"Inércia é uma palavra pequena, mas com múltiplos significados. (...) ela usou essa palavra para descrever como sua vida estava antes de conhecer o homem que lhe ensinou tantas coisas.
- Ando entediado. Sabe como é... Rotina, vida parada, monotonia...
O flashback chegou! Gente, só esclarecendo uma coisa... Não quero romantizar relacionamento abusivo aqui, ok? As palavras em itálico são por causa do flashback e os nomes dos lugares estarão em negrito.
Pâmela pisava fundo, enquanto caminhava rapidamente pela passarela do Terminal Bandeira. Sentia-se mais frustrada do que nunca por ter sido reprovada na entrevista do estágio dos seus sonhos. A oportunidade era trabalhar em uma renomada revista, com grandes chances de efetivação. A bolsa-auxílio oferecida era superior à sua pretensão, o que ajudaria ainda mais sua família. Ela já preparava seus ouvidos para o discurso que ouviria de seu pai, que sempre a lembrava do quanto era fracassada e dependente deles. Mesmo que não dissesse isso diretamente, era o que sentia a cada vez que ele falava sobre como conseguiu seu primeiro emprego. Fábio nunca compreendeu que os tempos eram diferentes. Encontrar um emprego não era mais como chegar à porta da empresa, dizer "Ei, eu estou desempregado, posso trabalhar aqui?" e ser aceito de imediato. A crise no Brasil havia aumentado a taxa de desemprego e dificultado o mercado de trabalho. Seus pais não queriam magoá-la; só desejavam que ela se esforçasse mais e seguisse em frente. No entanto, por ser filha única, sempre obteve tudo de maneira imediata. Bastava fazer birra para ser atendida prontamente. Sentiam-se culpados por isso. Talvez a tivessem mimado demais, prendendo-a em uma bolha. Agora - como um pássaro que sempre viveu engaiolado - queriam soltá-la à natureza, mas ela não conseguia voar. Enquanto andava em meio ao mar de pessoas que iam e vinham no terminal, xingava-se mentalmente pelo seu revés. Também ralhava consigo mesma por estar usando uma roupa social desconfortável, com saltos que, apesar de não serem altos, a incomodavam e não haviam servido para nada. Não estava acostumada a se vestir assim. Aliás, não se sentia bem trajando aquilo. Em um momento de distração, virou o pé. Tomaria um tombo horrível que a faria ser pisoteada pelos transeuntes, preocupados com suas próprias vidas e indisponíveis a ajudar. Contudo, sentiu duas fortes mãos a segurando pelos braços. Recompôs-se e se ergueu, virando-se para o dono das mãos. Foi paixão à primeira vista quando o viu. Um homem loiro, com aproximadamente 1,85m, a fitava com um sorriso simpático. - Você está bem, moça? - perguntou, franzindo o cenho. Ficou tão concentrada em admirá-lo que por pouco não respondeu. - E-Estou. - titubeou. - Muito obrigada! - e, espontaneamente, o abraçou. Surpreso, ele arregalou os olhos e a fitou assustado. No entanto, depois de alguns momentos de hesitação, retribuiu o abraço. Como se não bastassem todos os problemas que enfrentava, Pâmela começou a chorar, sem conseguir controlar as lágrimas. Ele ficou preocupado, pensando que talvez tivesse feito algo errado. Soltou-a, empurrando-a pelos ombros, forçando-a a fixar o olhar nele. - Moça... Tá tudo bem? Eu fiz alguma coisa? - Me desculpe, moço! - choramingou entre as lágrimas. - Não queria molhar sua camisa... - passou as mãos sobre o ombro do rapaz onde havia encostado seu rosto. - É que tá tudo uma merda na minha vida e eu tô tão feliz de ter encontrado uma boa alma! - Então, essas são lágrimas de felicidade? - levantou uma das sobrancelhas. Ela assentiu com a cabeça, mas logo depois negou e riu. - Pra falar a verdade, não sei por que estou chorando! - admitiu, sincera. - Venha comigo. - passou um dos braços pelos seus ombros. - Vamos tomar um café... Mas sem cair dessa vez! - brincou. [x] Estavam em pé em frente a uma banca de comida. Pâmela devorava um segundo pão de queijo, enquanto ocasionalmente bebericava seu café com leite. Ele comia uma coxinha e bebia café puro. Admirava-a enquanto ela desabafava sobre o sonho frustrado de trabalhar na revista famosa, sobre o sermão que seu pai lhe daria, sobre as constantes reclamações de sua família a respeito da falta de dinheiro e sobre os trabalhos acumulados da faculdade, a qual fazia gratuitamente graças a uma bolsa integral. Apesar de prestar atenção em suas queixas, era impossível não notar sua beleza. Aqueles olhos verdes como esmeraldas, os cabelos castanhos claros balançando ao vento e os lábios rosados e carnudos que pronunciavam palavras cheias de conhecimento e pesar. - Ai, moço... Perdoe-me! Eu tô aqui falando um monte de baboseira para alguém que eu mal conheço e você está sendo tão gentil comigo! - disse, mordendo o último pedaço de seu pão de queijo. - A propósito... Qual é o seu nome mesmo? O