Capítulo XI - As coisas começam a desandar

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Aperte play e acompanhe a leitura ao som de "Se Fosse Tão Fácil - Mar Aberto".

Anabela:

No final de 2012 as coisas começaram a desandar bastante. Confesso que era imatura e não sabia lidar com o tamanho desse sentimento dentro de mim. Eu fiquei assustada e comecei a ficar receosa. Minha mãe estava cansada de algumas atitudes dele e comecei a notar outras a mais, tudo foi acumulando até um ponto que me esgotei e pensei não amar mais o Hugo. Não era nada demais, era bobeira – analisando a situação hoje -, mas na época machucava.

Conversamos, pois eu tinha essa mania de sempre falar tudo, cada vírgula e disse que não gostava da forma como ele havia sido egoísta quando não permitiu que eu procurasse um trabalho e quando o padrinho o convidou para trabalhar ele não pensou duas vezes, a forma como me machucava quando algumas amigas dele falavam algo ruim sobre mim e ele não se impunha e como a minha mãe vinha reclamando que ele pegava o dinheiro da minha mão para pagar as coisas mesmo quando era eu quem estava pagando. Ele me convidou para passarmos o Ano Novo em uma cidadezinha pequenina chamada Imaruí e eu recusei, preferi passar na praia onde já estava acostumada e ao lado da minha família.

Passamos o final de ano muito bem, até o dia 31/12 quando outra ação incomodou não só a mim, mas a minha família. Combinamos de ir à uma festa com uns amigos dele e antes passaríamos na casa desses amigos, porém estávamos na casa da minha avó e lá costumavam ficar todos os familiares, em torno de umas 20 pessoas ficavam na casa. E tínhamos apenas dois banheiros para vinte pessoas. Nos atrasamos e o Hugo deu um surto na frente de todo mundo:

- Eu te avisei né Anabela. Era para termos saído já. Tu tem que demorar pra se arrumar?

Não tive nem oportunidade de responder. Minha mãe já foi logo se metendo:

- Hugo, nós temos apenas um chuveiro funcionando para todo mundo, tu estais aqui na nossa casa e vai se acalmar, parar de apressar a Ana e esperar. Todos temos que nos arrumar. Quem vai levar vocês sou eu e só vou sair quando a Ana estiver pronta.

E mais uma gotinha de desentendimento caiu no meu copinho que já estava quase transbordando. Conversei de novo com o Hugo e ele ofereceu que fossemos para Imaruí quando a família dele fosse novamente, prometeu que iria ser perfeito. Aceitei. Curtimos o nosso Ano Novo e nossos dias estavam bons novamente. Minha avó estava com câncer e eu sabia que o estado dela estava grave. Ela passava mal e tínhamos que sair correndo até a casinha dos salva-vidas pedir socorro de vez em quando. E foi no dia 14 de Janeiro de 2013 que as coisas para ela pioraram. Eu estava dormindo e quando acordei a casa estava movimentada demais, vi os bombeiros passando com uma maca, mas sem ninguém na maca.

Com os olhos arregalados perguntei ao Hugo o que havia acontecido.

- Eu não queria te acordar, preferia te ver dormindo. Tua avó passou mal e acho que vão levar ela pro hospital.

Logo minha mãe apareceu mandando nós arrumarmos nossas coisas que iriamos voltar para a cidade, pois minha avó realmente foi para o hospital. Deixamos o Hugo em casa e fomos onde minha vó estava, ela pediu para cada pessoa entrar: filhos, primos, irmãos... Eu fui a única que não consegui ver minha avó, não quis entrar. Eu não queria que a última imagem dela fosse fraquinha, cheia de agulhas nas veias com tubinhos e com um ar mórbido. Queria lembrar daquela senhorinha de olhos verdes brilhantes, rechonchuda, sempre com os cabelos e unhas feitas, com cheiro de baunilha e com batons clarinhos que adorava jogar dominó e baralho.

