CAPÍTULO VI

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Depois do anúncio da volta do grupo, não houve uma entrevista sequer em que não tivessem que responder sobre a suposta briga entre elas. E desta vez não foi diferente. Houve, sim, um desentendimento, mas não pelo motivo que todos pareciam achar. Não se odiavam, muito pelo contrário. Mas preferem deixar os motivos de lado e responder da forma mais vaga possível, e torcer para que não pedissem mais detalhes.

"Tinha um climão entre vocês, não tinha?", o entrevistador pergunta.

As duas se entreolham e Fantine engole seco.

"Uma relação mal resolvida", ela responde.

Trata logo de mudar o rumo da conversa, antes que percebam e demandem explicações. Ela olha para Luciana, e encontra a mesma fitando-a com um misto de nostalgia e espanto no olhar. A resposta de Fantine parece tê-la pego de surpresa. Em todos esses anos, em meio a todos os rumores, Fantine jamais dera pistas do que as duas tiveram, ou pelo menos é o que gosta de pensar. Era preferível ler teorias de que se odiavam do que revelar a história que compartilharam, e correr o risco de fazer a vida de Luciana desabar. Se dependesse só dela, tudo isso já tinha sido revelado, afinal de contas não era nada do qual Fantine se envergonhasse. Era a sua trajetória e sua verdade. Mas quando pensa no que isso poderia implicar na vida de Luciana, pensa duas vezes e desiste da ideia. Era preferível sair como a vilã da história do que ver a mulher que ama ser afetada, mesmo que ela tenha escolhido estar nos braços de outro.

Entre uma entrevista e outra, Fantine se senta em um dos sofás confortáveis do lounge. Mal tem tempo de relaxar quando vê Aline andando rapidamente em sua direção, mãos na cintura e cara de quem tinha mil perguntas a fazer.

"Você tá melhor, Fantine?", seu tom era de quem perguntava já sabendo da resposta.

"Ah, estou sim. Obrigada", Fantine responde.

"O que foi que você sentiu?", Aline indaga. Fantine sentia como se estivesse sob um holofote.

"Me senti indisposta, só isso", ela desvia o olhar, e vê Luciana observando-as atentamente do outro lado da sala. Ao perceber o olhar de Fantine, sorri timidamente e desvia sua atenção para Li, que falava animadamente.

"Indisposta?", Aline pergunta.

Fantine havia previsto corretamente, a enxurrada de perguntas estava a caminho. Ela volta sua atenção para Aline, e percebe que a mesma havia seguido seu olhar até o outro lado da sala. Até Luciana. Abaixa a cabeça e sente seu rosto corar. Quando torna a olhar para Aline, ela traz um sorrisinho sabichão.

"Bom, acho que eu já entendi. Vou indo porque pelo visto não é comigo que você quer conversar", ela acena com a cabeça na direção de Luciana, que havia se levantado do sofá e vinha andando em seu encontro.

Aline se retira, sem dar chances de Fantine responder. Observa Luciana; seu vestido é preto e simples, mas ela parece brilhar nele. Seu rosto está bem maquiado e seus lábios estão pintados de um vermelho vivo. Está linda. Fantine lembra que Luciana nunca foi de usar muita maquiagem; preferia seu rosto natural. Fantine nunca revelara, mas a verdade é que ela também preferia. Lembra-se perfeitamente de como era olhar aquele rosto nu bem de perto e observar as sardas clarinhas que se espalhavam por ele. Quando estavam tão perto que podia acompanhar o movimento de seus cílios loiros.

"Posso sentar?", Luciana pergunta, apontando para o lugar vazio ao lado de Fantine.

"Claro, fica à vontade", Fantine responde, chegando um pouco para o lado para dar espaço à Luciana.

Ambas ficam em silêncio por alguns segundos, sem saber o que dizer.

"Uma relação mal resolvida?", Luciana pergunta.

"Desculpa. Eu sei que não deveria ter falado aquilo", Fantine diz, se virando e olhando nos olhos de Luciana, azuis como o mar. Como são lindos. "Vou ter mais cuidado da próxima vez, mas, se te serve de conforto, acho que ninguém percebeu".

Desta vez é Luciana quem desvia o olhar. Depois de todos esses anos, Fantine ainda exerce esse poder sobre ela. Seu olhar faz com que ela se sinta nua. Não fisicamente, mas na alma. É como se ela pudesse ver tudo que passa em sua cabeça através dos seus olhos.

"Me desculpa, mais uma vez. Pelo jeito que eu te tratei", Fantine quebra o silêncio. Luciana não a olha; mantém seu olhar fixo em suas mãos, que giravam distraidamente os anéis em seus dedos.

"Tá tudo bem", Luciana levanta o olhar até Fantine, que a olhava expectativamente, e sorri.

"Aqui", ela se vira e pega algo de dentro de sua bolsa. "Obrigada."

Estende a mão e entrega o casaco à Fantine. Suas mãos se tocam brevemente.

"Você realmente é uma criatura de hábitos", Luciana diz.

"O quê?", Fantine franze a testa.

"Seu perfume", ela diz, apontando para o casaco. "É o mesmo."

A observação deixa Fantine sem reação. Luciana confunde sua falta de resposta com desconforto, e seu sorriso se esvai. Fantine, ao perceber, responde rapidamente.

"É meu preferido", diz.

"Eu sei", Luciana dá um sorriso tímido.

Era impossível esquecer das vezes que aquele perfume ficara em sua pele depois de estar com Fantine.

"Podemos conversar? Hoje à noite?", Luciana toma a iniciativa, e os segundos que antecedem a resposta de Fantine são insuportáveis. Sua impulsividade ataca novamente e ela xinga mentalmente, temendo ter pressionado Fantine mais uma vez.

Fantine acena lentamente com a cabeça.

"Oito horas? Lá em casa?", Fantine propõe.

Luciana sorri e se levanta do sofá.

"Te vejo lá."

Veni, Vidi, AmaviOnde histórias criam vida. Descubra agora