semblante assustado e confuso da garota fez Daniel soltar uma risada alta. - Puta merda... Estamos conversando há meia hora e não sabemos o nome um do outro! - comentou, divertido. - Vamos recomeçar... Olá, prazer. Meu nome é Daniel e o seu? - estendeu-lhe a mão. - Meu nome é Pâmela! - apertou a mão dele, dando uma balançada leve. - Mas então... Daniel - realçou seu nome. - O que faz da vida? - Ah, nada muito interessante... Sou vendedor de uma empresa de produtos naturais. Estava voltando para casa, que não é muito perto, quando vi uma moça se estatelando no chão. A princípio, pensei em rir e tirar uma foto para postar no Instagram e fazer chacota. Mas meu lado humano me impediu e me obrigou a ajudá-la. Ao concluir a frase, ele mordeu os lábios para segurar a risada. Pâmela o encarou com os olhos semicerrados, incrédula com o que acabara de ouvir. - Queria me transformar em meme? Que filho da... - tampou a boca para não completar a frase. - Desculpa, eu nem te conheço para te tratar assim! - sorriu sem graça. - Ah, tudo bem... Estamos conversando há tão pouco tempo, mas parece que nos conhecemos há anos! - disse ele. Um silêncio se instaurou entre eles, até que Pâmela sentiu o celular vibrar. Era seu pai ligando para saber se já estava indo para casa. Estava de férias do trabalho e Pâmela sentia como se ele tivesse prazer em perturbá-la. Atendeu e ouviu algumas reclamações sobre voltar logo, pois era perigoso, etc. Ao desligar o telefone, sua expressão antes leve e animada deu lugar a uma expressão triste e pesarosa. - Preciso ir embora. Meu pai está me esperando para fazer o jantar! - explicou ao rapaz. Depois, vasculhou a bolsa para encontrar seu dinheiro. - Vou só pagar o que comi e já vou... - Deixa que eu pago! - interrompeu-o. - Acho que quatro reais eu ainda tenho. - disse com um sorriso amarelo. - Fui eu quem te convidei para tomar um café. Nada mais justo que eu pague! - retrucou ele. - Mas em troca, quero uma coisa... - olhou-a espantada. - Que tal me passar seu Facebook? - Ah... Claro! - sentiu-se aliviada. - Procure por Pâmela Martins. Ele prontamente pegou o celular e digitou a informação. - Qual destas é você? - mostrou o visor a ela. Pâmela apontou seu perfil e viu a solicitação ser enviada. - Não vá recusar, hein! - brincou, arrancando-lhe um riso nasal. - Até logo, Daniel! - beijou-o na bochecha. - Até mais, Pâmela! - acariciou levemente seu ombro. [x] Após o jantar, aproveitou o dia livre da faculdade. Ligou seu notebook e viu a solicitação de amizade do salvador do Terminal Bandeira. Abriu um sorriso largo. Apesar de todas as reclamações que ouvira de seu pai, seu dia havia sido excelente e ela sentia como se fosse explodir de alegria. Aceitou a solicitação e começou a ver suas fotos. Se vestido, ele já era um deus grego; sem camisa, era um anjo. Não demorou a receber uma mensagem dele. "Oi. Como foi com o seu pai?" Achou fofa sua preocupação e respondeu imediatamente. Sabia que dali em diante, nada seria a mesma coisa em sua vida. Reencontraram-se novamente dias depois, no Parque do Ibirapuera. Caminharam por quase toda a sua extensão até decidirem se sentar em frente a um lago, cansados de tanto andar. Conversaram por mais alguns minutos, até que, após um longo silêncio, ele se aproximou e a beijou, calma e vagarosamente. Pâmela retribuiu o beijo, sentindo seu corpo tremer e o estômago revirar. Era a primeira vez que beijava alguém depois de um ano e meio. Nem se lembrava ao certo como fazer aquilo. Ele era a terceira pessoa que beijava em sua vida e Pâmela percebeu que aquele beijo era especial. Em menos de duas semanas, já assumiram o namoro e ele foi apresentado aos pais. No começo, Fábio se en ciumou, mas logo percebeu o quanto gostava de sua filha e sentiu-se em paz ao entregá-la a Daniel. Divertiam-se muito. Foram a parques naturais e de diversões, à praia, a outras cidades; quase toda semana jantavam fora. Eram perfeitos um para o outro, cheios de sincronia e amor. Um casal invejável para os outros. Pâmela está com os olhos inchados de tanto chorar, relembrando essa época ao lado de Thiago. Não sabe dizer quando nem como o relacionamento começou a desandar. Talvez estivessem fadados ao fracasso desde o início. O vizinho se aproxima dela e a abraça, oferecendo o apoio necessário para que ela continue chorando. - Eu sei que o que viveram foi muito intenso. Mas não pode se prender ao passado. Ele mudou. Quer te manipular, te ter como propriedade. Você não merece isso. - Você já amou alguém tão intensamente que pensou que sufocaria caso essa pessoa não existisse mais? Ele sorri de lado, solta-a, respira fundo e se levanta, caminhando em direção ao seu quarto. - Vou te mostrar uma foto de Bruna!
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