Capítulo 01

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São três malas no total. Foram anos vivendo juntos e ele está me deixando e levando apenas três malas. Meu marido me obrigou a assinar a documentação, exigiu o divórcio mesmo eu negando, implorando e pedindo para que ficasse ao meu lado.
Pharrell  nesse momento está dizendo todo aquele papo de homem sobre a separação. “Eu te amei muito”, “Não é você, o problema sou eu” (a mais clichê de todas), “Os anos que passei ao seu lado foram os mais felizes da minha vida”, “Nosso casamento acabou” e “Não chore, eu sou o culpado”.

– Podemos ser amigos…

Sorri com desdém, só estava faltando essa frase!
Lembro-me quando fiquei apaixonada por esse homem, eu era apenas uma estudante de gastronomia cursando o primeiro ano na Universidade. Um sonho antigo que vem de família, meu pai era um simples padeiro com uma panificadora pequena em um bairro na cidade de Lyon. A minha mãe, uma doceira de mão cheia. Cresci em meio a massas e o cheiro de bolos assando no forno. Brincava de cozinheira com minhas amigas e me divertia ajudando mamãe a enrolar os pães e colocar nas formas.
Aos quatorze anos comecei a ver a culinária como um passatempo e me concentrei no ramo editorial. Meu sonho era ser diretora de uma grande editoria, comecei a ler todos os livros que conseguia, devorava as palavras como se elas fossem os alfajores de limão e chocolate que a minha mãe adorava fazer, que são uma delícia.
Aos dezesseis anos me aproximei novamente da culinária, estava no último ano do colegial e conheci Adele. Ela fazia parte do clube de culinária e ajudava as cozinheiras do refeitório com os outros alunos que faziam parte do projeto. Acabei me inscrevendo para participar do clube e novamente fiquei apaixonada pela culinária. Não conseguimos fugir do que está destinado a nós.
Aos dezoito anos estava correndo pelos corredores da Universidade, Le Reeks Lyon, para não chegar atrasada nas aulas. Nasci para amar a gastronomia, para ser uma chef de cozinha. Sabe quando você acorda pela manhã e se olha no espelho sentindo-se realizada? Era dessa maneira que me sentia todas as manhãs na Universidade, feliz, animada e realizada.
Phaell como costumava chama-lo, não cursava gastronomia, mas certo dia estava passeando pelos corredores do bloco de culinária. Foi com um esbarrão clichê, do tipo que vemos em um filme de comédia romântica, que nos conhecemos e foi amor à primeira vista (devo informar que a minha vida inteira é um belo clichê).
Ele era um garoto de dezenove anos, bonito e atlético. Um moreno que tirava o fôlego das alunas da Universidade, sempre rodeado com um fã clube de garotas. E eu? Era só a garotinha de 1,56 de altura, cabelos castanhos e sem graça. Uma pele pálida, quase sem vida, e olhos castanhos.
Hoje me acho uma mulher bonita e sedutora, mas na minha adolescência não tinha uma autoestima elevada. Em meio a tantas opções Pharrell me escolheu e eu me senti tão especial. Nosso primeiro encontro foi esplêndido, com direito a rosas vermelhas e uma serenata com um violino. Quantas mulheres recebem uma serenata em meio a um jantar romântico?
Vamos ser honestas, o romantismo morreu. E quando encontramos um homem que ainda dá valor a pequenos gestos como abrir a porta do carro, deixar aquele bilhetinho na geladeira com uma mensagem romântica, ou levar um café da manhã na cama, nos apaixonamos! Eu amo Pharrell e essa separação está custando meu coração.

– Você nunca me amou! – Disparei limpando as lágrimas do meu rosto.

– Narah, vivemos anos lindos e maravilhosos, mas não posso fingir que está tudo bem. Você está focada no restaurante e eu na orquestra, temos outros objetivos agora. Teve uma época em que você era o maior sonho da minha vida, só que hoje… – Os lábios inferiores de Pharrell tremeram quando tentou se controlar para não chorar. – Não consigo continuar, sempre vou ter um carinho e uma admiração imensa por você. Por favor, nosso casamento estava devastado em todos os sentidos. Vamos conquistar uma nova felicidade. – Ele se aproximou e depositou um beijo em minha testa.
– Adeus Narah, boa sorte e seja feliz!
Pharrell saiu puxando as malas e nosso apartamento, que é tão espaçoso e amplo, ficou pequeno e solitário.

