Capitulo XV- Memórias da meia-noite e a última dança

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Querido Diário,

Quando aceitamos que não existe uma salvação ou algo que possa remediar os nossos pecados, finalmente encaramos a vida de cabeça erguida e entendemos cada uma das nossas mais secretas imperfeições humanas. Há cada badalar de sinos, nossas escolhas se transformam nos fantasmas que carregaremos eternamente conosco. Algumas mitologias os chamam de memórias da meia-noite, outras pessoas, apenas de remorso.

Apesar de nunca ter sido uma garota religiosa, Susan dizia que costumava orar a São Judas por mim. Bem, era apropriado. Afinal, ele era o santo das causas perdidas...

[...]

A igreja de Santo Christopher já estava se esvaziando após o fim do memorial em homenagem ao bom pároco de Allenwood.

Realmente nunca entendi como as pessoas mudavam os seus pensamentos a respeito de outra só porque ele ou ela não se encontrava mais nesse plano. Tomem o meu caso como exemplo. Susan havia me dito certa vez que por mais que ela tentasse imaginar alguém, eu ainda era a pior pessoa que ela conhecia. Porém, isso não a impediu de estar presente no meu funeral. Eu estava certa. Courtney Heitt era incrível em vida e fabulosa na morte.

Todos pagariam um centavo pelos meus pensamentos, mas eu poderia vendê-los por um dólar. É engraçado como as pessoas começam a te ouvir depois que você está morta.

— Eu ainda não consigo acreditar que o Tomás se foi. — Susan disse angustiada, colocando a sua mão contra os lábios na tentativa de evitar o choro.

Imagino que estava sendo complicado para a Miss Religion retrair suas lágrimas. Mas era o certo a se fazer. Como explicar para os bons habitantes daquela cidade que você sentia pela morte de um homem que nunca deveria ter sido seu?

— E sabe o que mais dói? — Ela perguntou retoricamente, olhando para Natalie e Aaron que estavam de mãos dadas com ela. — Em nosso último momento juntos, ele finalmente disse que me amava. E eu soube que, apesar de errado, teria ele para sempre. Quem teria pensado que o para sempre poderia ser interrompido por uma vida curta.

— Eu sei o quanto é difícil, mas você irá superar. — Natalie tentou parecer confiante.

— E como você sabe disso? — Susan perguntou, enquanto os três mentirosos se direcionavam até o carro que os levariam de volta para a casa de Natalie.

— Bem, eu não sei. — Natalie confessou com um olhar longínquo. — Mas quando estamos em alto mar em uma noite tempestuosa, esperar pela luz de um farol é tudo o que podemos fazer.

— Profundo. — Aaron disse com um sorriso debochado. — Você tem ido naquela barraquinha de biscoitos da sorte com o Noah?

— Calado, Sandborn. — Natalie esbravejou, dando um soco sobre o braço do amigo.

Pela primeira vez em muitos dias, Susan finalmente conseguiu esboçar uma serena e descontraída gargalhada.

[...]

Assim que chegaram à bela casa dos Arys, Susan e Aaron se direcionaram juntamente a Natalie até o seu quarto. Claro que a ruiva poderia simplesmente repousar a sua cabeça sobre o colo do moreno enquanto ele tentava a confortar, mas como pessoas como nós agimos de forma diferente até mesmo perante o luto, as garotas simplesmente resolveram experimentar os vestidos que usariam no grande baile dessa noite.

— Eu não acredito que vocês me arrastaram até aqui para ficar fazendo coisas de menininhas. — Aaron atirou uma almofada contra as garotas que estavam de frente para o espelho vitoriano do quarto de Natalie.

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