Parece que o destino, ou sei lá o quê, gosta de pregar peças na gente, né? Quando tudo parece indo de vento em popa, o tal do Murphy resolve aparecer e estragar a navegação.
No domingo à noite meu celular vibrou. A tela mostrava que eu havia recebido uma mensagem num dos aplicativos de pegação que ainda não deletara.
Era o Otávio.
Durante o jantar, fiquei mexendo no pingente do meu bracelete, revirando-o com nervosismo. Eu não costumava tirá-lo do pulso, mas raramente o fazia ficar tão visível assim a ponto dos meus pais perceberem e, claro, comentarem.
— Vai quebrar essa pulseirinha, Daniel — minha mãe alertou.
Milagrosamente sentados na mesa da cozinha, nós três nos entreolhamos. Meu pai tinha desligado a TV por vontade da minha mãe e apreciava a picanha que ela preparara, mas foi só o comentário sair e eu me tornei o centro das atenções.
— Tira esse lixo. Que coisa de viado. — ele praticamente cuspiu no prato. No bolso do meu short, meu celular vibrou de novo. — Que barulho foi esse? É a porcaria do seu telefone?! Já falei pra deixar isso longe quando tiver com a sua família!
Não respondi, só remexi o garfo nas ervilhas, de cabeça baixa, e escondi o pulso esquerdo debaixo da mesa. Voltei para o quarto sem ter engolido muita coisa, só os sapos de costume, e constatei que as mensagens não paravam de chegar.
Ele estava insistente. Mais do que de costume.
E eu estava insistente em ignorá-lo, pelo menos até quando deu.
Na segunda, saí com minha mãe para fazer compras num supermercado bem longe. Deixei o celular em casa, desligado. Na terça, meu pai me pediu para ir visitar a mãe dele, já que ele mesmo não fazia isso e o Carlos, único neto "disponível" além de mim, tinha viajado para a praia com a família. Visitar vovó me deu a desculpa perfeita para que meu celular ficasse novamente desligado, já que ela não gostava dessas "tecnologias" e o sinal por lá era horrível.
Eu gosto de vê-la e aproveitei para conhecer a tal cuidadora que contrataram para ficar com ela — uma senhora de uns cinquenta e poucos anos de nome Marta, ou "Martinha, pode me chamar de Martinha, viu?". Ficamos conversando bobagens e comi um bolo de laranja que vovó tinha ajudado a preparar com a Martinha. O dia passou rápido, voltei tranquilo e até pensei em ir visita-la mais vezes durante aquela semana de monotonia...
Então aconteceu na quarta-feira: Otávio me ligou.
Depois de todos os meus esforços, ele me pegou desprevenido porque minha mãe viu o telefone tocando.
— Não vai atender? — ela perguntou. Eu balancei a cabeça. — Ai, Daniel, atende. Vai que é alguma urgência?
Ela obviamente não viu quem era, mas insistiu tanto que acabei apertando o botãozinho verde e atendendo. Me tranquei no quarto, porém, para que não escutassem a conversa.
— Você sumiu. — a voz do Otávio soava jovial. Não havia qualquer som de fundo na ligação.
— Ocupado com as coisas do colégio...
— Ah, sim. Entendo. — ele deu uma pausa para beber algo e então escutei o barulho de água. Imaginei-o deitado na banheira, a vista de toda a cidade do seu apartamento de vidro... — É seu último ano, tem que se dedicar mesmo, mas isso não te impede de se divertir, certo?
Soltei uma risada anasalada, ele me acompanhou, alegre.
— Senti que estava sendo ignorado... — Otávio continuou, provavelmente balançando uma taça de vinho nas mãos enquanto se esticava na banheira panorâmica. — E não gosto de ser ignorado. Então resolvi ligar e fazer o convite.
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Aprendendo a Gostar de Você {Aprendendo III}
Teen FictionO último ano do ensino médio foi premeditado como sendo uma verdadeira catástrofe e, eventualmente, com sorte, quem sabe, fazer Daniel Henrique ter um verdadeiro ataque cardíaco de estresse. Isso o pouparia de muita coisa, sério... Mas o que tinha t...