Capítulo IX - O verão

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Aperte play e acompanhe a leitura ao som de "A Nossa Praia - Matheus & Kauan".

Anabela:

O que eu mais amava naquele garoto era a forma como ele me fazia sentir especial com tão pouco, era a forma como ele vivia me elogiando mesmo quando eu estava em péssimas condições. Ele amava meu cabelo revolto que mais se parecia com uma juba de leão, ele amava meu corpo mesmo com cada gordurinha aparente, ele amava meu sorriso mesmo com meus dentes meio amareladinhos... Ele sabia como fazer uma pessoa se sentir única, sabe? O pai dele costumava ir à praia jogar futebol e eu estava ficando na casa da minha avó nessa mesma praia. Então quando o sogrão ia jogar bola, ele ficava comigo. Num desses dias encontramos uma amiga nossa, Isadora, e saímos os três juntos. O Hugo era muito brincalhão, era um molecão ainda – deve ser por isso que combinávamos tanto – e acabou vindo pular na minha cacunda. Cai no chão e ralei meus joelhos.

Quando olhei para ele não consegui sentir um pingo de raiva. O jeito como ele ria da situação trazia uma felicidade tão grande, mas tão grande... A risada dele tocava mesmo o coração, acalmava, curava e trazia prazer. Sabe aqueles risos de crianças que contagia cada pedacinho do nosso corpo? Foi exatamente isso que eu senti. Quando ele viu o machucado no meu joelho já foi tomado pela preocupação, deu um beijinho na minha testa e disse para voltarmos para minha casa para passar algum remédio para não criar bactérias.

- Vai ter que me levar no colo, tu me machucou! – falei brincando.

Ele me pegou no colo e me levou 5 quarteirões carregada no colo. Nossa amiga ria de nós dois – e eu também. Eu não consegui acreditar que ele realmente estava fazendo isso. Lembro que alguns carros até passavam buzinando. Ele me conquistava nessas pequenas coisas que ele fazia. Ele sabia valorizar o instante, sabia valorizar a grandeza de um pequeno gesto, o poder de um elogio simples... Não precisava "perder para valorizar", ele valorizava para não perder.

Hugo:

A sintonia era única e exclusiva nossa. Não havia nenhuma outra parecida. Costumávamos ouvir com frequência "foram feitos um para o outro", mas ninguém sabia bem o por que. Nós construímos uma amizade forte antes de um envolvimento e acho que essa foi nossa grande diferença para os namoros das pessoas que conhecíamos. Não nos apressamos, não corremos contra o tempo, fizemos o tempo correr ao nosso favor.

A Ana sempre me cobrava um pedido de namoro, eu ainda não havia pedido. Não achava tão necessário já que estava mais do que claro o que nós tínhamos, não só para mim, mas para todos que vissem. Entretanto eu queria agradá-la. Eu não sabia bem como fazer um pedido de namoro e ainda mais pra ela que parecia uma princesa saída de um conto de fadas. Ela sempre assistia aqueles vídeos de pedido de namoro e casamento em que tem uma mega produção por trás. Aqueles que o cara chama a família, amigos e eles dançam, depois ele surge com um buquê e se ajoelha no meio de uma praça movimentada. Não era meu feitio nada disso, então resolvi pedir do meu jeito, mas fazendo com que ela se sentisse especial. Era fevereiro, final do verão:

- Aiai, que pena que eu não namoro, sabe? Ainda sou solteira, ninguém me pediu em namoro... – provocou.

- Quer namorar comigo, Ana?

- Não. – respondeu.

Buguei e perguntei novamente:

- Namora comigo Ana. Quero ser teu namorado.

- Não. – e riu.

Continuamos conversando e brincando como de costume. Um pouco depois voltamos para o mesmo assunto:

- Você nunca me pede em namoro sério, só fala brincando Hugo.

- Não, eu te pedi em namoro duas vezes já e tu recusou...

- Não foi sério esse pedido, tu sabe. – respondeu

- Foi sim Ana. Quer namorar comigo?

- Jura? É sério? Claro que eu quero!

E nesse momento ela me abraçou com uma intensidade que pensei que fosse capaz de nos tornarmos um corpo só.

Anabela:

Combinamos de jantar fora só nós dois. Na esquina do quarteirão seguinte da casa da minha avó havia um restaurante chamado "Verdão" e optamos por comer ali por ser perto e ter comida gostosa. Nos arrumamos e fomos. Quando estávamos voltando começou um temporal e não conseguimos chegar em casa. Caia uma chuva muito forte e raios. Estávamos na rua da beira da praia e eu sabia que os raios costumavam cair próximos ao mar. Recebi um telefonema da minha mãe e ela viria nos buscar de carro. Congelei interiormente de medo quando ouvi um estrondo de um raio caindo muito próximo.

Corremos para o prédio mais perto e ficamos sentados na escada com marquise. Não consegui me conter e chorei imensamente de apreensão. O Hugo me puxou para o colo dele, me abraçou e começou a me acariciar. Tentava me acalmar, mas eu sabia que por dentro ele estava surtando tanto quanto eu. E mais uma vez ele me surpreendeu com uma pequena atitude: quando minha mãe chegou ele tirou a única camisa que vestia e me pediu que colocasse na cabeça e corresse para o carro. Obedeci. Ele ficou imóvel na escadaria do prédio, não compreendi.

- Anda Hugo.

- Não, vou esperar meu pai aqui, relaxa. Vai com tua mãe.

"Ele é louco?", pensei. O convenci a entrar e fomos para casa. Chegando lá nos enrolamos em toalhas para tentar nos secar um pouco e ele me colocou deitada no seu colo. Ficamos esperando o pai dele chegar. Desejava que aquele momento não acabasse, sabe? Ele me fazia sentir protegida e segura só me colocando no colo dele e me abraçando. O efeito dele sobre mim era surreal.

O tempo passa, o amor nãoOnde histórias criam vida. Descubra agora