Lost in the moment

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Baekhyun POV

Histórias, são como marcas deixadas na argila do tempo, cada qual a sua intensidade, vivendo e perecendo conforme a sociedade lhe dá novas formas de tempos e tempos. Algumas marcas são tão leves, que ao sinal do primeiro movimento descuidado ou azar de seus donos, são substituídas por coisas mais importantes que tendem a encurtar sua já tão breve existência na mente, porém, outras, são tão profundas e bem talhadas com suas raízes obscuras, que mesmo que o mundo tente apagar sua existência com novos moldes, a argila que um dia foi tão moldável, já terá perecido para as sombras que tomaram seu interior, e aquele tempo estará manchado com uma marca em seu interior.

Por muito tempo, como um cachorro que se acostuma a apanhar pelo preço da comida que lhe garante a sobrevivência, eu fechei meus olhos para as marcas que ano após ano foram esculpidas na argila que eu chamava de vida. Cada talho, cada ranhura, cada mínima estria feita no material, representava um pedaço de mim que eu perdia para as mãos daquele homem e uma dor que se alojava no meu peito ao lado de tantas outras já alocadas.

Por anos, sem conhecer a qualquer outra realidade fora as ilusões que eu via através do pequeno televisor e os encontros reais onde as marcas tão bem fixadas em minha carne eram reforçadas a ferro e fogo, aprendi a acreditar que a boa realidade que eu via através dos filmes e das séries, eram uma versão a qual pessoas como eu não eram autorizadas a ter contato. Afinal, se por quase 20 anos eu precisei aguentar homens tocando meu corpo como se fossem uma propriedade autodeclara deles sem dizer uma palavra, por que isso mudaria agora?

Por causa disso, quando Chanyeol apareceu em minha vida, como uma sinfonia esculpida da dor e da destruição, eu quis acreditar que suas palavras assim como todas as outras que me haviam sido apresentadas, não passavam de jogos e mentiras arquitetados para a diversão alheia. Quando suas mãos se esticaram naquela noite e me envolvendo em um abraço forte prometeram que estava tudo bem, eu refleti sobre como a única vez que eu tinha a chance de dar um fim a tudo, meus dedos falharam no ato de com aquele caco de vidro, dar cabo dessa vida miserável.

Eu era uma vergonha, eu sabia disso, cada mísero segundo em que meus pulmões respiravam eu podia sentir isso. Em todo olhar amoroso que eu recebia de Otis, eu podia sentir aquelas vozes que me assombram todas as noites sussurrar em meus ouvidos sobre como o belo detetive me trairia na primeira chance que tivesse, em qualquer gesto de gentileza que eu recebia do belo e tão desconhecido homem eu esperava a mentira escorrendo por seus lábios.

Eu esperava tudo dele, desde o crepúsculo as trevas eternas, a cada noite aguardava a porta do meu quarto se abrir e sua sombra invadir o recinto atrás de pagamento por suas gentilezas. A cada manhã, ao encarar a escuridão da alma que se localizava do outro lado do espelho, eu esperava que ao ser lentamente engolido para suas entranhas toda a confusão desaparecesse, contudo, assim como a âncora que permite que o barco não se perca na infinidade do oceano, o pingente que Chanyeol me dera no natal era um eterno lembrete de suas palavras e do singelo pedido que ele havia me feito naquela noite.

"Não desista"

Do mesmo fogo de onde saíram as marcas que me causavam dor partiam, essas palavras pareciam vir como heróis desbravadores. E mesmo que durante dias eu tivesse encarado o teto do meu quarto, enquanto meus dedos passeavam pelas ranhuras da pata que tão bem era conhecida pelo meu toque, a imagem da dor que eu vi nos olhos do detetive naquela noite não pareciam possíveis de serem falsas.

Foi como se um espelho tivesse sido colocado na minha frente naquele momento. Enquanto suas palavras preenchiam o ambiente com pedidos e promessas que eu não me importava, meus olhos apenas estavam focados na imagem na minha frente, a dor que dançava por seu semblante parecia tão profunda quanto a que eu sentia, seus lábios se contraíram e eram mordidos em um gesto nervoso de um homem que não queria quebrar na frente de outro, pelo simples orgulho de não demonstrar que sentia o mesmo.

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