Capítulo 6

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Daquele dia em Brasília, quando Leonardo anunciou que seu casamento com Luciana estava marcado para dali duas semanas, em diante, a única coisa que tomou conta de mim foi a tristeza.

Por saber que a mulher que eu amava estava realmente prometida a outro. Que tinha aceitado viver uma vida onde ela não seria feliz (e ela sabia disso) por medo de se entregar para mim. Por talvez receio de toda uma sociedade nos julgar, por nossa forma de amar. Confesso que eu estava acabada, de todas as formas possíveis.

Viajei para a Holanda, a fim de matar a saudade de minha filha Christine e também a fim de esquecer disso tudo por alguns momentos. Afinal de contas, eu havia sido convidada para o casamento e precisaria de forças para passar por isso.

Passei dias e mais dias apenas curtindo Kikish, que assim como eu, estava morta de saudades. Porém, como eu bem conhecia minha filha, percebi algo estranho em seu modo de agir.

- Kikish, você gostaria de falar alguma coisa?

- Não, eu acho... – ela me disse surpresa com a minha pergunta.

- Acha ou tem certeza que não quer?

- Então eu quero...

- Pode falar, não precisa esconder nada de mim. Aconteceu alguma coisa enquanto eu estava viajando?

Ela, que estava sentada no tapete brincando com seu novo jogo de Harry Potter, soltou seus bonecos e subiu no sofá para se sentar ao meu lado.

- Na verdade, foi depois que você voltou, mãe...

- O que aconteceu depois que eu voltei? – perguntei estranhando seu comentário.

- Você voltou triste.

Aquilo me atingiu como uma flecha no meio do peito. Todos os meus pensamentos sobre não deixar transparecer minha tristeza para minha filha durante toda a viagem de São Paulo até Amsterdã e de Amsterdã até Haia tinham sido em vão. Ela percebeu.

- Porque você acha que eu estou triste? – a questionei, colocando de lado o violão que eu dedilhava para passar o tempo.

- Porque você só toca violão até tarde da noite quando está triste. Depois que você voltou, você tocou todas as noites.

- E em vez da senhorita ir dormir, ficou me ouvindo tocar violão? – perguntei fazendo cosquinhas na menina e a colocando em meu colo.

- Sim. E agora até durante o dia você fica tocando violão bem baixinho. Isso quer dizer que você está muito triste, mãe? – ela disse ajeitando meu cabelo para trás da orelha.

Senti meu peito ficar ainda mais apertado, pois ela tinha realmente percebido o quanto eu estava abalada.

- Kikish, lembra quando eu te disse que alguns homens amam outros homens, algumas mulheres amam outras mulheres e algumas pessoas simplesmente amam os dois? – perguntei.

- Sim, eu me lembro.

- Então, meu amor... O que acontece é que eu sou uma dessas pessoas que amam os dois.

- Isso quer dizer que você pode namorar tanto um homem, como namorou meu pai, quanto uma mulher? – ela concluiu rapidamente, me arrancando um sorriso.

- Isso mesmo.

- Seria legal se você namorasse uma mulher, mãe. Pelo menos eu ia achar legal.

Acariciei seu cabelo loiro, fazendo um leve cafuné. Não percebi que uma lágrima escapou de meu olho.

- Porque você está chorando, mãe? Por favor, não chora, eu não gosto de te ver chorar... – ela disse enquanto me abraçava forte.

- O que acontece princesa, é que eu estou muito apaixonada por uma mulher que está lá no Brasil, mas nós duas não podemos ficar juntas, você consegue entender?

- É por que ela mora no Brasil? Mas você não vai pra lá sempre? Ela também pode vir aqui algumas vezes, até posso emprestar o meu quaro pra ela não precisar ir para um hotel e aí vocês ficam juntas aqui em casa mesmo, mãe.

Sorri com sua rápida conclusão e vontade de tentar me ajudar e então continuei a explicar.

- Ela vai se casar com outra pessoa, filha. É por isso que eu estou triste assim. Porque eu e ela nunca poderemos ficar juntas. Ela fez uma escolha e a escolha não era eu... – nesse momento me permiti chorar tudo aquilo que fui acumulando durante todos os dias.

- Não tem como você falar pra ela que você ficou triste mãe? Você pode tentar ligar pra ela... – Kikish disse enquanto secava meu rosto com suas mãozinhas pequenas, que fiz questão de pegar e beijar cada uma.

- Não dá mais pra fazer nada, princesa. O casamento dela vai ser no próximo sábado, por isso sexta vou viajar para o Brasil novamente. – disse a acolhendo em meus braços, sentindo o amor de milha filha me preencher, por meio daquele contato.

- Você vai no casamento dela? – ela disse observando o fogo da lareira, enquanto permanecia sobre meu colo.

- Vou... Eu fui convidada.

- Entendi... Mas se for pra você ficar ainda mais triste eu não quero que você vá, mãe...

- Você não precisa se preocupar com isso. Tudo vai ficar bem, eu prometo ok?

Após sua confirmação, passamos o restante da noite apenas aproveitando a companhia de mãe e filha. Kikish pediu para dormir comigo em minha cama e eu jamais negaria um pedido desses.

Mexi em seus cabelos até que ela pegasse no sono e logo eu também adormeci, com minha filha acomodada em meu abraço.

Sexta-feira bem cedo, despedi-me de Kikish no aeroporto, juntamente de seu pai. Eu estava pronta para embarcar de volta para o Brasil e ouvir Luciana dizer seu "sim" para outra pessoa.

Peguei no sono durante o voo e somente acordei com a comissária de bordo me solicitando para levantar minha poltrona, pois já íamos pousar.

Fui recebida por Karin no aeroporto, que perguntou se eu realmente estava em condições emocionais de presenciar o casamento de Luciana.

- Fica tranquila,Karin. O que tiver que ser, vai ser...    


N/A: Eu amo a Kikish, gente.

Eu.Where stories live. Discover now