"Para crescer um país precisa investir, mas para investir ele necessita primeiro de poupança". Essa frase é comum nas discussões sobre crescimento econômico. Ela implica que um país precisa primeiro poupar, para depois transformar essa poupança em investimento. O investimento então aumentaria a produtividade da economia e geraria o crescimento econômico. A afirmação no começo desse parágrafo esconde então duas hipóteses: 1) para investir um país precisa de poupança prévia; e 2) todo investimento se transforma em ganhos de produtividade. A parte dois acima é nitidamente incorreta. Um simples olhar ao redor do mundo nos mostra que existem vários tipos de investimento que de modo algum aumentam a produtividade da economia (em alguns casos, tais investimentos acabam por diminuir a produtividade). Por exemplo, um aumento dos investimentos em segurança, originado por um aumento da criminalidade, tem pouca probabilidade de aumentar a produtividade da empresa. Pelo contrário, pode ocorrer perfeitamente que dada às novas normas de segurança a produtividade da empresa caia. Já a parte 1 acima está correta, mas necessita de uma discussão mais prolongada.
Parece razoável assumir que para se gastar recursos antes é necessário tê-los. Assim, nada mais natural do que a necessidade de poupança prévia para a realização de investimentos futuros. Será então que poderíamos afirmar que países pobres em recursos serão eternamente pobres? Afinal, dada sua incapacidade de poupar, tais países teriam poucas oportunidades de investir. Tal ciclo vicioso os condenaria a uma situação de penúria eterna. A resposta para a pergunta acima é: Não, o fato de um país ser pobre implica apenas que sua taxa de poupança é, provavelmente, baixa. Mas isso não quer dizer que ele não possa atrair poupança de outros países do mundo. Em outras palavras, o que importa para o investimento não é apenas a poupança doméstica (poupança do país), mas sim a soma da poupança doméstica com a poupança externa (poupança recebida de outros países). Assim, se um país é pobre, e precisa investir, ele pode financiar esse investimento com poupança doméstica ou com poupança externa.
Muitas pessoas esquecem (ou temem) que o importante para um país é a poupança total (soma da poupança doméstica com a poupança externa) e não apenas a poupança doméstica. Tais indivíduos esquecem (ou temem) que um país possa recorrer à poupança externa para financiar seus investimentos. Dessa maneira, argumentam que uma alta taxa de poupança doméstica é vital para o crescimento econômico. Citam a seu favor o exemplo de alguns países ricos que possuem altas taxas de poupança doméstica, e de alguns países pobres com baixas taxas de poupança doméstica. Inferem dessa relação que uma alta taxa de poupança doméstica é importante para gerar riqueza numa nação. Tal raciocínio tem um ponto fraco: os países ricos são ricos por que pouparam mais ou será que pouparam mais por que são ricos?
A teoria econômica, e o bom senso, nos levam a aceitar que pessoas ricas têm mais facilidade de poupar do que pessoas pobres. Em termos técnicos, a propensão marginal a poupar dos ricos é maior do que a dos pobres. Mas isto significa dizer que pessoas ricas poupam mais que pessoas pobres (e não que poupar mais torna automaticamente uma pessoa rica). Por exemplo, vejamos o caso de uma pessoa pobre que recebeu uma herança milionária. Após o recebimento da herança é natural que a taxa de poupança dessa pessoa seja alta, mas isso não implica em dizer que foi sua taxa de poupança no passado que a deixou rica (afinal ela ficou rica apenas por ter recebido a herança). O mesmo raciocínio vale para países; muitos países poupam mais simplesmente por serem mais ricos. Isto é, pelo fato de terem mais recursos é natural que tenham mais facilidade em poupar. Assim, quando verificamos uma alta correlação entre riqueza de um país e sua taxa de poupança doméstica não podemos inferir daí que uma alta taxa de poupança doméstica gere crescimento econômico.
A Tabela 13 mostra a taxa de poupança doméstica dos países de nossa amostra, no período 1990-2000. Os dados são provenientes da Penn World Table. Podemos notar que, dentre os países ricos, os Estados Unidos e o Reino Unido possuem taxas de poupança doméstica abaixo dos 20% de seu Produto Interno Bruto (PIB). Além disso, muitos outros países ricos se situam na faixa entre 20% e 25% de taxa de poupança doméstica, faixa essa compartilhada por vários países de renda média. Ainda em relação aos países de renda média, a Coréia do Sul e a Malásia possuem taxas de poupança doméstica acima de 30% do seu PIB e nem por isso se situam no rol de países ricos. Por outro lado, Grécia e Israel (os dois mais ricos países de renda média) possuem taxas de poupança doméstica inferior a 16% do PIB, taxa essa muito mais identificável com países pobres. Em relação aos países pobres, a Tailândia com uma taxa de poupança doméstica de 34,3% do PIB é a prova de que a poupança doméstica por si só não é o determinante da riqueza de uma nação.
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Fatores Determinantes da Riqueza de uma Nação (2007)
No Ficción*** Este livro foi escrito em 2007 *** Em junho de 2018 foi disponibilizado aqui*** Por que alguns países são tão ricos enquanto outros são tão pobres? Economistas, filósofos, cientistas e políticos têm se debatido sobre essa questão com afinco, mas...