A festa da morte

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Quando Fanny falara sobre o convite de Dani com Tezi ela praticamente surtara.
-Você não pode fazer isso! Não pode fazer isso Fanny... Você viu elas...
Tezi parecia atordoada girando de um lado para o outro em seu quarto branco com estilo pop.
-Eu sei eu as vi... mas... e se elas forem boas pessoas?
-Você não está interessada nelas, está interessada em Willian, isso sim! -Falou Tezi sentando na cama de braços cruzados ao lado de Fanny que assistia recolhida para si mesma.
-Não... tá pode ser isso... mas não é só por isso. -Fanny pausou. -Eu somente quero saber o que elas querem.
-É melhor você ir embora Fanny...
De algum modo, Tezi a tratara como uma inimiga. Por que Tezi faria aquilo? De qualquer forma, Fanny estava acostumada a viver somente consigo mesma.
A vida lhe caía bem quando o silêncio pairava. Era como se tudo estivesse em seu lugar. Tinha que se esquecer pelo menos um pouco de Tezi, de Dani e Willian que mal conheciam.
Fanny deu uma volta na cidade e por fim encontrou uma área verde não tão ampla quanto gostaria, mas estava satisfeita. Em vez de se sentar, fechou os olhos, abraçou a si mesma e imaginou seu corpo girando na sala de estar de sua vó. Os móveis pareciam se movimentar mais que ela e apenas o som de seus pés zunindo no chão era o que ouvia. Viu-se caindo e olhando para o teto de madeira antigo que parecia exalar um cheiro de pessoas idosas. O que sua avó diria sobre Tezi? Talvez dissesse que os verdadeiros amigos éramos apenas nós mesmos e que não deveríamos esperar que o outro alguém haja como planejamos todas as vezes. "As pessoas são diversas Fanny..." Sua avó sempre a lembrara de que o mundo era diverso, de que a vida era diversa e que o tempo todo as coisas poderiam mudar. Talvez Tezi precisasse apenas de um tempo para si mesma. O que as flores diriam se pudessem mesmo dizer algo? Livros científicos dizem que as plantas costumam se comunicar por ferormônios, então de fato, se Fanny pudesse entender essa forma de comunicação, o que entenderia? Humanos não são como plantas, humanos são humanos e é isso. Fanny desistiu da analogia e então apenas ajustou as flores que começavam a murchar em sua cabeça. Estava na hora de uma nova coroa, mas precisava que as flores do jardim de seu pai brotassem, então andaria sem uma coroa por algumas semanas.
Quando Fanny enfim abriu os olhos, se deparou com o carro de Dani parado bem à sua frente do outro lado da rua. Para a infelicidade de Fanny, as três garotas começaram a se aproximar.
-O que você estava fazendo? -Perguntou Dani tentando esconder a gozação em seu tom de voz.
-Estava apenas pensando... por que? - Perguntou Fanny.
-Bem não importa. O que você achou do convite?
Dani usava uma saia preta curta e uma blusa de mangas compridas cor de rosa. Não podia faltar é claro um salto da cor da blusa. As outras duas meninas que riam secretamente também se vestiam de forma semelhante.
-Bom... pareceu bom. Eu vou.
-Isso é fantástico! - Um brilho quase malicioso brilhava dentro de si.
-Mas espera... lá nos temos alguns presentes pra você. -Falou Dani levando as outras duas meninas consigo deixando Fanny sozinha novamente.
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Aquela semana se passara como um vento feroz. Tezi não conversara com ela durante toda a semana e Willian se inscrevera no time de futebol americano. Ele parecia alguém esportivo. O grupo que deu boas vindas à Tezi e Fanny se revelaram ser do segundo ano e tiveram uma boa conversa com Fanny no intervalo. As meninas Dani e suas súditas como Fanny preferira apelidar tornaram-se líderes de torcida e ficavam à espreita ao que parecia, de Willian. Era peculiar que estivessem interessadas nele e em Fanny. Fanny se inscrevera em um concurso de poesia que aconteceria nas próximas semanas. Estava um tanto animada. Tudo parecera normal naquela semana. Até que o sábado chegou.
Que roupa usaria? Após algum tempo se decidindo, Fanny decidiu se vestir à moda antiga, vestiu um vestido florido já que não usaria sua coroa. Calçou um all star branco e ajustou o cabelo à frente de seu corpo magro.
