CAPÍTULO UM
ANNA
Adoro correr pela manhã pelas ruas de Porto Alegre. Bem cedinho. Sei, infelizmente, da violência da capital gaúcha, mesmo assim decidi correr. Fui firme nesse propósito desde que descobri que essa era uma forma de bloquear os pensamentos... os problemas, a tristeza...
Corro! Corro escutando as músicas do meu Ipod, tentando não pensar em nada, bloqueando qualquer pensamento. Não sei quanto tempo se passa, mas já deve ser tarde, pois sinto o sol quente aquecer minha pele clara.
Paro no sinal para atravessar a rua, olho para o lado e vejo um casal de velhinhos. Eles estão de mãos dadas, sorriem, é nítido o amor e cumplicidade que tem um para com o outro.
Sorrio também porque é só o que você consegue fazer ao ver uma cena tão linda como essa. Ao mesmo tempo, meu coração dói. Nunca poderei ter isso. Não mais.
Achei, acreditei, um dia, que teria isso. Agora, não posso mais ter essa esperança. Não aguento mais me magoar por ter esperança de algo que não vai mais acontecer.
Continuo minha corrida e mais para frente, já perto de casa, ao passar em frente a uma praça, vejo um casal de adolescentes. Ele segura as mãos dela enquanto a puxa para um beijo. Paro de correr quando lembranças entram em minha mente de quando vinte anos antes eu era aquela adolescente vivendo quase a mesma cena.
Ele segura minha mão, sinto um nervoso, algo dentro do meu estômago se contorce.
Respiro fundo. Ele aproxima seu rosto do meu. Fico em expectativa.
— Posso te beijar, Anna? – pergunta.
Sinto vontade de sorrir, por ele ser tão perfeito. Mas não consigo sequer me mexer porque o garoto dos meus sonhos, meu príncipe encantado está prestes a me beijar.
—Anna? – ele volta a falar.
Balanço a cabeça o autorizando, e fecho meus olhos para a certeza do que será o beijo mais maravilhoso que já tive.
Não errei. Foi o melhor beijo. Foi o beijo do homem que será o grande amor da minha vida.
Fecho os olhos e os abro para espantar aquela lembrança tão linda, quanto dolorosa. Sigo meu caminho, dessa vez, caminhando em vez de correr, e penso sobre as duas cenas que acabei de presenciar. Uma era o futuro que eu não poderia ter, a outra, o passado, que me dizia que eu só poderia viver de lembranças.
Era nisso que minha vida consistia. Não esperar um futuro e apenas viver de lembranças.Se pensar que eu tinha apenas quarenta anos era cruel, triste. Mas eu já havia chorado muito por isso. Agora, não mais. Apenas aceitei minha condição. Lágrimas não iriam resolver nada. E afinal, eu tinha dois filhos lindos. Era por eles que eu me levantava todos os dias e seguia a vida como tinha que ser.
Você não pode apenas reclamar da vida. Tantas pessoas tinham tantos ou mais problemas que eu. Enfim, hoje começava uma nova etapa da minha vida. Depois de muito pensar, ponderar eu resolvera dar um novo passo.
Depois de anos em casa cuidado da minha família, eu voltaria a trabalhar. Havia resolvido isso há algum tempo. O problema foi conseguir um emprego na minha idade e com a minha falta de experiência. Não foi nada fácil. Afinal, por mais que quarenta anos signifique ser ainda de certa forma jovem, não é quando é para começar uma carreira.
Eu havia me formado em advocacia, mas pouco exerci a profissão. Logo que acabei a faculdade trabalhei por pouco mais de um ano em um escritório conceituado da cidade. Eu gostei bastante. Mas então eu estava recém casada... em seguida vieram os filhos e acabei abandonando tudo e me tornando uma dona de casa. Sim! Nos dias de hoje ainda existe mulheres que largam suas profissões para se dedicarem exclusivamente a serem mães e esposas. Quer dizer, não nos dias de hoje, eu acho, mas há vinte anos isso ainda era comum. Eu não me arrependo, afinal estava apaixonada, meu marido era o meu grande amor, e meus filhos minha vida. Então não foi difícil largar uma promissora carreira para me dedicar àqueles que eu mais amava no mundo.
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MINHA RAZÃO PARA AMAR
RomanceApós uma infância difícil pela perda dos pais, Anna Tavares conquistou seu sonho encantado ao se casar com seu grande amor. Contudo nem todo felizes para sempre é real. Quase vinte anos depois de ter desistido da carreira para cuidar e educar seus...