Uma dama de A a Z - Parte Um.

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Chego no estacionamento e imediatamente começo a procurar, nas vagas reservadas, o carro da Camila, um Prius verde-claro metálico. Sempre chego antes dela e hoje não é exceção. Só que hoje, apenas por ver a vaga dela eu já sinto uma diferença. Agora nós temos uma conexão. Sinto que é minha função protegê-la, e fico curiosa para saber onde ela está e o que está fazendo.

De repente eu me lembro do idiota do Major. As fofocas dizem que eles estão namorando. Uma leoa furiosa e invejosa começa a rugir dentro de mim. Major é um bundão, ele com certeza não merece a perfeição que é a Camila. Noto que a vaga dele também está vazia e começa a me dar um nó no estômago só de pensar que eles podem estar juntos agora, finalizando o sexo matinal ou tomando banho e até mesmo brigando para saber quem tomou o resto do leite. Maldito.

Resignada, começo a sair do estacionamento na direção do escritório junto com um grupo de empregados que também acabou de chegar. Me sinto diferente hoje ao passar na recepção e ver o sinal de néon da República do Rabisco. Estou diferente porque quero uma coisa de que tinha desistido há muito tempo. A ideia de abraçá-la e beijá-la se tornou mais tangível. Quero que Camila seja a minha garota e esse sentimento está cravado em mim.

Quando chego na minha mesa, fico feliz de ter um desafio na cena em que tenho de trabalhar. Mesmo com toda a exuberância que é a animação, o trabalho exige dedicação total. Espero que, ao me concentrar na tarefa, esqueça um pouco a obsessão pela Camila, mas é pouco provável.

Charlie sempre deixa que eu trabalhe com as partes mais físicas dos quadrinhos, pois venho de uma escola antiga, meu estilo de animação se inspira no Tex Avery, adaptando uma cena e destacando mais o lado artístico. A tarefa da semana envolve uma luta entre o Bucky e o Bernie, depois que o Bernie quebra o controle remoto do videogame do Bucky.

Antes mesmo de começar, imagino a cena toda na cabeça e como deve ser a expressão deles.

Posso até ser tímida, mas meu trabalho é cheio de energia e sentimentos. Pequenos detalhes, como um olhar esbugalhado ou um queixo caído até o chão, fazem toda a diferença. Aponto meu lápis, coloco os papéis no pregador, ajeito a luz na mesa e mergulho de cabeça no trabalho. Toda a minha ansiedade e expectativa fluem através dos meus dedos, e o resultado são desenhos particularmente cheios de energia.

— Ei, Lauren, como estão as coisas? — Charlie pergunta quando chega na minha baia e percebo que já é quase meio-dia. Tiro meus fones de ouvido enquanto entrego para ele um dos esboços que eu tenho certeza de que ele vai gostar.

— Era isto o que você tinha em mente para a cena? — o Bucky está batendo na cabeça do Bernie com o controle remoto que agora está pendurado na testa dele como um chifre. Em vez dos olhos, desenhei dois xis, e o sorriso maroto do Bucky vai de orelha a orelha.

— Sim, está ótimo! — ele exclama. — Perfeito! Você sempre consegue fazer muito melhor do que eu imagino, Tex.

Quando Charlie se refere a mim como o grande animador Tex Avery, já sei que ele está querendo pedir alguma coisa. Ele não é uma pessoa de dar elogios à toa e dá para perceber em seu tom de voz que quer algo.

Simplesmente me viro na direção dele e espero.

— Olha, não quero pressionar, mas a gerência está pedindo que todos os animadores façam aquela jornada extra esta semana, pois estamos com a produção bastante atrasada.

A notícia é bem pior do que eu imaginava.

— Caramba, você está querendo dizer que temos que fazer mais de quarenta desenhos por dia? Nós não somos uma máquina de cópias.

Dear To Me. [Camren | Intersexual]Onde histórias criam vida. Descubra agora