Saí do banho e encontrei o quarto escuro e Luciana já deitada em sua cama observando o céu para variar, porém já com os olhos pesados, quase adormecendo. Por um momento senti vontade apenas de ignorá-la, deitar em minha cama e dormir profundamente.
Foi o que fiz? Não.
- Lu, você não quer ir tomar um banho? Já está quase dormindo aí...
- Ah, mas aqui está tão confortável já...
- Mas você está de calça jeans... Não tem como ficar confortável usando calça jeans pra dormir... Toma um banho lá, bem rapidinho. O chuveiro é maravilhoso.
- Tudo bem, você venceu... – Ela levantou de sua cama, acendeu o abajur e foi mexer em sua mala, buscando alguma roupa. – Já volto...
- Certo.
Ela entrou no banheiro e, assim que ouvi o chuveiro sendo ligado, levantei-me de minha cama e fui até a cama dela, retirando a colcha que a forrava, para estender uma coberta e assim, Luciana só precisaria se jogar na cama para dormir.
Foi a pior ideia que eu tive.
Ao ajeitar seu travesseiro sobre a cama, percebi que o mesmo já continha seu cheiro, mesmo ela tendo repousado sua cabeça sobre ele por pouco tempo. Não pude resistir ao meu impulso e o abracei, inspirando fortemente o aroma que nele estava presente. Era o cheiro de seus cabelos. O mesmo cheiro que eu me lembrava.
Mais do que depressa troquei de travesseiro com ela, pois precisaria sentir aquele perfume por um pouco mais de tempo, mesmo que fosse assim, através de um travesseiro.
Acendi o abajur que se encontrava ao lado de minha cama e me deitei, virando-me para a parede.
Não demorou muito, Luciana encerrou seu banho e estava de volta ao quarto. Pude ouvir ela soltar uma pequena risada, antes de dizer em voz baixa:
- Fantine sempre será a mesma pessoa... Se preocupou em dizer que eu não ficaria confortável em dormir de jeans, arrumou a cama pra mim... – a ouvi deitar em sua cama e, por fim ela disse – boa noite, Fanta.
- Boa noite, Lu.
- Você estava acordada? Todo esse tempo? Ouvindo tudo que eu falava? – notei surpresa em seu tom de voz.
- Estava sim... – me virei na cama, ficando de frente para ela, que em sua cama também estava deitada de forma que ficasse de frente para mim – algum problema em eu ter ouvido você?
- Não, nenhum problema. Só fiquei feliz, que apesar dos pesares, você continua a mesma de sempre.
- Eu sou a mesma, Luciana. Sempre fui e, ao que parece, eu sempre serei...
- O que quer dizer?
- Você sabe.
- Sobre... Aquilo?
- Sim. Não é "aquilo". É o meu sentimento. Por você.
- Fanta...
- Não, agora me deixa falar, por favor. Aquele dia no banheiro você perguntou se eu gostaria de falar sobre isso um dia e eu disse que não, mas a verdade é que sim. Eu quero falar sim.
- Você tem certeza?
- Você vai fugir?
- Não.
- Então eu tenho.
- Ok. Quer acender a luz?
- Na verdade eu queria ir na varanda... Pode ser?
- Pode.
Me levantei da cama e me encaminhei até a porta da varanda, abrindo-a e sentindo a brisa fresca vir de encontro ao meu corpo. Apoiei-me na grade de proteção e Luciana permaneceu parada, atrás de mim, encostada na porta. Ela fez um sinal com a mão, indicando que eu poderia começar a falar.
- Desde o dia em que eu percebi o que realmente se passava dentro de mim, a única coisa que aconteceu, foi o sentimento crescer. Mesmo com você indo embora. Mesmo sem te ver durante todo esse tempo. Mesmo me casando. Indo morar na Holanda. Sendo mãe. Mesmo depois de tudo, Luciana. Não vou mentir que não me perdi em outros braços e bocas. Não vou mentir que outros beijos e toques não me deram uma sensação imensa de prazer. Não vou mentir. Mas também não posso mentir que só de te olhar, dizendo que naquele primeiro dia de reuniões, meu coração não acelerou. Ele disparou. E eu me dei conta de que, por mais que eu tenha me aventurado em inúmeras outras experiências amorosas, nada seria como o que eu sinto por você. O sentimento, antes adormecido, despertou muito mais forte do que eu jamais imaginei. Mas tamanha é a minha sorte, que você vai se casar... – Me virei, ficando de frente para ela, e pude notar que seus lindos olhos azuis estavam a ponto de transbordar em lágrimas. Para evitar meu próprio choro, voltei meu corpo de frente para a grade de proteção e fiquei olhando para o céu e as estrelas, continuando a falar – Eu que abro meu coração por estar perdendo de vez a única mulher que amei de verdade e é você que chora, Lu? Isso não é justo. Não é justo eu te amar dessa forma e ter tocado seus lábios com os meus uma única vez na minha vida. Não é justo te querer tanto e saber que você se deita todas as noites com outra pessoa que te chama de amor. Não é justo comigo, Luciana. Mas, você mesma disse que não pode controlar o que os outros sentem, não é mesmo?
- Você me ouviu falando no telefone?
- Depois de tudo que eu falei, você me pergunta se eu te ouvi no telefone? Sim, eu ouvi. – falo decepcionada.
- Você ouviu eu dizendo que cada um sabe dos próprios sentimentos?
- Ou não... – repito a frase que ela sussurrou – ouvi.
- E você entendeu, não entendeu?
Me viro de frente para ela, que nesse momento já tinha o rosto banhado por lágrimas. Não resisto ao meu próprio impulso e a abraço. Forte. Como se nós duas dependêssemos daquilo. E realmente dependíamos.
- O que te impede então? O que tem impede de ser minha, Luciana?
Ela se desvencilha de meus braços e encosta-se na grade de proteção da varanda, respirando fundo.
- O casamento – diz em voz baixa, quase inaudível.
Novamente vou até ela, a abraçando por tras, encostando levemente meu queixo em seu pequeno ombro, de forma que minha boca ficasse próxima ao seu ouvido.
- Então cancela. Se você sabe que não vai ser feliz com ele, cancela tudo. Ainda da tempo – sussurro em seu ouvindo, fazendo-a ficar arrepiada.
Ela fecha seus olhos e seu corpo se encolhe ao sentir o ar saindo de minha boca com minhas palavras batendo em sua pele.
- Fantine, eu...
Não perco tempo e percebendo sua reação a meus atos, a viro de frente para mim, sem soltá-la nenhum segundo. Aproximo meu rosto do seu, encostando nossas testas, sem nunca deixar de olhar para seus lindos olhos azuis.
- Eu deveria te beijar agora e fazer disso a sua resposta.
Fecho meus olhos e vou aproximando minha boca da sua, até que ela me empurra para trás.
- Eu não posso, Fantine. Eu aceitei um pedido. Eu disse sim. Temos data marcada e um compromisso um com o outro. Eu simplesmente não posso. Não posso.
Ela se solta de meu abraço e volta correndo para o quarto, me deixando ali naquela varanda, sozinha.
De novo, ela fugiu.
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Eu.
RomanceA volta do Rouge estava sendo um sucesso. Muito melhor do que até o mais otimista de nós poderia esperar. Nós cinco nos reunimos, não uma, nem duas, mas sim inúmeras vezes, para que pudéssemos conversar e realmente deixar o passado no passado. E iss...