Como recomeçar a minha vida depois de uma separação?

Eu estava perdida, apenas conseguia manter o meu profissionalismo. Sou proprietária do restaurante Le'Biran, que carrega o sobrenome da minha família. É conhecido e muito frequentado, principalmente, por apreciadores de uma boa comida.  O meu restaurante apresenta grandes pratos da cozinha francesa a um preço justo, por esse motivo está sempre cheio de turistas, alguns até deixam suas reservas antecipadas para não perder uma boa mesa.
Tenho profissionais excelentes, uma equipe satisfatória e chefes maravilhosos que criam pratos de dar água na boca. A minha vida financeira é um resultado da minha dedicação, sou uma profissional premiada e que não mede esforços para conquistar seus objetivos. Mas desde que Pharrell me deixou há uma semana, estou sem saber qual é o rumo certo a tomar. Sinto falta de chegar do trabalho e conversar sobre nosso dia, ele era meu melhor amigo. Como deixei nosso casamento chegar ao fim?
Depois de um dia estressante com o administrador do meu restaurante, voltei para o meu apartamento exausta mentalmente. Era começo de noite e o silêncio só tornava a dor e o sofrimento maior. Me controlando para não chorar, verifiquei as mensagens na secretária eletrônica.

"Oi filha! Você não retorna as minhas ligações, a mamãe está ficando preocupada. Eu te amo. Ligue-me por favor e mande um beijo para o Pharrell".

Se a minha mãe soubesse toda a verdade... para os meus pais Pharrell era o genro perfeito e alegre, que me amava acima de tudo e de todos.

“SUA CRETINA MALDITA! Por que não me contou sobre a separação? Às dezenove horas em ponto estou chegando no seu apartamento, vamos ter uma noite de garotas!”

Aí não! Não! Não! Olhei no relógio e já é 18:50.
Luluzinha, um apelido carinhoso (ou não) que coloquei na minha colega, é uma das pessoas que não quero encontrar nesse momento! Lorraine Pasky insiste em dizer que eu sou a sua melhor amiga, mesmo não sentindo o mesmo por ela. Ela é inconveniente a maior parte do tempo, não filtra seus pensamentos e fala tudo que vem na sua cabeça, como se a sua língua não tivesse freio. Não controla suas ações e sempre arruma confusão. Quando corri para trancar a porta, a mesma é aberta com tudo e Lorraine entra com várias sacolas.

– Aí amiga! Eu sinto muito…

Ela não imagina o quanto eu detesto que me chamem de “amiga”, soa tão falso. Luluzinha me abraçou, acertando alguns tapinhas nas minhas costas.

– Você vai ficar bem, é uma mulher rica, bonita e… Meu Deus, esse vestido é da Merabi? Uau! Arrasou!

Forcei um sorriso amarelo. Por que essa mulher insiste em dizer que sou sua amiga? É tão nítido que me sinto desconfortável ao seu lado.

– Obrigado, mas não precisa se preocupar. Eu e Pharrell estávamos precisando desse tempo. Desculpe a minha curiosidade, mas como descobriu que estamos separados?

– Eu flagrei ele aos beijos com uma loira em um concerto, é claro que eu fiz aquele escândalo gigantesco. Você tinha que ver a reação do Pharrell, ele não sabia se corria, se gritava, se pedia ajuda ou…

– Uma loira? Em um concerto? – O chão desmoronou aos meus pés, na verdade o mundo inteiro caiu sobre mim. Eu me desesperei, chorei e me entreguei a dor na frente dessa mulher vulgar.

– Amiga! Não estraga a sua maquiagem da anastasia só por causa de homem, esse rímel não merece!

– Por Deus… – Estou perdendo a paciência com ela. – O meu casamento de anos acabou e está preocupada com o meu rímel?

– Exatamente. Quer saber o porquê sou solteira com 30 anos? Eu explico. Não aguento desaforo de macho alheio, não aguento um xingamento, um comportamento desrespeitoso. Não aceito ser menosprezada por uma pessoa que não merece um por cento dos meus sentimentos. Agora retoque essa maquiagem, vou levá-la a um lugar!

O meu Garoto (DEGUSTAÇÃO) Onde histórias criam vida. Descubra agora