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Leonor conduzia pela avenida da marginal, com o vento a entraçar cada fio do seu cabelo.

Estava temporariamente de regresso a Portugal. Segunda-feira retornava à capital inglesa, mas, por agora, deseja aproveitar o que o seu país tinha de melhor. Naquele caso, o sol, o bom tempo e as praias. Que saudades a preenchiam dessas comodidades em que crescera.

Tinha passado bons momentos naquela zona, dada a sua proximidade à Cidade das Sete Colinas, onde residira.

Decide parar na praia de Carcavelos. Mesmo antes de entrar no concelho de Cascais, noutra altura eleito como o predileto para jantar fora com um moreno cuja memória tentava ignorar.

Tranca a porta do carro, quando o toque de chamada soa dentro da sua mala.

"Leonor? Onde estás?" Questiona-a Ana Rita, uma amiga de longa data.

"Na praia. Não queres vir cá ter?" A morena convida, brincando desatentamente com a dobra dos calções. A sua cabeça parecia estar sempre em conversas com a lua.

"Vou sair agora do turno. Dá para esperares uns vinte minutos?" A enfermeira propõe.

"Claro."

"Então até já, beijinhos!"

"Beijinhos!"

Sentada no muro que dava acesso à praia, encara as ondas e inspira o ar que eternamente prezava. O cheiro a mar era, para Leonor, um pequeno tesouro da natureza e enchia-a com uma sensação de alegria.

Observando o areal, foca a sua atenção numa família com filhos que corriam pela extensão de areia num fustigante jogo da apanhada e, depois, num casal adolescente de namorados em que ele a tentava atirar para a água. Sorri levemente ao recordar-se daquela inocência tão genuína, da intimidade tão pura como a neve branca. Já a tivera, mas agora sentia que os desafios em que foi posta à prova haviam-na tornado em alguém com uma perspetiva distinta do mundo. Uma memória daquele lugar invade a sua mente, por mais que a tente suprimir.

"A que horas é que estendes a toalha?" A rapariga inquire-o, com ironia.

"Agarra-a desse lado, por favor." Bernardo pede, segurando uma ponta da sua toalha, enquanto gotas de água lhe escorriam pelo corpo. Um sorriso iluminava-lhe a face, devido ao ridículo da situação. Ainda não se tinha conseguido deitar na areia, porque a força do vento impedia-o de completar a simples tarefa de acomodar a toalha no chão.

Leonor estica o seu braço para agarrar a outra ponta que voava numa ondulação frenética. Tinha vontade de rir com a falta de destreza do namorado, mas controla o seu divertimento num mero sorriso.

"Já está." Ela declara, assim que têm sucesso.

"Estava difícil." Bernardo comenta.

"Deu para perceber." A jovem é incapaz de conter o riso, há muito, ansioso por escapar.

"Ei! O que é que é tão engraçado?" O jogador contesta a mulher humorada a seu lado.

"Tu." Ela declara, retornando o seu olhar com um sorriso.

"Olha... Agora sou motivo de entretenimento!" Resmunga o internacional português, fingindo-se indignado com o gozo a que era sujeito. O prosseguimento da conversa era rodeado por segundas intenções, pois jamais tencionava deixar a resposta passar sem retaliação.

"És o melhor de todos."

"Oh, ia atirar-te com água gelada e agora nem posso, porque foste querida e só tenho vontade de te beijar." Bernardo admite, notavelmente desiludido.

"Sou demasiado adorável."

"Irritantemente, és." Retribui com um sorriso, antes de erguer o seu corpo ligeiramente para chegar perto dela e tocar nos seus lábios. "Cheiras bem." Acrescenta.

"Obrigada. Lembra-me de oferecer-te um perfume de protetor solar no teu aniversário." Leonor goza.

"Tenho outras coisas em mente." O moreno revela com uma entoação maliciosa.

"Cálculo que sim."

O silêncio instala-se e dispensam quaisquer esforços para o fazer desaparecer. Passam assim alguns minutos, como oportunamente apreciavam fazer por ser um conforto que não obtinham com mais ninguém.

Minutos mais tarde, o momento é interrompido pelo futebolista.

"O que me dizes de uma bola de berlim?" Bernardo propõe, perante a chegada anunciada do vendedor.

Leonor ri-se e abana a cabeça desaprovadoramente. "Sabes que não devias..."

"Dias não são dias e um homem também não é de ferro." O moreno contrapõe.
Apesar da resistência inicial, Leonor concorda com a proposta, pois o açúcar era uma paixão irresistível.

"Regresso em dois minutos." O lisboeta promete, levantando-se de imediato da toalha e correndo por entre as toalhas até ao vendedor que, entretanto, se afastava a passos largos.

Pelo meio, pisa um senhor cujo porte excedia por três vezes o seu, acordando-o de uma sesta.
O cenário era de rir e a namorada estava a ter um ataque incontrolável ao observá-lo.

Apesar do contratempo, Bernardo cumpre a missão e regressa com um semblante confiante.

"Fresquinhas!" O jogador baloiça o saco no ar enquanto se deita, de novo, ao lado da jovem. "Mas depois do que eu passei para as trazer acho que merecia uma recompensa..."

"E o que poderias tu querer de mim?"

"Muitos beijos e amor e... uma longa massagem nas costas?" Bernardo nquire com o doce calórico na mão, propiciando a tentação de aceitar.

"Está bem..." Leonor acede, num tom conformado.

"Até podes começar já!" O futebolista sugere, deitando-se de costas.

A morena pega num punho de areia e, enquanto Bernardo descansava com a cabeça virada para baixo, deixa-a cair gradualmente sobre as suas costas.

"Ei!" Ele exclama, virando-se automaticamente para a provocadora daquele incómodo. A vingança avizinhava-se instantaneamente no seu pensamento e, sem demoras, agarra o corpo da namorada nos seus braços.

"Bernar- O que é que estás a fazer? Põe-me no chão!" Leonor reclama assim que o jogador se ergue. No entanto, as suas contestações são ignoradas.

Com alguns gritos e tentativas de escapar pelo meio, Bernardo caminha até à àgua e lança-a ao mar.

A jovem, completamente encharcada e um tanto furiosa, corre de volta até ao moreno, não lhe dando tempo para fugir do seu abraço que rodeava o seu corpo quente contra o dela frio e molhado. Riem-se perdidamente e, com a força de uma onda, acabam por cair os dois, de novo, dentro de água.

Já chega Leonor, ordena a si própria. Tens que parar com isto. Não é saudável e não te conduz a lado nenhum. Tu e o Bernardo acabou. Ponto final. Suspira audivelmente. Será que ele também pensa nisto?

💙
Demasiadas perguntas e poucas respostas. Este foi um pouco mais longo e em detalhe, mas espero que não menos bom.

Only You | Bernardo SilvaOnde histórias criam vida. Descubra agora