Capítulo 1 - Desafio

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- Verdade ou desafio?

- Verdade! - Renata diz, sem hesitar, demonstrando toda a segurança que uma garota que completa dezoito anos deve ter.

- É verdade que você gosta do Caio? - A voz de Michele preenche o círculo formado pelos seis estudantes que ocupavam almofadas velhas no chão da sala.

- Não. - Renata responde, ainda confiante.

É possível notar um murchar no olhar de Caio.

- Minha vez! - Gabriel gira a garrafa com mais força do que os outros. A base da garrafa aponta para Marcela, enquanto a boca indica que Caio deve ser o próximo a responder.

- Você gosta da Renata? - Marcela pergunta imediatamente depois do garoto ter escolhido verdade.

A expectativa de todos vibra pelo ambiente.

- Sim. - Ele responde, antes de abaixar o rosto numa tentativa frustrada de esconder sua vergonha.

- A Renata mal fez dezoito e já está partindo corações! Quem diria... - A risada de Gabriel é cortada por um golpe da almofada que antes acomodava a aniversariante.

- Ok, eu giro agora! - Samuel respira fundo antes de girar a garrafa com a mão esquerda. - É assim que se gira uma garrafa! - Ele se gaba, na direção de Gabriel. A base indica que o próprio Samuel deve fazer uma pergunta para Renata. – Verdade ou desafio?

- Verdade.

- É verdade que sua tia é uma bruxa?

O silêncio paira por alguns segundos, assim que é feita a pergunta que todos desejavam fazer há muito. O boato não é recente, mas conhecer a casa que Renata divide com sua tia e a decoração nada convencional, foi o suficiente para fazer a incerteza se transformar em um singelo medo.

- Essa pergunta não foi muito delicada. – Michele acrescenta após algum tempo.

- Ela escolheu verdade, agora tem que responder! – Gabriel diz, sério.

- Não. – Renata responde, finalmente. – Pelo menos não que eu saiba. – Ela acrescenta num tom mais baixo.

- Quanto você sabe sobre ela? – Samuel pergunta, sem qualquer vergonha.

Os boatos sobre a tia de Renata iniciaram no mesmo momento em que a garota passou a frequentar o Colégio Bartolomeu de Gusmão. As longas capas e sobretudos pretos que Lorena costuma utilizar se contrastam com a palidez de sua pele e de seus cabelos já grisalhos, embora ela aparente ser mais nova do que a maioria dos responsáveis que esperam seus filhos todas as tardes no portão de saída. Seu olhar profundo é capaz de capturar instantaneamente a atenção dos pais, da mesma forma que desperta ciúmes nas mães. Segundo histórias criadas por algum aluno do primeiro ano do ensino médio, em sua grande e espalhafatosa bolsa vermelha de todos os dias, ela esconde poções e restos de animais mortos.

- Não muito. – A expressão de Renata não diz mais do que suas palavras. – Nós não conversamos tanto quanto deveríamos, já que ela passou a maior parte do tempo viajando. Ela não tem muito contato com o resto da família, mas foi bastante solícita quando precisei de um lugar para ficar. Nos conhecemos pessoalmente um dia antes de eu me mudar para cá. Um dia depois da morte dos meus pais...

- Beleza, então... – Samuel diz logo depois, impedindo que a menção à morte dos pais de Renata causasse aquele costumeiro silêncio constrangedor. Ele passa a garrafa para que Michele a gire.

- Verdade ou desafio? – Gabriel pergunta para Marcela.

- Desafio. – Ela responde, confiante.

A Última VelaOnde histórias criam vida. Descubra agora