Eu não me sei, contudo sabes?

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Não existem anjos doentes... mas existem humanos. 

Como que se pensa no amor, 
a exatidão perfeita para o lar.
E o desejo o arbusto que estragou, 
Tirando-me o desejo de voar. 
Sonhe, pequena; e ela franziu a testa.

Como pode um peixe doce ser salgado?
A melancolia transtornada fez-se alado?
Quem pudera o amor ser tão frágil assim.
Boatos de que a morte amou a vida;
É o que corre na cidade!
Boatos. 

Doce flor de benjamim, quem disse tu?
Foste a forca, foste a força, e agora tu!
Misericórdia! Gritara ela. Como pode...
A exatidão da certeza não a cabe, são bonitas.
E as reticências são bem mais que infinitas.

Anjos doentes não são anjos, 
foram sim quando sem dor.
Anjos belos sim são anjos,
A doença é a faca do amargor. 

Ela caiu sobre seu ventre,
Desvendou a pura sede do teu ser,
Amarrou em si sua própria rede,
E ninguém sabe o que ela virou. 
Sonhe, pequena; e ela fechou os olhos.


Era noite quando a lua resolveu desaparecer, tudo parecia mais escuro, e as luzes, nem mais tinham sabor de noite mesmo... Não me entenda mal, pois a lua por si só não caiu no Universo vasto e não se teve mais notícias, as nuvens que não mais cinzas mas sim pretas, a cobriram. A minha estrela favorita nem tão pouco mais brilhava. 

Lástimas, foi o que pensei comigo mesmo, e tudo tava um tédio. Nem eu sabia o motivo disso tudo. Meu nome, minha idade, minha classe social, o que visto ou o que tenho não importa; não insista, nada disso te importa. Tá... Por partes eu até diria qual meu sexo, ou gênero, mas não é preciso por momento. Queria mesmo era que concentrasse toda a força de seu cérebro nessa pequena historinha que eu venho vos contar. Era noite, cerca de quatro da madrugada, tudo escuro, claro; mas algo havia me atraído. Eu juro que não sabia o que ele era, ou quem o era, ou se o tal era quem eu achava ser. É que hoje em dia, meninos nem parecem com meninos, e as vezes, meninos são meninas. Sim, Lembra-te do que te digo, pois esta escrito: "O Senhor os afligirá com loucura, cegueira e confusão mental." Deuteronômio 28:28. Minha família é ateu, e eu não consigo acreditar que nessa Terra, cuja as coisas em harmonia, não existe nada maior que nós mesmos. Olhe ao seu redor, sério, olhe agora! Seus móveis, a janela, o ventilador do seu vizinho, a porta e cada carro, isso é abstrato, é humano, é nosso, mas veja, veja mais que isso por favor, preciso que você seja sensível pelo menos uma noite, ou, no mínimo, quando estiver aqui comigo. Olhe as árvores, o céu, olhe a cor dessa noite, e a cor do dia de amanhã, veja como tudo faz sentido e tem total sincronia; Isso é a própria testificação de que não somos nada, e eu confesso, pra mim tudo que vejo é a prova máxima de que não somos nada, o Universo é a casa desse Deus, com certeza. 

É, temos Bíblia ainda, por incrível que pareça, se procurar bem nos cebos das cidades, achamos bem rasgada e jogada nos cantinhos, junto a romances que ninguém mais lê. Eu sou uma pessoa muito desconfiada, não conseguia entender como vivemos sem a ideia de que nada faz sentido. Eu cheguei a conclusão de que pra meus pais, não há sentido em viver, não há sentido em me ter como filh... Quase evidencio o meu sexo, e foi por pouco. Isso não importa lembra? Ateus são pessoas que, cansadas de buscar explicação, não conseguem explicar e acham que entendem da verdade. Mas o foco aqui, que realmente importa, é que eu fui buscar uma saída, pois não queria morrer achando que a vida não vale de absolutamente nada. Se você não acredita em um deus, não se preocupe, eu não odeio essas pessoas, só tenho absoluta certeza de que é totalmente aceitável a opção de não acreditar, e isso não te torna alguém pior. Eu quem me sinto uma pessoa pior, eu duvidei de meus parentes. Ou melhor, eu duvidei de toda a minha geração. 

