Aquela sexta-feira primaveril estava agradável e aconchegante. O sol aquecia sem queimar e a brisa suave refrescava sem causar frio. Gaara descia as escadas de sua casa um tanto temerário se o devia fazer mesmo com sua mãe tentando passar alguma segurança dizendo que Rasa demoraria a chegar e que ela não estava esperando nenhum tipo de visita. Das poucas coisas que o ruivo fazia e efetivamente gostava certamente tocar piano estava entre elas, sendo aquele instrumento de cordas a ponta mais segura de sua sanidade e que ainda fazia com que sentisse algum ponto de paz e não perdesse completamente a vontade de viver.
Ele tocava sempre que tinha chance e preferencialmente quando Rasa não estava em casa, uma vez que mesmo o piano ficando em um ambiente fechado seu som forte ainda se propagava e alcançava alguns cômodos da casa, de modo que era impossível uma completa discrição por parte de Gaara. Naquela tarde, no entanto, ele estava realmente disposto a tocar e seguiu em silêncio seu caminho pelo corredor escondido que dava acesso ao pequeno quarto onde o instrumento estava. O lugar tinha capacidade apenas para o piano e a iluminação provinha de quatro luzes amareladas dispostas pelos cantos do local que iluminavam o suficiente para que não precisasse forçar as vistas.
O pequeno corredor que seguira dava até uma porta que Gaara se lembrou de deixar fechada. O caminho curto continuava por mais alguns três ou quatro passos antes de chegar à pequena câmara onde o instrumento repousava em silêncio e apenas o fato de estar presente ali impunha respeito a quem chegasse perto. Gaara respirou fundo e deixou um carinho na superfície extremamente polida.
O instrumento era negro como a noite e refletia qualquer coisa que chegasse perto. Gaara seguiu pela lateral até alcançar o banco que ficava de frente para o teclado e, curvando-se a seu companheiro, deixou um beijo sobre a tampa do instrumento. Ele levantou a grande estrutura e a manteve erguida com auxílio do apoio da tampa, a haste lateral que permitia com que o instrumento ficasse aberto. Em seguida verificou a estrutura interna.
Seus olhos precisos caminharam sobre cada estrutura interna do piano acomodada ordenadamente, as cordas esticadas e devidamente afinadas. Aquele era um trabalho difícil, mas quando Gaara fizera as aulas aprendera todo necessário para manter o instrumento afinado. Por todos aqueles dezoito anos a única coisa que tivera permissão de aprender fora a tocar o instrumento, uma ordem imposta por Karura que mesmo Rasa não se opusera, muito provavelmente porque não havia sido ele a pagar qualquer coisa que envolvesse aquele aprendizado.
Bem, a verdade era que Gaara dominava completamente a arte de tocar piano. Começara aos cinco anos de idade quando ainda na escolinha demonstrara interesse pelo instrumento e onde Karura aproveitara da oportunidade para incentivar o filho a continuar tocando e efetivamente aprender tudo que fosse possível, e durante aqueles treze anos aquele era o maior confidente do ruivo.
Ele se sentou no banco a frente do instrumento e retirou a chave dourada do bolso, destravando a tampa do teclado e revelando as teclas ainda cobertas pelo tecido de veludo vermelho, além do nome em dourado gravado na parte interna da tampa. O modelo era um Steinway & Sons modelo D 1963, grande e imponente. Gaara removeu a proteção aveludada da cor de seus cabelos e a dobrou impecavelmente deixando apoiada sobre uma pequena mesinha redonda que ficava ao lado esquerdo do banco justamente para esse propósito.
A sucessão de ações que se seguia em sequencia era sempre digna de um espetáculo. Gaara fechou os olhos por um momento e respirou fundo ao sentir as teclas sob as pontas de seus dedos, desde as naturais dó, ré, mi, fá, sol, lá e si representadas pelas teclas brancas e seus acidentes da ordem dos sustenidos dó ♯, ré ♯, fá ♯, sol ♯ e lá ♯ e suas correspondentes ré ♭, mi ♭, sol ♭, lá ♭ e si ♭na ordem dos bemóis representadas pelas teclas negras. Gaara tocava sem vacilar todas as oitenta e sete teclas, seguindo seu caminho pelo peso das teclas graves até o grito estrondoso das agudas e só então se sentia em sintonia com o instrumento.
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O Pianista
Fiksi Penggemar[ItaGaa][SasuNaru][ShikaTema] [Universo Alternativo] ~ [09/09] A vida de Gaara seguia quase todos os passos de uma sonata, com a exceção de que nas linhas de sua existência não haviam as passagens alegres e brilhantes, mas sim os movimentos pesados...