CAPÍTULO XIII

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Qual a forma do tempo?

Para algumas pessoas o tempo era linear, sempre à frente, depressa. Forçava-nos a nos apressar em lugares onde gostaríamos de ter-nos demorado. Para outras, o tempo era circular. Tudo que ia, vinha, sempre da mesma forma. A primavera dava lugar ao verão que dava lugar ao outono que dava lugar ao inverno, que por sua vez dava lugar à primavera novamente. Mas eram essas duas formas que, combinadas, talvez criasse a forma real do tempo. O tempo é espiral. O dia se transforma em noite, que se transforma em dia; sempre o mesmo, e ainda assim, nenhum dia jamais será o mesmo. Avante. Às vezes podemos sentir que o tempo nos leva para longe de nossa origem, mas, se dermos apenas alguns passos, viraremos a esquina e veremos um lugar familiar. Apesar da vista ser familiar, ela jamais será idêntica. Sempre a mesma, sempre mudando.

Fantine acorda num sobressalto, com uma leve pressão sobre o lado esquerdo de seu corpo. Seu pescoço dói quando tenta virar o rosto e percebe que todos os músculos de seu corpo também doem, como se tivessem sido sobrecarregados de exercício. E foram. Seus olhos se ajustam lentamente à claridade do ambiente; estava nua, assim como o corpo entrelaçado ao seu. Haviam ido para o quarto em algum momento da noite, e a luz do sol filtrada pelas frestas da cortina persiana formavam padrões nas pernas entrelaçadas às suas. Luciana ainda dormia profundamente, sua respiração lenta assoprava uma mecha de cabelo loiro que estava sobre seu rosto.

Fantine afasta o cabelo de seu rosto e o põe atrás da orelha, sorrindo ao admirar a expressão quase angelical da mulher ao seu lado. Seus olhos estavam fechados, mas Fantine tinha gravado em sua mente seus múltiplos tons de azul, e a forma como seu sorriso chegava até eles, numa expressão quase infantil. Se os olhos eram o espelho da alma, os de Luciana refletiam toda a galáxia que carregava dentro de si.

Fantine se afaga no corpo de Luciana, o calor que emanava do corpo da outra mulher misturando-se ao seu, e Fantine planta beijos suaves em toda a extensão de seus ombros e seu pescoço, e ela sente Luciana despertar lentamente.

"Hmmmm, vou ficar mal acostumada acordando assim", Luciana diz, e ela sente os lábios de Fantine abrirem-se em um sorriso.

Ela se afasta, encostando a cabeça no travesseiro, seus rostos a meros centímetros de distância. Fantine observa os olhos atentos de Luciana percorrerem seu rosto, seu colo, e quando alcançam sua nudez, um leve rubor se espalha sobre seu rosto.

Fantine acha graça de sua timidez e a toma em seus braços. Luciana apoia o queixo no peito de Fantine e a observa, as memórias da noite anterior ainda vivas em sua mente. Luciana se entregava em tudo que fazia, e com Fantine não poderia ter sido diferente; se entregara física e emocionalmente para a mulher ao seu lado, e Fantine estava lá de braços abertos para recebê-la. Tudo havia se encaixado tão perfeitamente, que tinha medo que qualquer passo em falso pudesse fazer tudo desmoronar. Sabia que seus medos eram irracionais, afinal, um castelo que ficou 15 anos em construção não tomba com uma leve brisa.

"Para onde vamos a partir daqui, Fan?", Luciana pergunta, uma leve insegurança rastejando até sua mente.

Fantine acaricia seus cabelos distraidamente, e a pergunta de Luciana a faz sorrir. Já não conseguia imaginar a vida sem Luciana ao seu lado.

"Avante."

Luciana sorri e planta um beijo estalado em seu peito, suas mãos acariciando quaisquer partes do corpo de Fantine que pudesse alcançar. Sua pele era macia, e o sol da manhã que as aquecia deixara sua pele morna. Queria percorrer todo esse calor com seus lábios.

Luciana traça uma trilha de beijos pelo colo da outra mulher, e o calor de seus lábios a aquecia mais que o sol matinal.

"Fala holandês comigo", Luciana pede, com um sorriso travesso. Fantine finge estar pensativa com o que vai dizer, e Luciana ri. Ela já sabe o que vai dizer. As palavras que jamais imaginou que teria a chance de falar para Luciana.

"Ik heb je gemist." Cada frase era pontuada por um beijo em uma parte diferente do rosto de Luciana. "Van je ogen." Na bochecha, "Van je geur." No pescoço, "Van je mond." Em seus lábios. Luciana sorri.

"Olha, eu não entendi nada que você disse mas pelo jeito foi coisa boa!" Fantine não consegue se conter e ri.

"Não ri de mim!", Luciana diz, fazendo beicinho.

"Ok, senhorita! Desculpa!", Fantine diz, erguendo as mãos fingindo resignação, sua risada diminuindo, mas ainda sorrindo. O sorriso de diversão deu lugar a um que Luciana conhecia bem e que ela gostava de acreditar que era reservado só pra ela. Aquele sorriso meio de lado, os olhos brilhando. Era tão sexy e tão puro ao mesmo tempo.

"Eu disse", continua, desta vez séria e olhando profundamente nos olhos da outra mulher "que senti sua falta". Consegue sentir a respiração quente de Luciana em seu queixo, a cabeça ainda apoiada em seu peito. "Dos seus olhos", sua mão se ergue quase que por vontade própria e acaricia o rosto de Luciana, "do seu cheiro", suas mãos se entrelaçam entre cabelos loiros e seu olhar deixa os olhos azul celeste e encontram a boca rosada que se encontra entreaberta, "da sua boca".

A distância entre as duas mulheres é cortada por Luciana, que traz seu rosto para um beijo. Suas mãos exploram tudo ao mesmo tempo; ela quer tocar o máximo possível de Fantine caso esse momento acabe e tudo não passe de um sonho. Luciana sempre se sente assim quando a beija. Todo segundo com ela é precioso, e ela os aproveita como se nunca mais fosse tê-los novamente, embora soubesse que teria. Agora ela tinha essa certeza.

Estava finalmente de volta ao seu lar.

Veni, Vidi, AmaviOnde histórias criam vida. Descubra agora