Fomos embora tarde da noite. Conseguimos dormir umas duas horas apenas até o telefone tocar com a notícia que minha avó havia partido dessa para uma melhor. Era dia de semana ainda quando foi o funeral, 15 horas da tarde. Contei tudo o que aconteceu ao Hugo e ele, como sempre, me deu o total apoio. Apareceu no funeral com a família inteira: pai, mãe e irmão, sendo que ele e os pais trabalhavam e o Isaac ainda estudava. Acho que nesse dia foi o principal dia em que eu percebi que ele estava, realmente, ao meu lado.

Hugo:

Convidei a Ana para ir à uma praia pequena onde eu costumava passar o verão. Era simples, estrada de terra, lagoa, casa de madeira pequena, nada comparada com a casa à beira mar, de dois andares com 6 quartos onde a Ana ficava. Mas apesar dela viver em um mundo completamente diferente do meu, eu sabia que não importaria o caminho, mas sim a caminhada. Ela não se importaria de abrir mão da cama com colchão confortável dela para dormir no chão comigo. Na viagem ela veio dormindo e acordando, estava ansiosa. Quando chegamos ela caiu direto na cama de casal do quarto onde ficaria meus pais, meu irmão e nós dois e dormimos por duas horas.

Quando acordamos resolvemos caminhar. Convidei minhas primas, Amanda e Vitória, e fomos andar pelas estradas de chão e morros de Imaruí. As três se deram bem, para a minha surpresa. Minhas primas eram muito quietas e não se davam bem com quase ninguém, mas por algum motivo gostaram muito da Ana. Batemos trilhões de fotos porque a Ana é apegada em fotografias, ela ama registrar cada momento. Diz que gosta de ter por causa da amnésia dela e também para poder reviver os momentos felizes que ela viveu. Por um lado, concordo. Quando voltamos, minha família estava pescando. Perguntei se ela queria tentar e ela super contente respondeu que sim.

Dei a vara na mão dela e me posicionei atrás dela, lancei a linha junto dela e ensinei como mexer no molinete. Depois deixei que ela fizesse sozinha e claro que ela tinha que fazer algo desengonçado e conseguiu enfiar o anzol no meio de duas pedras. Precisei mergulhar na lagoa e para tirar o anzol. Confesso que fiquei bravo, não queria me molhar, mas sei que ela não fez por querer.

Anabela:

Por dentro eu ria desesperadamente de ter colocado o anzol entre pedras e o Hugo ter que entrar na água para tirar, mas por fora me continha. Ele ficou chateado. Estava entardecendo e ficando frio. Apesar disso foi um momento tão gostoso. Uma atividade completamente diferente do que estávamos acostumados a fazer. No dia seguinte fomos para uma outra praia, tivemos outro dia maravilhoso. A família toda foi, tomaram banho de lagoa, conversaram, riram, brincaram... Havia um balanço para se jogar na água e todos viraram criança nesse dia. Foi um dia inesquecível, fiz vários vídeos e fotos.

No dia seguinte fomos embora. O tempo que passei nessa cidadezinha longe de toda a tecnologia, longe de pessoas negativas, fizeram com que eu me conectasse ainda mais com o Hugo. Eu sentia que as nossas almas estavam entrelaçadas, eu sentia que estávamos vibrando na mesma sintonia depois de um transtorno chato no relacionamento. Eu só desejava que o final de semana não acabasse, que pudesse ficar dando replay um milhão de vezes. Mas voltamos embora e a realidade voltou a reinar, o problema no relacionamento ainda estava ali. Quando as aulas começaram e contei sobre nossa história, minhas 'amigas' começaram "ai termina, vamos ficar solteira e curtir". E desde já eu confesso – sem nenhuma gota de orgulho - que sim: eu fui extremamente trouxa. O arrependimento que carreguei e carrego até hoje é indescritível porque eu dei ouvidos às pessoas. Talvez falassem por inveja, ou maldade, ou só por egoísmo mesmo.

O tempo passa, o amor nãoOnde histórias criam vida. Descubra agora