'Você pode acabar com esta dor. Incline a cabeça para trás. Feche os seus olhos. Vá em direção ao silêncio do riacho.'
Uma xícara de chá estava indo em direção à poça escarlate. A superfície quebra o copo, juntando porcelana e sangue. O rosto de William é revelado em meio aos cacos e logo submerge na piscina carmim. Lentamente fora coberto pelo líquido escuro, mergulhando nas profundezas que não pareciam findar.
Paralelamente, socorristas e enfermeiros empurravam velozmente a maca com o corpo inconsciente pelos corredores do hospital. A porta da sala de cirurgia fora violentamente aberta.
O sangue começou a se transformar em água. A do oceano, as mesmas águas intensas daquele dia. Ainda podia-se ver o avermelhado diluído em meio as bolhas formadas pelo baque dos dois corpos. O gosto metálico e salgado agora era presente em sua boca.
A linha preta de sutura adentrava a pele com precisão. A equipe médica estava dividida entre cuidar do sangramento e entubar as vias aéreas de Graham, preparando-o para um procedimento de lavagem gástrica. Uma sonda nasogástrica fora introduzida, passando pela nasofaringe e esófago, deslizando cuidadosamente até a sua cavidade gástrica.
O rosto afundado no pescoço de Hannibal, juntamente com os seus braços enlaçados no mesmo. Ali deveria ter sido o fim.
Os dois braços já estavam envoltos por faixas. Se tivessem demorado demais para prestar socorro não sobraria nenhum pingo de sangue sequer no corpo do homem. Os cortes foram fatais, porém não ao ponto de matar instantaneamente. Devido ao tempo de exposição da hemorragia era de se esperar que o paciente contraísse uma anemia. Agora ocupavam-se em preencher o estômago pela sonda com uma solução para neutralizar os efeitos da dosagem excessiva do medicamento ingerido.
O ambiente mudou. Will estava sentado ao lado de Hannibal na Capela Palatina. Seus olhos estavam fechados. Sentiu o olhar de Lecter sobre si.
— Isso é o que sempre quis para você, Will. Para nós dois. — A voz ecoou.
Sua mente estava lhe pregando peças. Ele sabia quando e aonde tinha ouvido aquela frase pela primeira vez. De qualquer maneira, mesmo sabendo que tudo era ilusão, sentiu uma crescente felicidade. Talvez ele preferisse essa versão dos fatos, do que a realidade cruel. Abriu os olhos que estavam marejados. Por mais que tenha se esforçado para falar algo, nada saia além de lágrimas cruzando o seu rosto.
E então tudo escureceu.
Academia do FBI, Quântico, Virgínia.
Os cabelos balançavam a medida que corria apressadamente. Os fios acobreados presos num longo rabo de cavalo, a camiseta de algodão cinza claro e as gotículas de suor. O seu tênis fazia um barulho estridente por conta da borracha que chocava-se no piso encerado. Suas duas mãos cheiravam à fumaça das armas de fogo utilizadas no estande de tiro mais cedo. Ao virar o corredor aceleradamente, acabou colidindo contra um dos funcionários e este carregava uma montanha de papeladas que agora repousavam sobre o chão, formando uma bagunça de papéis brancos espalhados aleatoriamente.
A jovem estava completamente envergonhada por conta do ocorrido. Atrapalhada, tentou recolher os papéis. Só parou quando o homem irritado a mandou sair. Achou a atitude mesquinha, por mais que ela tenha sido descuidada, não havia ignorado e ainda tentara ajudar. Levantou do chão onde estava agachada e prosseguiu, desta vez andando normalmente, para evitar outra situação desconfortável.
Após procurar por alguns minutos, encontrou a sala e aproveitou o reflexo da porta de vidro para recompor a sua aparência. Como havia recebido o chamado em cima da hora — e ainda por cima enquanto realizava um exercício de aprisionamento no campo — o seu cabelo estava com pequenos pedaços de grama e sua vestimenta também. Jack Crawford estava sentado em seu gabinete falando ao telefone quando Clarice adentrou o cômodo. Rapidamente o homem terminou a conversa quando notou a presença da jovem.
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The Broken Teacup
FanficWill Graham sempre foi um castelo de cartas inacabado esperando ser demolido a qualquer momento. Ele só não esperava que o psiquiatra canibal viria a criar gosto por derrubar as cartas, aguardando que fossem reconstruídas para serem levadas ao chão...