Isaura e frei Castilho tomavam café na varanda enquanto conversavam sobre Janete e outros assuntos do dia a dia. O idoso fora visitar as mulheres como costumava fazer com seus amigos queridos. Era do tipo de pessoa que cultivava as amizades à moda antiga, ia à casa das pessoas, passava horas conversando e era sempre muito bem-vindo. O assunto principal dessa visita era Janete e sua gravidez que tanto os preocupava. Ambos consideravam-na como a filha que não tiveram e nutriam por ela um carinho todo especial.
A manhã estava fresca e ensolarada. Embora fosse fim de inverno, algumas flores atreviam-se a surgir na paisagem da cidade. O céu insuportavelmente azul ofuscou os olhos de Janete que apareceu à soleira da porta.
— Bom dia! Já estão fofocando assim tão cedo? — riu e cobriu os olhos com a mão ao beijar os idosos na testa. — Essa luz toda está me incomodando. O dia está claro demais pro meu gosto. Acho que estou há muito tempo trancada estudando, tenho que admitir.
— Também acho filha, não falo sobre isso para não chatear você. Venha tomar café. Não vai trabalhar hoje não?
Isaura levantou-se para colocar o café de Janete.
— Na verdade, vou mais tarde. Agora pela manhã tenho que ver a Patrícia. Tenho atendimento marcado para as dez horas.
— Então faço questão de deixá-la na porta da doutora. — frei Castilho também se levantou. — Meu Fusca finalmente saiu da oficina e estou motorizado agora.
— Por mim está excelente, frei Castilho. Estou mesmo com uma baita preguiça de andar até lá. Parece que não acordei ainda. — disse Janete enquanto comia um pãozinho e tomava café encostada na parede da varanda.
— Reparando bem, menina — disse o frei ao piscar um olho —, você precisa mesmo de uma caminhada. Está corpulenta e a barriguinha já está aparecendo.
Janete olhou atravessado para o idoso. — Não vou nem responder, frei Castilho. O senhor está ficando muito engraçadinho. — ela tentava levar a questão da gravidez com leveza apesar de ser difícil tocar nesse assunto.
— Podemos ir? Estou pronta. — beijou Isaura e encaminhou-se para o portão.
Frei Castilho olhou de lado para a velha senhora que fez um gesto com a cabeça.
— Vamos filha. Até mais, Isaura. Apareça lá na paróquia porque a festa da padroeira está chegando e precisarei de ajuda.
— Pode deixar Frei. Ainda esta semana, passarei por lá.
O idoso seguiu Janete até o portão. Abriu a porta do carro e entraram, entre outros assuntos, conversaram sobre a festa da padroeira que se aproximava. O frei contou sobre as barracas de comidas e bebidas que montaria com o auxílio dos comerciantes locais e dos frequentadores da igreja. Todos estavam animados, ia até ter show com algumas bandas da comunidade e das redondezas. Janete escutava fazendo alguns comentários de vez em quando. Não estava muito interessada na tal festa. Não estava interessada em nada ultimamente que não tivesse a ver com ela mesma, às vezes nem acreditava no que estava vivendo, pensava que assistia à realidade de uma outra pessoa, como se estivesse assistindo a um filme, ou pior, como se estivesse trancada dentro de um espelho vendo a realidade lá fora e paralisada, estática do lado de dentro. Já não sabia mais o que pensar.
— Chegamos minha filha, mande lembranças minhas à doutora. Avise a ela da festa da padroeira, viu?
Frei Castilho dizia tais palavras ao mesmo tempo em que contemplava Janete com um misto de pena e muito amor.
VOCÊ ESTÁ LENDO
ABDUÇÃO
Science FictionAo despertar no leito de um hospital, após semanas desaparecida, Janete não poderia imaginar que sua vida mudaria para sempre. Seus dias de estudante universitária no interior do Rio de Janeiro estavam contados. Agora ela era a futura mãe de um ser...