Quando estava pronta o carro de Dani estava à sua porta, no entanto quem dirigia era Cloe. Ela tinha além de cabelos loiros, uma pinta na bochecha, ao qual nenhuma delas tinha. Talvez fosse melhor para diferenciá-las. Ela estava vestida com um cropped e um short jeans. Usava um salto cor de creme e havia alisado os cabelos, ela parecia ter derramado um pote de gloss nos lábios. Cloe saiu do carro e olhou para Fanny com o celular na mão.
-Credo, você vai assim?
-Vou. -Respondeu Fanny.
-Então tá, a Din mandou nos não mexermos em você, mas por favor eu não vou aguentar. Toma isso. - Ela entregou um pouco de gloss labial para Fanny e sorriu.
-Obrigada. - Fanny pegou e passou nos lábios.
As duas entraram no carro e exceto pela música eletrônica que estavam ouvindo não havia nenhum barulho. Nenhuma fala. Quando chegaram à casa de Dina, Fanny percebeu que era uma mansão, tinha duas piscinas e uma grande quadra de tênis. As duas entraram por uma porta de quase três metros e logo se encontraram com Nina e Dina.
Nina usava um vestido colado e curto com um salto de quase quinze centímetros e tinha as mãos na cintura. Seu cabelo estava mais escuro do que de costume, mas nem tanto. Nina era a que estava mais alta que todas as outras, usava uma saia rodada e um cropped de pescoço longo. Todas estavam maquiadas e Fanny parecia minúscula.
-Vocês não estão vestidas para uma festa do pijama... -Falou Fanny.
-Claro que não bobinha... Venha suba.
Dani pegou as mãos de Fanny e a sentou em uma cadeira em seu quarto alguns andares acima. Era o maior quarto que já havia visto.
Dani pegou uma bolsa cheia de adereços e maquiou Fanny por completo. Ela até parecia outra. Na verdade, parecia uma delas. Seu cabelo preto fora jogado de lado e alisado e brincos dourados foram colocados em sua orelha. Estava bela, muito bela.
-O que você achou? - Perguntou Dani se sentando na penteadeira com braços cruzados e um sorriso no rosto.
-Eu gostei... mas...
-Sem mas... agora só falta a roupa e os saltos. -Nina a interrompeu enquanto Cloe vinha com roupas e um salto florido nas mãos. -Pensamos que você iria gostar de algo florido... Fanny.
-Onde eu posso me trocar? -Fanny perguntou.
-Aqui mesmo querida. Somos meninas não há problema.
Ainda envergonhada, Fanny pensou em voltar, mas lembrou das palavras de sua mãe. Fanny se trocou e ouviu risadas das garotas e então quando olhou para si mesma no espelho, viu-se extremamente diferente. Ela parecia ter mais corpo, usava um vestido preto bem colado ao corpo na parte de cima com a parte debaixo como uma saia bem rodada. Aquilo no entanto, era um pouco curto. Dani pareceu perceber sua inquietação.
-Não se preocupe, você vai se acostumar.
Seria difícil andar com aqueles saltos, mas não era a primeira vez que Fanny os usara, por isso não estava completamente desengonçada. Todas se sentaram na cama ao seu lado e Dani perguntou.
-Você acha que o Willian gosta de você?
Então era isso, era Willian que elas queriam e não Fanny.
-Por que está perguntando isso?
-Ora... ele vive olhando para você e você para ele... - Falou Nina mexendo nos cabelos.
O rosto de Fanny corou.
-Eu não sei.
-Eu não sei de fato porque ele faz isso... Não deveria ter motivos, já que nós estamos namorando secretamente... Você sabe, jogadores e líderes de torcida sempre foram o par perfeito.
Fanny sentiu vontade de estapeá-la, mas não era assim. Tudo iria dar certo. As flores e as coisas boas.
-Enfim, hoje nós vamos dar uma festa. Pareça-se uma de nós e quem sabe você se interesse em outro alguém?
-Ou alguém se interesse em você? -Completou Cloe.
Tinha que ir embora, estava furiosa consigo mesma por estar lá vestindo aquelas roupas. Iria embora. Quando se levantou para ir embora e abriu a porta do quarto se deparou com uma casa cheia no andar debaixo. Todos da escola pareciam estar lá e era como se todos esperassem que aquela porta se abrisse, pois todos olharam para Fanny. "O que eu estou fazendo aqui??" . Fanny desceu as escadas devagar e as outras meninas desceram atrás acenando para todo mundo. De repente as luzes pareceram se abaixar e a música eletrônica se espalhar pelo ar. Quando aquilo de fato começara? Não deveria ir. Era difícil passar por uma multidão que a olhava e fazia comentários o tempo inteiro. Passando por uma pessoa e outra com aqueles saltos se deparou com Tezi. Ela vestia um vestido justo e um salto baixo. Tinha maquiagem nos olhos como sempre. Era o que mais se destacava nela.
