Posfácio

12 0 0
                                    


- Ora! Visto, pois, que os homens avançam quase sempre por caminhos traçados por outros homens e que dirigem os seus atos com base na imitação – ainda que sem poder trilhar a mesma via, nem alcançar o mesmo mérito dos que lhe servem de modelo - O homem prudente deverá ainda assim constantemente seguir o itinerário percorrido pelos grandes e imitar aqueles que se mostram excepcionais. A fim de que, caso o seu mérito próprio ao deles não se iguale, possa ele ao menos recolher destes uma leve fragrância: Procederá, assim agindo, como um prudente arqueiro, que, sabedor da distância que a qualidade do seu arco lhe permite atingir, e, reconhecendo como demasiado longínquo o alvo escolhido, fixa então a pontaria num ponto ainda maior que o estipulado, esperando, não que a sua flecha alcance uma tamanha altura, mas poder, ajudado pela mira mais elevada, atingir o ponto realmente antes visado!

O Príncipe – de Nicolau Máquiavel


Desocupado leitor: este livro que (provavelmente) o tem nas mãos faz parte de uma ambiciosa série que se propõe adaptar a melhor história já escrita neste mundo! Decerto que isso pode soar como exagero e muitos logo vão querer levantar da cadeira e descordar de mim. Entretanto, devo explicar antes disso que não sou eu quem diz: esse foi o resultado de uma pesquisa feita entre cem grandes autores atuais - os melhores do ramo - foram eles que escolheram, dentre várias outras obras, Dom Quixote como sendo o romance mais importante e relevante de todos os tempos até hoje.

Apesar da inegável profundeza e grandiosidade deste maravilhoso livro de Cervantes, acredito que não tenha sido somente por causa disto que foi considerado o melhor – claro que não: pois excelência ninguém nota, ou pelo menos ninguém dá tanto valor! Pelo contrário, penso que fora eleito principalmente porque afinal de contas é o maior livro do gênero de pancadarias e engraçadices que se possa encontrar - e como qualquer pessoa sabe: esse é um tema que todos gostam e que nunca cai de moda! Só em segundo lugar é que vem o fato de ser o mais impressionante relato metafórico do que é ou pode ser a existência humana: quer sejam nos pontos mais práticos, quer sejam nos seus aspectos mais líricos ou filosóficos!

Evidente que não vão poder encontrar nada disso aqui, pois como já foi dito antes: trata-se apenas de uma adaptação. O Cavaleiro d'Astúrias é mais outra copiada-criação, em que com toda liberdade posso acrescentar, reformular, mexer e remexer, fazendo e desfazendo, e por sorte, de uma mera imitação pode surgir algo de algum bom gosto, ou qualquer outro valor. "Como quem põe uma rodela de metal barato numa pedra de brilhante e a isso se pode também chamar de jóia! Já que uma pedra é diferente de um anel, mas os dois juntos formam a jóia mesmo que a qualidade do anel por si só seja insignificante!".

Dessa forma, aproveitando o melhor enredo que conheço, pretendo tirar alguma satisfação pessoal e se possível fazer com que os novos leitores possam tirar alguma lição e diversão, que é o que mais importa – também que os que já são velhos conhecidos de Quixote, possam com este "outro" de repente se surpreender e se emocionar, ou que pelo menos no fim sintam que valeu a pena acompanhar essa série – talvez apenas para confirmar que é pura verdade quando digo que no fundo de alguma forma essa é outra história, mesmo seguindo a mesma linha mestra já preconcebida.

E para terminar: "não é vergonha alguma querer imitar os grandes!". Vergonhoso mesmo é ser influenciado por quem se mostra imoral e desprezível, e isto é o que mais acontece hoje em dia. Mais não convém também "contrariar a ordem das coisas em que cada qual gera o que lhe seja semelhante!". Por isso, portanto, sinto-me bem tranquilo em querer realizar uma versão deste clássico.

Algo que pode gerar alguma curiosidade é o título, Cavaleiro D'Astúrias, que é referente a uma nova passagem que pretendo criar – um grande torneio que só ocorrerá no final.

Não posso também me esquecer de citar que apresentar esta longa série, além de ser um grande desafio pessoal, é também, antes de tudo, uma grande homenagem ao autor e a história que mais me tocaram, tanto e tão profundamente, que não me restou outra qualquer alternativa possível, senão de querer do fundo do coração tomar parte dela também. O resultado disso, amigos, está agora em suas mãos!

Isso é tudo – por enquanto – e para os que ficaram um pouco incomodados ou indignados por eu os ter chamado no início de "desocupado leitor", a isto não me culpem: pois apenas quis começar pelo mesmo vocativo que estava no original, no primeiro prefácio escrito por Cervantes. O que por si mesmo já dá o tom irônico e sutil de todo o resto – pois para mim é como quem diz: "Só sendo muito desocupado da vida mesmo para estar lendo isso aqui agora!".


Até a próxima,

Fernando Possidente


Cavaleiro D'AstúriasOnde histórias criam vida. Descubra agora