Adorei ver a expressão no rosto da minha secretária. Não me levem a mal nem nada, mas acontece que fazia um tempo em que não me sentia tão bem em companhia de outra pessoa. A minha família não conta. São todos doidos.
Desde que Sofi se foi, eu não sentia essa necessidade de conhecer alguém além da minha zona de conforto. Minha secretária claramente não estava muito a vontade comigo e mostrava uma distância defensiva admirável até.
Eu continuei rindo da sua cara.
- O que foi? - perguntei enquanto chegávamos ao nosso andar.
- Eu não sabia que você tinha escutado essa parte da conversa.
- Ainda bem que escutei. A sua resposta foi bem criativa. - respondo.
- Então você gosta de escutar a conversa alheia?
Lembro da minha mãe nesse instante e sorrio.
- Aprendi com a melhor.
Elena me observa atentamente.
- Irmã?
- Não. Com minha mãe mesmo. - respondo rindo.
Ela me olha perplexa.
- Está falando sério?
- Pode tirar suas conclusões assim que ela vir aqui. Vamos almoçar juntos porque ela quer saber como foi a minha primeira manhã de trabalho.
- Quantos anos você tem?
- A idade que minha mãe acha que eu tenho. - dou de ombros. É a verdade. Para minha mãe vou sempre ser o garotinho dela.
Elena sorri com minha resposta. Assim que percebe que reparei ela fecha cara.
Ergui a sobrancelha mostrando dúvida.
- Porque fez isso ?
- Fiz o que ?
- Lamento, mas eu conheço esse jogo. Não vai funcionar. Responde a pergunta que fiz.
Ela me olha e bufa nada delicadamente.
- Você me deixa desconfortável, só isso.
- Porque ?
- Sei lá. Só deixa. O Sr. não tem mais nada para fazer ? Um relatório pra ler ou um chefe de algum outro departamento pra conversar?
Eu encosto em sua mesa e cruzo os braços a encarando.
- Ué, me diz você. Eu tenho?
Ela me olha e percebo que mesmo que não queira, Elena se diverte com a resposta.
- O que está acontecendo aqui ? - eu conheço essa voz. Ao que parece minha mãe não aguentou esperar até o horário do almoço.
Olho em direção a figura pequena parada perto de nós. Vejo seus olhos estreitarem em nossa direção.
- Você não estava intimidando essa pobre menina não é Rafael ?
Quê?! Que diabos é isso?!
- Ele não conseguiria essa proeza, senhora. - respondeu minha secretária, acalmando minha mãe.
- Ei! - retruquei para Elena. O que esse pingo de gente estava pensando?
Minha mãe deu risada.
- Bom, já vi que de pobre menina você não tem nada não é? - perguntou ela à secretária.
Elena respondeu com um sorriso radiante.
Acho que fiquei perdido por um momento até sentir minha mãe me beliscar.
- Aí ! Isso doeu ! Andou treinando com o papai foi ?
- Seu pai não precisa disso! Ele não parece estar no mundo da lua quando estou por perto ! - retruca a mulher doida.
Elena nos olha com franca curiosidade. É eu sei. Despertamos esse tipo de coisa nas pessoas.
Suspiro fingindo indignação.
- O que as mulheres vão pensar quando me virem com o corpo roxo assim ?
- Muito me admira que as mulheres com que "sai" saibam pensar, pra começo de conversa. - fico de queixo caído enquanto minha adorável mãezinha fica observando as unhas recém pintadas. - Todas parecem ter tudo nos lugares certos, mas quando abrem a boca pra conversar ? Fico me perguntando onde está o cérebro porque este não dá sinal nenhum. - ao ouvir essa parte meus olhos se arregalam em descrença. Quero acreditar que não estou ouvindo isso, mas a risada da minha secretária me diz o contrário.
Elena finge uma tosse, finge muito mal por sinal, e diz:
- O Sr. não tem compromisso até as 13:00.
Nem parece que estava se divertindo as minhas custas essa peste.
- Vamos mãe. Estou morrendo de fome. Vai comer alguma coisa também. Até depois, Elena.
Ela acena positivamente e volta a sentar enquanto arrasto minha mae em direção ao elevador.
Assim que as portas se fecham olho para minha mãe que está com uma cara de inocente que até tenho inveja.
- Mãe! O que deu na senhora pra falar aquilo na frente da Elena ? Tá maluca ?!
- Me respeita garoto !- retruca enquanto me da um tapa no braço. - Você sabe que só falei a verdade.
Essa era a minha mãe. Sinceridade total e absoluta.
- Não pode sair falando assim da minha vida pessoal mãe ! Ainda mais no meu trabalho!
- Claro que eu posso ! Sou sua mãe! Posso fazer o que eu quiser !
Ela cruza os braços e faz uma expressão que era pra parecer zangada mas tudo o que me faz pensar é no quanto ela fica fofa assim.
- A senhora não tem jeito não é ?
Ela dá de ombros e olha para o teto.
- A sua secretária é muito bonita não é?
- Sutileza mandou lembrança mãe.
Ela me olha atentamente. Nem piscar ela pisca.
- Não é ?
Ergo as mãos em sinal de rendição.
- Sim mãe. Elena é muito bonita.
Ela concorda com a cabeça e sai na frente quando as portas do elevador se abrem. Passamos por alguns funcionários no saguão, mas logo vamos em direção ao carro.
Almoçamos tranquilamente e sem colocar o nome da minha secretária em mais nenhum momento da conversa.
Mas eu sei que minha mãe está planejando alguma coisa. Conheço a peça.
Tenho pena da Elena.
Porque seja lá o que for que a mente da minha mãe está mirabolando, tem a coitada da minha secretária envolvida.

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Amando Um Coração Ferido
RomanceUma mulher que pensa que o amor não é pra ela. Um cara que tem a absoluta certeza de que o amor não foi feito pra ele . Duas pessoas entregues a própria sorte e vivendo um dia de cada vez. Dois corações convictos de que não encontrarão o amor de ver...