-O que... você está fazendo aqui? -Perguntou Fanny.
-Festa do pijama não é? Eu quis me certificar. Mas sabe Fanny eu acho que não é bem isso que está acontecendo aqui. Por que você não volta para a sua casa? Já que aqui não é o seu lugar!
Tezi fora completamente grossa com ela. Fanny queria chorar e queria ir embora, mas então reuniu forças. Sua avó fora forte com a perda de seu avô e fora tão guerreira na vida que poderia se orgulhar. Não seria Tezi que a faria ser menos do que era.
-Não eu não vou fazer isso e quer saber? Eu consegui fazer parte delas e você não, agora por favor, dê-me licença.
Fanny passou direto por Tezi decidida a ficar, mas o que faria? Não iria beber, não fazia o seu tipo. Fanny achou alguns petiscos na mesa e comeu. Em seguida se sentou em uma cadeira perto da piscina e ficou à espera de algo com um copo vazio nas mãos. Algum tempo depois uma mão tocou o seu ombro. Eram mãos macias à propósito. Era Willian.
-Olá Fanny... Você está diferente.
Ele parecia estranhá-la.
-Olá, bom... eu ganhei alguns presentinhos da Dina. -Falou Fanny sorrindo.
Ele ainda parecia incomodado e se sentou perto dela.
-Você se inscreveu em algo na nossa escola? Digo, deve gostar de fazer alguma coisa.
Fanny se sentia intrusa, já que ele namorava Dina.
-Em poesia. Sou uma boa poeta. -Falou Fanny ainda mostrando um sorriso luminoso.
Willian pegou sua mão. O que ele estava fazendo? Ele namorava Dina.
-É... você não...
-O que foi Fanny? Estou incomodando você?
Não. Não era isso, mas ele namorava Dina. Fanny sentiu raiva de Dina e se lembrara de suas palavras no quarto. Não era a hora, mas Fanny acabara explodindo e perdendo o controle de suas palavras pensadas.
-Você namora a Dina... Aquela menina invasiva e ridícula! E agora você está pegando na minha mão! - Falou Fanny com olhos marejados. - Ela nem deveria estar na nossa escola em lugar nenhum!
-Espera... - Ele pareceu assustado. - Você está dizendo que eu estou namorando a Dina? Foi só um beijo e nada mais e mesmo assim ela começou...
Foi só um beijo? Não toleraria aquilo. Fanny se esquecera da menina das flores, da moda antiga e dos bons costumes. Estava irritada. Muito irritada por ter sido arrastada para aquilo tudo. Fanny se levantou e gritou.
-Dani nunca deveria ter existido!
Fanny tirou os saltos e correu. Deixou Willian e passou por todos que a olhavam encarando-a. Fanny sumiu. Encontrou um pequeno armário nas paredes da mansão e se escondeu dentro dele. Suas lágrimas enchiam seu rosto. Podia gostar de alguém e esse alguém ter dado " apenas um beijo" em uma menina mimada que brincava com as pessoas para fazer o que quer? Chorava e chorava. As horas passaram dentro daquele armário até que um silêncio pairou sobre a mansão agitada e Fanny poude ouvir o seu próprio choro.
-O que é isso? -Fanny se perguntou.
De repente, um grande estalo ecoou na casa de Dani e gritos ecoaram por toda a parte. Fanny se levantou e enxugou as lágrimas com o pulso. Ainda carregando os saltos saiu do armário e se deparou com um aglomerado de pessoas em volta de algo e outra maioria correndo dali. Devagar Fanny se aproximou dos zumbidos das vozes faladas em conjunto e passou por cada pessoa do aglomerado. Aquilo era pior do que tudo que havia visto em sua vida. Dani estava caída com seus cabelos loiros esparramados no chão. Estava caída de lado e uma poça de sangue se formava atrás de sua cabeça. Ela parecia ter sido empurrada do segundo andar. Mas havia algo em Dani. Algo peculiar. Sua coroa de flores murcha estava presa à cabeça do corpo de Dani, como se alguém tivesse feito para incriminá-la. Estava tudo perdido. O que todo mundo pensaria? Por um segundo, todos voltaram a atenção para Fanny. Não podia ser. Não podia ser. Todos, inclusive Willian a olhavam de olhos extremamente abertos. "ELES PENSAM QUE EU A MATEI."

As flores em minha cabeçaOnde histórias criam vida. Descubra agora