Capítulo 5: Kang Seulgi

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Vou a passos largos e decididos até a lanchonete mais próxima, ficando ainda com mais raiva quando lembro que a mulher sugeriu que o estranho fosse meu namorado. Eu poderia ter gargalhado diante de tamanha idiotice.

Deve ser insuportável namorar aquele cara. Tão cheio de si, se achando o dono da razão - e tão fechado! Ele acha que tem todo o direito de fazer comentários sobre a minha vida, mas me ignora completamente quando o alvo dos comentários é ele.

— Namorado... — murmuro baixinho, balançando a cabeça enquanto aguardo a minha vez na fila da lanchonete. — Que piada!

Recebo uma mensagem de texto. Mais uma vez é a Sooyoung.

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Sooyoung >Por favor, não esqueça o vídeo! :)

Suspiro cansada.

Odeio época de Dia Dos Namorados e este ano mais do que nunca. É como se todos fossem obrigados a falar disso. Ainda não sei como a Sooyoung me convenceu a aceitar esse projeto sobre o amor. No que eu estava pensando?

— Próximo?

Me desperto dos devaneios e peço uma água.

— Você não gostaria de levar junto um docinho? — pergunta o atendente com um sorriso automático estampado no rosto quando tento pagar. — Está com desconto especial de Dia Dos Namorados.

Só pode ser zoeira do universo.

Ele deve ter notado a minha expressão de poucos amigos, porque foi o suficiente para desistir da sugestão e me entregar logo a nota e a garrafa d'água.

Agradeço e volto para o meu lugar, me espremendo entre várias pessoas que aguardam a reabertura do aeroporto. Olho através das janelas de vidro e percebo que a tempestade parece estar dando uma trégua.

Ao chegar onde havia deixado minhas coisas, percebo que o rapaz não está mais sentado. Dou uma olhada disfarçada a minha volta, mas é inútil, ele não está em lugar algum.

— Fique tranquila, ele vai voltar — diz a senhora.

— Eu... é... — tento me explicar, mas não vejo sentido em mentir. — Obrigada por cuidar das minhas coisas — agradeço, sorrindo.

— Ah, querida, não tem problema. Estou cuidando das coisas dele agora — informa ela, indicando uma pequena mala próxima.

Observo o lugar vazio e a mala solitária. Uma simples mala preta de rodinhas que poderia ser de qualquer pessoa.

— Ele parece ser muito sério, sabe? — continua a senhora mesmo sem eu perguntar nada. — Acho que é uma boa pessoa, mas está fechado, não deixa as pessoas entrarem.

— Hum, acho que isso não é da minha conta...

— Ah, é sim — garante ela. — Com o meu marido foi a mesma coisa. Éramos vizinhos e nos odiávamos. — Ela faz um sinal de aspas com as mãos para ilustrar. — Ele me achava nova demais e por isso pensava que eu não sabia das coisas. O curioso é que a diferença de idade era de apenas alguns meses. Felizmente as nossas famílias sempre se reuniam e desde que éramos crianças eles falavam que um dia nos casaríamos. — Os olhos da senhora começam a ficar marejados, e eu, incomodada. — Eles tinham razão.

Fico desconfortável porque também me emociono e me assusto ao me dar conta.

— Um belo dia, depois de trocarmos mais algumas ofensas e ir embora, ele voltou e pediu a minha mão em casamento. Assim, sem nem me consultar! Chamou meu pai e pediu. E sabe o que é mais impressionante? - pergunta ela sem esperar a minha resposta. — Eu aceitei.

A história me impressiona. Como duas pessoas que se odeiam podem se casar? Certamente isso não deve ter funcionado.

— Você deve estar se perguntando se eu fui feliz — observava a senhora lendo os meus pensamentos. — Sim. Foram os anos mais felizes da minha vida.

— Mas vocês se odiavam...

— Minha querida, odiar era modo de dizer — explica ela como se eu fosse uma criança tola. — Eu era bem irritante e detestava que me tratassem diferente dele. Crescemos juntos, mas você sabe como era ser mulher naquela época... Eu queria ter uma profissão, estudei muito e sempre tinha uma resposta afiada na ponta da língua quando alguém tentava me menosprezar. Sabe o que ele disse no dia que me pediu em casamento? — Ela respira fundo e sorri. — Que eu era a única pessoa que o inspirava. Que estava sempre à frente e o impulsionava a ser melhor também.

Eu a encaro esperando por mais da história, e ela entende que deve continuar:

— O ódio e o amor caminham juntos. Muitas vezes eles são usados como disfarce. Pessoas que nos odeiam se fingem de amigas para aplicar o bote. E as pessoas que nos amam fingem odiar por ter medo de amar. É muito mais fácil odiar do que amar. No ódio, você se fecha. No amor, se abre e fica vulnerável.

Seu olhar fica sério, e em tom de aviso ela diz:

— Não estou querendo dizer que quem a machuca a ama, por favor, quem ama de verdade não faz isso. Só estou dizendo que não deixe de desfrutar sentimentos bons por medo de sofrer. Garanto que vale a pena amar. Ah, e pode ser divertido também. — Ela pisca, concluindo.

Eu fico pensativa por algum tempo e me dou conta de por que é tão difícil falar sobre amor para um vídeo. Eu não conheço muito bem o sentimento. Na verdade, acredito muito pouco no que as pessoas dizem ser o amor. Não entendo o motivo de muitos perderem a essência por causa de um amor.

Minha mãe vive insistindo que o amor se constrói com o passar dos anos e por isso não devo me importar em me apaixonar antes de escolher com quem devo passar o futuro. Ela diz que é uma escolha da razão, e não da emoção. Um dia, ela me contou que não amava meu pai, mas sabia que era a melhor opção para ela, então aprendeu a amá-lo.

Eu, sinceramente, acho que a minha mãe não sabe o que é amar. A história daquela mulher me deu outra perspectiva. As pessoas podem amar, sim, encontrar o amor, mas não precisam fazer disso a prioridade da vida. O amor talvez goste de brincar de esconder e não apareça quando se está procurando.

— Você me parece daquelas moças que têm medo de sofrer e, o pior de tudo, de deixar os sonhos de lado.

Apenas continuo a olhá-la intensamente, prestando atenção no que tem a dizer. Apesar de não fazer ideia de quem seja, ela me conhece mais do que muita gente. Mais do que qualquer pessoa da minha família ou seguidores da internet. Nem com minhas irmãs eu já tive uma conversa como esta.

— Faça o que é importante para você. Estude, trabalhe, seja alguém, sim, mas não se feche completamente para as pessoas que querem entrar na sua vida. Baixe um pouco a guarda. E aproveite para fazer isso agora que ele está voltando. — Ela indica com a cabeça o rapaz que se senta ao meu lado.

Sem perder tempo, a senhora para de falar e volta para as palavras cruzadas, como se aquilo fosse realmente o mais importante para ela naquele momento. Eu não tenho oportunidade de dizer nada, mas talvez fosse a hora de apenas ouvir.

Continua...

Próximo destino: amor | SEULMINOnde histórias criam vida. Descubra agora