Montanha-russa

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Mais um dia comum na Instituição de Ensino Futuro Expresso, um dos colégios mais conceituados do estado. Uma escola particular, a seis estações de casa, cheia de privilegiados com dinheiro pra dar e vender — mas quem venderia dinheiro? —, bolsistas e alunos de classe média que os pais se matam pra bancar.

Com minha bolsa de desconto, o assalto é menos salgado. Minha família — ou melhor, a halmoni — achou bom que eu estudasse onde valorizam a educação, com alunos da classe alta. Alta mesmo, porque o que tem de riquinho chapado nos banheiros...

A escola era divertida com a diretora Margarida, mas ela adoeceu e o Aristóteles — um duas-caras dedicado a ser insuportável — assumiu o cargo. Sem a Laisa, era difícil de aguentar.

Passando pelos corredores monótonos, pensei em imaginar como acabei ali e o que vivi — mas tudo passou. Em vez disso, desci as várias escadas cinzentas, me segurando pra chegar ao banheiro a tempo, e tentava me distrair observando as paredes prateadas com detalhes azuis... Azul. Água. Cachoeira... Não funcionou!

Ao chegar ao banheiro, deslizei pela cerâmica branca que eu já estava acostumado após três longos anos. Segurando o Tomasito nas mãos, me aliviei em um mictório qualquer, e por um momento me arrependi de ser tão hidratado, até dois braços fortes me agarrarem por trás, interrompendo meus pensamentos ao me puxar de vez.

Preciso dizer que não acabou bem? Eu me remexi bastante e tive sorte de não me molhar muito com... O responsável, que me largou em pânico, não teve tanta sorte.

— Porra, Tomás! — o Lucas xingou, berrando, enquanto eu terminava com calma os assuntos no mictório. Sabendo que apareceria alguém se ele continuasse gritando, ele abaixou o volume, mas mantendo o tom incomodado na voz — Eu tô encharcado!

— Por culpa sua. — retruquei, com um sorriso maldoso e a plenitude de quem acaba de deixar o ex-namorado mijado. Apreciei a sensação libertadora enquanto fechava o zíper e ia lavar as mãos — Isso de me agarrar por trás enquanto eu mijo não vai virar costume, né? É estranho, e eu nunca fui fã de golden shower.

Pois é, Lucas Albuquerque. Parei para observá-lo e notei que sua camisa polo azul estava mais escura por estar molhada, como sua bermuda cargo bege, e nem o tênis azul de tecido se salvou. Suas roupas coladas deveriam me atrair... Mas não conseguiam, nada me chamava atenção nele.

Aqueles cabelos lisos e negros, que eu adorava fazer cafuné? Não.
Seu típico penteado que ele nunca muda, médio dos lados e volumoso em cima? Também não.
Seus olhos castanho-claros, que um dia eu achei os mais doces e profundos? NEIN!
Aqueles músculos gigantes de rato de academia, que eu sempre adorei? Talvez um pouco.

— Me escuta, por favor! — ele cortou minhas piadinhas com uma expressão séria que eu raramente via nele, enquanto eu o ajudava com alguns papéis-toalha para que se enxugasse. Me esforçando pra conter o riso, decidi atentar ao que ele diria. Esperei uma bronca que me faria gargalhar, mas a situação logo deixou de ser engraçada — Eu gosto muito de você. Isso nunca mudou, 'cê sabe.

— Claro! — ironizei, sentando no balcão da pia com a cara fechada. Será que aquilo não significava nada para ele? Porque pra mim, já se tornou bem ofensivo e estressante — Gosta mesmo. Gosta tanto que mentiu pro seu pai dizendo que eu te agarrei no banheiro, quando o Aristóteles nos pegou bem aqui, né?

— Não é assim... — é exatamente assim, Lucas — Eu tenho uma reputação! Isso estragaria...

— ...Tudo que seu pai trabalhou pra manter. — completei antes que ele pudesse. Ele veio tantas vezes com essas desculpas que eu já decorei o roteiro. Como ele cutucava a ferida, decidi ir fundo na minha própria cicatriz, e talvez fazê-lo entender — Isso explica porque você não respondeu minhas mensagens quando minha família ficou sabendo de nós dois e minha vó quis me expulsar de casa. E pensar que eu ainda perdi um ano da minha vida namorando você...

Mais um dia comumOnde histórias criam vida. Descubra agora