Capítulo 9

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Isaura e frei Castilho tomavam café na varanda enquanto conversavam sobre Janete e outros assuntos do dia a dia. O idoso fora visitar as mulheres como costumava fazer com seus amigos queridos. Era do tipo de pessoa que cultivava as amizades à moda antiga, ia à casa das pessoas, passava horas conversando e era sempre muito bem-vindo. O assunto principal dessa visita era Janete e sua gravidez que tanto os preocupava. Ambos consideravam-na como a filha que não tiveram e nutriam por ela um carinho todo especial.

A manhã estava fresca e ensolarada. Embora fosse fim de inverno, algumas flores atreviam-se a surgir na paisagem da cidade. O céu insuportavelmente azul ofuscou os olhos de Janete que apareceu à soleira da porta.

— Bom dia! Já estão fofocando assim tão cedo? — riu e cobriu os olhos com a mão ao beijar os idosos na testa. — Essa luz toda está me incomodando. O dia está claro demais pro meu gosto. Acho que estou há muito tempo trancada estudando, tenho que admitir.

— Também acho filha, não falo sobre isso para não chatear você. Venha tomar café. Não vai trabalhar hoje não?

Isaura levantou-se para colocar o café de Janete.

— Na verdade, vou mais tarde. Agora pela manhã tenho que ver a Patrícia. Tenho atendimento marcado para as dez horas.

— Então faço questão de deixá-la na porta da doutora. — frei Castilho também se levantou. — Meu Fusca finalmente saiu da oficina e estou motorizado agora.

— Por mim está excelente, frei Castilho. Estou mesmo com uma baita preguiça de andar até lá. Parece que não acordei ainda. — disse Janete enquanto comia um pãozinho e tomava café encostada na parede da varanda.

— Reparando bem, menina — disse o frei ao piscar um olho —, você precisa mesmo de uma caminhada. Está corpulenta e a barriguinha já está aparecendo.

Janete olhou atravessado para o idoso. — Não vou nem responder, frei Castilho. O senhor está ficando muito engraçadinho. — ela tentava levar a questão da gravidez com leveza apesar de ser difícil tocar nesse assunto.

— Podemos ir? Estou pronta. — beijou Isaura e encaminhou-se para o portão.

Frei Castilho olhou de lado para a velha senhora que fez um gesto com a cabeça.

— Vamos filha. Até mais, Isaura. Apareça lá na paróquia porque a festa da padroeira está chegando e precisarei de ajuda.

— Pode deixar Frei. Ainda esta semana, passarei por lá.

O idoso seguiu Janete até o portão. Abriu a porta do carro e entraram, entre outros assuntos, conversaram sobre a festa da padroeira que se aproximava. O frei contou sobre as barracas de comidas e bebidas que montaria com o auxílio dos comerciantes locais e dos frequentadores da igreja. Todos estavam animados, ia até ter show com algumas bandas da comunidade e das redondezas. Janete escutava fazendo alguns comentários de vez em quando. Não estava muito interessada na tal festa. Não estava interessada em nada ultimamente que não tivesse a ver com ela mesma, às vezes nem acreditava no que estava vivendo, pensava que assistia à realidade de uma outra pessoa, como se estivesse assistindo a um filme, ou pior, como se estivesse trancada dentro de um espelho vendo a realidade lá fora e paralisada, estática do lado de dentro. Já não sabia mais o que pensar.

— Chegamos minha filha, mande lembranças minhas à doutora. Avise a ela da festa da padroeira, viu?

Frei Castilho dizia tais palavras ao mesmo tempo em que contemplava Janete com um misto de pena e muito amor.

ABDUÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora