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Por causa do cansaço da viagem, ele apenas tomou um copo de leite quente,  mesmo que sua mãe insistisse que ele comesse algo, a sua recusa acabou sendo aceita e ele foi direto para seu antigo quarto, nada ali parecia ter sido mudado ou tirado do lugar, tudo estava exatamente como lembrava que seu quarto era. 

Não demorou para que seus olhos ficassem pesados e ele logo adormeceu. Acordou com o cheiro de café invadindo o quarto, quantas saudades ele sentia de acordar com o cheiro do café de dona Margarida que assim que o viu abriu um largo sorriso:

_ Já está de pé meu filho, ainda é muito cedo deveria ter ficado um pouco mais na cama.

_ Eu até ficaria minha mãe se hoje não fosse conhecer a paróquia, mas hoje tenho que encontrar-me com o Frei Jorge para que ele me fale um pouco dos detalhes  da igreja da comunidade, quero fazer um trabalho comunitário para retirar essas crianças da rua também, para isso preciso conhecer os paroquianos. 

_ Muito bem meu filho, tenho certeza de que o Frei lhe explicará tudo certinho, mas você não vai sair daqui antes de tomar um café reforçado.

Enquanto tomava o café com leite e uma fatia de pão de forma o rapaz buscava informações obtendo resposta vagas de sua mãe:

_ Mãe, as coisas por aqui como está?

_ Nada demais meu filho, continuam como você lembra.

_ E como acha que esse povo vai me receber, acha que ainda lembram do que aconteceu?

_ Ninguém mais lembra disso meu filho, aquilo que aconteceu foi um erro que já foi corrigido então esquece.

_ E o Nathan?

_ O que tem ele?

_ Ainda vive na cidade, casou, tem filhos?

_ Nathan eu nem me lembro quem é ele Noah, agora toma seu café e não vai deixar o frei esperando - a mulher resolveu cortar assunto.

Sua presença causava curiosidade nas pessoas quando passava pelas ruas e saudava a cada um com um "oi",  alguns rostos conhecidos o olhavam demoradamente tentando articular quem ele era ou lembrando o que havia acontecido a dez anos atrás. 

Muitas crianças corriam animadas pelas ruas, adolescentes conversavam em rodinhas, muitos rostos ele não conheciam isso de certa forma o deixou aliviado, quanto menas pessoas conhecesse aquele triste episódio mas confortável ele ficaria.

O prefeito da cidade fazia questão de conhecer o novo padre do vilarejo e Noah estava indo ao seu encontro juntamente com o Frei Jorge para uma primeira aproximação.
Assim que foi liberada a entrada dos padres ao gabinete onde ali teriam uma conversa e com certeza o prefeito receberia uma benção apostólica, seus passos se estagnaram, pensou em recuar e sair correndo dali e nunca mais retornar porém não podia fazer isso, e também tinha que encarar aquilo de uma vez por todas.

_ Então você é o prefeito do vilarejo?

_ Ora, ora então você é o novo padre, mas me falaram que o nome do padre era John, você não se chama John.

_ Tem razão, porém quando nós viramos sacerdotes assumimos um compromisso e tudo o que ficou para trás virou passado então temos que nos revestir do novo homem por isso trocamos de nome para assumirmos a nossa nova conduta. 

_ Nem tudo se pode deixar para trás padre, por exemplo a nossa história, não pode ser esquecida.

_ Nós não esquecemos, isso seria amnésia, mas escolhemos deixar para trás aquilo que não nos serve.

_ Esse é um bom debate, por que como sabemos o que não nos serve?

_ Quando nos faz mal e nos afasta do caminho da santidade. 

_ Eu nunca almejei ser santo padre, será que por isso continuo o mesmo?

Os olhos de ambos se cruzaram e parecia que havia saído faísca, ficaram ali se encarando por um tempo, o frei alheio ao clima que estava, ainda sorria e acabou por dizer:

_ Passado, presente ou futuro, quando trazendo bagagens antigas acumula as que vamos construir para a frente por isso se torna um fardo pesado, quando nos tornamos sacerdotes,  agora não carregamos as nossas dores apenas e sim de centenas de pessoas ou até mais, se tivermos as nossas cargas e juntarmos com as cargas dos paroquianos como nos sentiríamos no final?

O frei parou de falar e olhou para os dois que o olhava:

_ Sábias palavras frei - acabei por confirmar com um balançar de cabeça sobre o que ele havia dito. 

_ Tem razão frei - Nathan foi obrigado a se conformar dando a conversa por encerrada.

Enquanto seus olhares se cruzaram Noah pode sentir toda a mágoa invadir o seu peito, as lembranças pareciam que veio como uma enxurrada porém ele sentia-se culpado por não ser capaz de perdoar aquele que um dia havia brincado com seus sentimentos, porém as palavras do frei o fez raciocinar o quão errado ele estava, que espécie de padre seria se não liberasse o perdão?

Sorriu fraco na direção do moreno que retribuiu da mesma forma.

Quando terminou a conversa a secretária de Nathan foi avisada que preparasse sua surpresa a eles.
A moça então saiu e não demorou para que ela retornasse com uma bandeja de guloseimas, café, leite, sucos, bolos, salgados e doces eram algumas iguarias que estava na bandeja. Frei já preparava o seu prato abastecendo-a um pouco de tudo. Já Noah escolheu uma maça e um cacho de uvas, escolheu também uma fatia de melancia, colocou tudo em um prato, Nathan também comia algumas iguarias mas no momento ele havia escolhido uma fatia de pão levando a boca antes de Noah se recompor:

_ Hei não coma antes que demos graça ao alimento - advertiu o loiro, recriminando o moreno que já havia abocanhado uma farta mordida do seu pão. 

_ Desculpa é que eu não tenho esse costume de dar graça por tudo. 

Agora foi a vez do frei dizer:

_ Deveria ir mais vezes a missa Nathan assim saberia que rezamos pelo alimento e por tudo e todos a nossa volta, é nosso dever levar alguém a Deus mesmo nas suas adversidades, muitos nem sabem dar valor aquilo que tem, ao invés de agradecer só sabem reclamar suas lamúrias, como se isso fosse mais importante do que agradecer pelo que tem. 

O PadreOnde histórias criam vida. Descubra agora