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Wonwoo. -9° C

Não havia Natal sem meu lobo. Era a única época do ano em que eu sempre o tivera, uma presença silenciosa se demorando no início do bosque. Quantas vezes eu ficara à janela da cozinha, as mãos cheirando a gengibre, noz-moscada, pinheiro e centenas de outros odores de Natal, e sentira seu olhar em mim? Eu erguia os olhos e me deparava com Mingyu imóvel junto às primeiras árvores do bosque, os olhos dourados firmes e sem piscar.

Não naquele ano.

Fiquei parado à janela da cozinha, as mãos cheirando a nada. De que adiantava fazer biscoitos de Natal ou montar uma árvore aquele ano? Em 24 horas eu partiria numa viagem de duas semanas com Hoshi. Para alguma praia de areia branca da Flórida, bem longe de Mercy Falls. Bem longe do Bosque da Fronteira e, o mais importante, bem longe daquele quintal vazio.

Enxaguei lentamente minha caneca térmica e, pela milésima vez naquele inverno, levantei os olhos para olhar para o bosque.

Nada havia ali além de árvores em tons de cinza, os galhos carregados de neve recortados contra um pesado céu de inverno. A única cor era o lampejo brilhante de um cardeal macho, voando para o comedouro dos pássaros. Ele empoleirou-se na base de madeira vazia antes de levantar voo, uma mancha vermelha contra o céu branco.

Eu não queria ir para o quintal com sua neve sem marcas, as pegadas ausentes, mas também não queria deixar o comedouro dos pássaros vazio enquanto eu estivesse fora. Pegando o saco de sementes debaixo da pia, vesti o casaco, pus uma touca e as luvas. Fui até a porta dos fundos e a abri.

O cheiro do bosque no inverno me atingiu com força, me lembrando ferozmente de cada Natal que tinha importado alguma coisa.

Mesmo sabendo que estava sozinho, eu ainda sentia calafrios.

CalafrioOnde histórias criam vida. Descubra agora