capítulo 15: NA ILHA DA TORTUGA

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Quando o Relâmpago ancorou em porto seguro, para lá do estreito canal que o punha a coberto de qualquer surpresa da parte das esquadras espanholas, os corsários estavam em plena festa.


Em frente ao cais, sob vastas tendas e à sombra fresca das palmeiras, aqueles terríveis bandidos banqueteavam-se alegremente, consumindo o seu quinhão do último saque.


Tigres no mar, esses homens tornavam-se em terra os mais alegres habitantes das Antilhas, e, coisa realmente estranha, talvez até os mais corteses, pois que não deixavam de convidar para suas festas os espanhóis a quem tinham aprisionado com a esperança de resgates, e até as prisioneiras, para com as quais se comportavam como verdadeiros fidalgos, desfazendo-se em amabilidades, a ponto de fazer-lhes esquecer a sua triste condição.


Dissemos triste, porque se os resgates exigidos não chegavam, recorriam frequentemente a meios cruéis para os obter, mandando aos governadores espanhóis a cabeça de algum prisioneiro para o constranger a apressar-se.


Quando o Relâmpago ancorou, todos aqueles corsários interromperam o banquete, as danças e os jogos, para saudar com ruidosos vivas o regresso do Corsário Negro, que entre eles gozava de uma popularidade talvez igual à do famoso Olonês.


Ninguém desconhecia a sua audaciosa empresa para arrancar ao governador de Maracaibo o pobre Corsário Vermelho, morto ou vivo, e conhecendo por experiência a sua coragem chegaram a ter a ilusória esperança de os ver regressar ambos.


Mas vendo descer a meia haste a bandeira negra, sinal de luto, todas aquelas ruidosas manifestações cessaram como por encanto; depois, aqueles homens juntaram-se silenciosamente no cais, ansiosos por noticias dos dois corsários e da expedição.


O cavaleiro da Rocha Negra, do alto do tombadilho, vira tudo. Chamou Morgan, que fazia arriar alguns escaleres, e disse-lhe, apontando para os homens reunidos na praia:


- Ide dizer-lhes que o Corsário Vermelho teve honrosa sepultura nas águas do grande golfo, mas que seu irmão voltou vivo para preparar a vingança...


Interrompeu-se por alguns momentos; depois, mudando de tom


- Mandareis avisar o Olonês de que esta noite irei ter com ele; depois irei levar os meus cumprimentos ao governador. Mais tarde me avistarei com ele.


Dito isto, desceu à câmara onde estava a duquesa.


- Senhora, está um escaler preparado para vos conduzir a terra.


- Estou pronta para obedecer, cavaleiro - respondeu ela. - Sou vossaprisioneira e não me oporei às vossas ordens.


- Não, senhora, já não sois prisioneira.


- E porquê?... Ainda não paguei o meu resgate.


- Já foi entregue no cofre da tripulação.


- Por quem?... - perguntou a duquesa, muito admirada. - Eu ainda não preveni o marquês de Herédia, nem o governador de Maracaibo da minha prisão.


- É verdade, mas alguém se encarregou de pagar o vosso resgate respondeu o Corsário Negro, sorrindo.


- Vós, talvez?...


- Pois bem; e se tivesse sido eu?


A duquesa ficou um pouco silenciosa; depois disse com voz comovida:


- É uma generosidade que eu não esperava encontrar entre os corsários das Tartarugas, mas que não me surpreende se quem a praticou se chama o Corsário Negro.


- E porquê, senhora?


- Porque vós sois bem diferente dos outros. Nestes poucos dias quepassei a bordo deste navio, tive ocasião de poder apreciar a gentileza e a generosidade do cavaleiro da Rocha Negra. Rogo-vos, em todo o caso, que me informeis em quanto foi fixado o meu resgate.

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