem, os meus progenitores tinham dificuldades em entender.
Meu pai e o Carlos sempre se deram bem por causa do futebol. Quando entrei para o time, eles deram uma festa lá em casa. Sério: houve bolo, churrasco e gritaria no fim da noite. Meus parentes tinham ficado contente com a possibilidade de um de nós dois se tornar, sei lá, um profissional da bola no futuro. E acho que meu pai pensou que se eu tivesse esse vínculo com ele também, nos daríamos melhor.
Isso não aconteceu, é claro, porque eu não consigo ficar na frente da TV xingando a mãe dos outros, ou fazendo piadas com a sexualidade incógnita de alguém. Isso pra mim não é diversão. Pro Carlos, sempre foi, sempre será.
Pro meu pai também.
– Pessoal, desçam aqui! – a inspetora Luzia chamou nossa atenção e esperou que todo mundo estivesse à sua volta na quadra. Ela estava acompanhada de um homem alto e musculoso, pele estranhamente bronzeada e reluzente. – Quero apresentar o novo professor de Educação Física de vocês. Esse é o Fernando, ele é personal trainer numa academia muito famosa, que tenho certeza que vocês conhecem, e disponibilizou um tempinho na agenda lotada para dar aula pra vocês...
Ela continuou enumerando algumas qualidades do cara, dando a entender que deveríamos estar muito gratos pela presença dele ali, mas não acho que tenhamos comprado a ideia muito rápido.
Quando a inspetora nos deixou sozinhos, o Carlos foi logo falando do time, que precisávamos treinar, que aquele era o último ano e que queríamos participar de campeonatos e blablablá.... E ele o ignorou.
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Aprendendo a Gostar de Você {Aprendendo III}
Teen FictionO último ano do ensino médio foi premeditado como sendo uma verdadeira catástrofe e, eventualmente, com sorte, quem sabe, fazer Daniel Henrique ter um verdadeiro ataque cardíaco de estresse. Isso o pouparia de muita coisa, sério... Mas o que tinha t...