Foi engraçado, eu fiquei horas naquela loja de livros usados, achei a bíblia, dei um sorriso para comigo mesmo, olhei pra um lado e pro outro, peguei mais quatro livros aleatórios pra disfarçar que eu só queria a bíblia mesmo e dirigi-me ao caixa, era um senhor nem velho nem novo, na cadeira atrás dele estava uma garotinha, possivelmente sua filha. Coloquei todos os livros em cima do que era importante pra mim, ele foi registrando todos e ao chegar nela, me olhou como quem se curiava de algo, eu resisti a perguntar o que era, apenas permaneci a olhar pra ele até que ele se cansou, colocou tudo numa sacola e levantou a mão como quem pedia o dinheiro; eu já tava quase saindo quando ele me gritou, me ofereceu outra sacola e sorriu. Eu só entendi depois, era pra esconder o que eu levava ali. 

Posso te confessar que sou uma pessoa totalmente frustrada, pois eu me apaixonei; sim, e eu li dia desses que a paixão é a manifestação do desejo no amor. E isso ficou na minha cabeça por horas, eu tinha te visto, calma, ficou confuso né? Eu tinha visto o meu amor, mas foi numa noite em que, pode cair por terra o céu se eu mentir, não havia mais ninguém que me atraísse, já me sentia algo que não era parte de mim. É que todas as pessoas que eu conheço gostaram de alguém, todas elas desejaram, amaram, sentem afeto inexplicável e eu, duvidava disso tudo com a maior certeza existente: o amor é uma farsa. Só que eu perdi o desejo de acreditar que amar era uma mentira, e foi justamente no dia que vi quem to contando pra você. A pessoa passava como quem desfilava nas ruas escuras, e eu, claro, vi asas de tão angelical que aquele rosto me aparentava ser, eu quis correr e pedir seu nome, idade, classe social, pois naquele momento isso parecia importar. Eu quero seu nome, eu quero seu nome, idade, gostos, eu quero, eu quero... Era isso que passava em mim, eu desejei porque, não sabia nada sobre ti, e eu queria, o desejo mais cruel e imutável. Resolvi correr, adiantei meus passos pra acompanhar a infeliz pessoa e ela parecia correr de mim. Foi que desisti, e ela acalmou os passos também. Perguntei seu nome e tudo que ouvi foi: Isso importa? Conversamos o caminho inteiro, conversamos nas madrugadas, conversamos na estrada pra aula de medicação, conversamos e rimos muito, mas eu nunca soube o seu nome, e nem falei o meu, claro. 

Anjos adoecem? Eu nem sabia como responder isso, mas disse que se adoecerem deixam de ser anjos. E ouvi que estava certa a resposta. Eu tive que dar risadas e perguntar a razão de tal questionamento. Mas só ouvi o silêncio, se é que isso é um som, e meu olhar se foi em direção ao seu também, eu sabia de nada, nada, mas naquele momento parecia que um dicionário havia caído sobre a minha face, parecia que eu conhecia aquele sentimento, e eu não sabia mais se era dor, ou encantamento. É o que faz conosco o amor, alucinórgico perfeito pra que possa haver sentido no viver. Ai eu constatei! Puta merda! Meus pais não são ateus, eles acreditam no amor! Eu me levantei e saí correndo, meus pés voavam, eu apenas me despedi, mas nem se despedir deu tempo, ficamos sem entender, mas eu disse que explicaria outra hora; ali acabou todo o espetáculo, o momento belo saiu de minha presença, eu não estava sentindo como se o tempo houvesse parado, eu sabia correr, correr, e correr. Abri a porta, entrei no quarto, tranquei dando todas as voltas pra garantir, como se uma só também não fosse seguro, rasguei as sacolas, peguei a biblía e comecei a buscar... Achei! Achei merda, "existe a fé, a esperança e o amor. Mas o maior dele é o amor." Corintios 13:13. Meus olhos brilhavam, a imagem péssima de meus pais saíram da minha mente, eu parecia voltar a os admirar, o mesmo livro que me fez erroneamente ver meus pais como desfalecidos me fez novamente vê-los como seres que, por mais embananados que estivessem, ou feitos baratas tontas sem acreditar em nada, eram dignos de amar, e oras, agora eu ja sabia o que era amor. Mesmo conhecendo o sentimento só depois de rápido e inesperado desejo. Quem é que deseja alguém que passa a uns metros de tu? E quem é que ama uma pessoa sem saber seu nome? Pelo menos eu conhecia seu olhar, onde quer que estivéssemos, eu reconheceria seu olhar.  

Os boatos corriam cidade a dentro sobre nós, meus primos, amigos, desconhecidos, todos, todos sabiam que estávamos fazendo tudo junto, ou quase tudo. Nem eu compreendia o que estava acontecendo, quem dirá meu amor... Será que já posso apelidar assim? Quando não conhecemos o amor, qualquer outra coisa que se aproxime dele faz-nos pensar que o é. 


Anjos DoentesOnde histórias criam vida. Descubra agora