28. Pressentir

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- Falta muito pra chegar?

• Primeira ligação
- Alô? (Silêncio)... Alô? (Silêncio)
• Fim da ligação

- Será que alguém pode me responder? Falta muito pra chegar?

- Larga de ser impaciente Bah, já vamos chegar! Quer dizer, eu acho que já vamos chegar. Mas, mesmo assim fica quieta, parece criança.

- Criança? Estou presa em um carro com três mulheres que parecem não fazer a menor idéia de onde estão indo e tenho de ficar quieta? Não vem com essa não Ana Clara porque tu tá no mesmo barco que eu!

Até mesmo quando Bárbara não deveria ter razão ela tem, o que é péssimo porque se ela souber que acho isso, vai ficar impossível. Mas o fato é que estamos indo em direção ao vazio tem mais de uma hora e meia e nada além do horizonte é visto, normalmente eu me perderia encostada na janela admirando cada nova paisagem vista, mas confesso que estou tão apreensiva quando ela.

Gabriela concentrada na estrada, dirige com total atenção e parece até que se desligou do mundo a sua volta, Bárbara no banco do carona, se remexe igual uma criança impaciente e de cinco em cinco minutos pergunta se já estamos chegando, Vitória apoiada no banco traseiro lê um livro de poesias e dá risada sozinha concordando com aquilo que ler, e eu, cá estou encostada em seu corpo, com as pernas sobre o banco para descansar, tentando aproveitar da melhor forma cada instante dessa viagem.

Vez ou outra Vitória desliza sua mão que delicadamente mexe em meus cabelos até minha cintura e ali deixa um aperto contido. Eu não deveria está tão apreensiva quanto estou, afinal estamos indo para o sítio da família de Gabi que fica no interior há mais ou menos duas horas e meia de distância das nossas casas e olhando por esse lado estamos dentro do prazo, mas Bárbara impaciente fica mais elétrica do que normal o que também me faz ficar, e junto com isso, vem a sensação de que tem algo errado e eu não sei o que é, mas para o bem da nossa viagem, vou tentar de todas as formas ignorar Bárbara e os pressentimentos.

(...)

Segunda ligação
- Nem sabia que dava sinal aqui. Alô? (Silêncio) Oi? Alô? (Silêncio)
• Fim da ligação

- Algum problema? - Vitória surgiu ao meu lado igual um coelho na cartola do mágico, de uma hora pra outra ela segurou minha cintura, me abraçou por trás e apoiou seu rosto ao lado do meu.

- Não sei. Acho que é algum cliente, mas não conseguir ouvir nada e a ligação acabou caindo.

- Bom, se for algo importante com certeza voltarão a ligar.

- É, tem razão. - O vento frio já invade o fim da tarde, meu corpo que antes estava quente agora diminuía de temperatura e o respirar fundo de Vitória em contato com minha pele me fez ter leves arrepios, que fazem ela sorrir arteira. - Vem comigo, quero te mostrar um coisa!

O sítio da família de Gabi é realmente incrível. O campo é sempre um lugar muito mágico e tudo aqui parece fazer mais sentido que na cidade, o verde é mais intenso, o céu mais azul, as estrelas se multiplicam e aparecem mais, a sinfonia dos animais que se faz música no silêncio e a paz que todo esse lugar me traz é simplesmente algo que não se explicar. Eu vim do interior de uma cidade muito pequena no Tocantins e é no cheiro de mato que faço minha morada, mesmo que a cidade tenha me encantado e me presenteado com conquistas tão sonhadas, o meu lugar seguro sempre será entre os riachos e árvores.

Terceira ligação
- Oi? (Silêncio) Você consegue me ouvir? (Silêncio) Alô?
• Fim da ligação

Segurando minha mão, Vitória me guia até os fundo da casa onde tinha algumas árvores frutíferas que por puro azar nosso não estavam em época de colheita e mesmo sem saber pra onde ela estava me levando continuei seguindo e adentrando ainda mais entre as árvores até que chegamos em um cercadinho branco que se fazia abrigo pra uma lindo, forte e florido pé de ipê amarelo.

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