Confissão

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-Como vai, velhinho?—Sofia o cumprimenta passando atrás do sofá, carregando sua pasta.

Viktor pula do seu lugar, se virando para ela como se visse uma deusa encarnada. Sofia sorria tranquilamente, vestindo um vestido branco simples e sapatilhas, com os cabelos soltos naturais. Em sua pasta preta e grossa, ele podia adivinhar que levava seus cadernos de música.

-Graças a...como foi que entrou aqui?—Viktor se interrompe a olhando confuso.

Sofia meramente aponta com o polegar para a porta, onde Eva sorri passando pelo corredor. Viktor passa os olhos ao redor, acenando compreensivo.

Na verdade, ele estava sonhando acordado com a manhã que tiveram juntos, e Sofia aparecer de repente só o fez ficar mais aficionado por sua companhia.

-O que estava fazendo?—Sofia pergunta se aproximando e se sentando ao seu lado com as pernas cruzadas.

Viktor se arruma no sofá, tirando seus cadernos e apostilas para que ela tivesse mais espaço.

-Estava organizando meus estudos. Preciso achar minha apostila de português para a próxima aula...—Ele responde fazendo uma pilha com os cadernos e os deixando lá.—Mas eu acho que vou deixar isso para mais tarde.

Na verdade, Viktor teria uma aula em cinco minutos. O seu professor estaria ali e ele teria que aguentar uma hora ininterrupta de verbos e advérbios, pronomes, adjetivos, substantivos...Só de pensar lhe dava depressão. Achava o português muito difícil e complexo, mas seus pais insistiam para que o aperfeiçoasse para poder um dia redigir os negócios que tinham no país. Viktor tinha pena deles pois, tirando o fato de encontrar Sofia, não tinha quase nenhuma intenção de ficar ali e fazer o que eles faziam. 

Sofia sorri de sua indulgência, se inclinando para ler os títulos, interessada.

-Sabe, você devia dar mais valor nas aulas que os seus pais te pagam, Vik.—Ela comenta ainda absorta na análise.

O menino apenas assentiu, a observando com admiração; Sofia não estava exatamente caprichada ou mais bonita do que já a vira antes, mas mesmo assim, ele sentia algo em seu estômago borbulhar deliciosamente quando estavam perto. Ele sentia seu cheiro de roupa recém lavada e de sabonete. Tão simples mas ainda tão especial para ele. Ele reconheceu o cheiro como lavanda.

Sofia se vira para o olhar para ver por quê não havia recebido resposta, impaciente.

-Estou falando sério, Vik. Você tem tantas oportunidades que sequer dá bola! Eu queria muito que meus pais me dedicassem tantas atividades como os seus.—Ela confessa parecendo chateada com algo.

Sofia se encosta no sofá e começa a brincar com uma almofada que estava por perto, tentando disfarçar seu aborrecimento se ocupando com algo.

Viktor fica sério e a olha refletindo.

-Sofia...não é como se eu não soubesse o valor das coisas. É exatamente por eu saber que eu não ligo. Meus pais tem muito dinheiro; para eles, essas muitas atividades não são nada, não tem nenhum sacrifício. Já os seus, por mais que você fique chateada por eles não te darem tudo isso, é porque eles realmente não podem. Mas eles te compraram todas essas apostilas e insistiram em pagar suas aulas de piano, não foi? Mesmo que não tivessem condição. Isso sim é algo feito por amor.—Viktor discursa com intensidade, sem desviar o olhar.

Sofia o fita sem palavras. Nunca antes ela vira o amigo falar tão abertamente sobre seus conflitos familiares e de forma tão crítica. Viktor sempre falara nesses assuntos com desdém e deboche, contando piadas e fazendo parecer que não se importava. Ela via agora que fora tudo uma fachada para se proteger.

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