Enquanto caminhamos pela floresta, o Harley decide quebrar o silêncio.
- Kiara, como é que foste parar àquela carrinha?
-É uma longa história... - digo olhando para baixo
Falar do motivo pelo qual estou a fazer isto causa-me alguma tristeza. Não quero ter de partilhar o porquê de o estar a fazer. Não deveria ser assim! Não deveríamos ter de fugir para que nos sintamos alguém.
O Harley interrompe os meus pensamentos.
- O que te faz não quereres contar?
- Porque não quero falar nisso - sai mais agressivo do que quero - Porque não contas tu o porquê de também teres chegado àquela carrinha?
- Bem, eu na verdade também saí de ca...casa - diz gaguejando e com olhar melancólico - os meus pais não querem que eu seja escritor. Gostariam que eu fosse antes um médico ou um advogado de topo - A imagem do Harley sentado numa secretária, de caneta em punho, a escrever livros, passa pela minha cabeça por breves instantes e percebo que nunca teria imaginado tal cenário sem que o Harley tivesse mencionado o seu gosto pela escrita - como não aceitei a decisão decidiram tratar-me como se eu fosse algum erro de laboratório. - trava a fundo inspirando um trago de ar - trancavam-me no quarto a pão e água e... - o silêncio instala-se no momento em que o Harley decide suspirar fundo, como se estivesse a conter algo dentro de si. Talvez o choro. Talvez a dor. - o meu pai pontapeava-me com toda a força que sentia ser possível. - sinto a minha alma cair junto dos meus pés.
- Isso é horrível! - é tudo o que sai da minha boca. Sinto as minhas forças a serem sugadas a cada passada.
- Ya - escapasse uma lágrima carregada dos seus olhos e, antes que ela possa acabar de rolar pela sua face eu direcciono o meu corpo para a sua frente, impedindo-lhe a passagem.
Assim que seguro o seu rosto, observo os seus olhos injectados de sangue. Provavelmente tem estado a conter o choro há muito mais tempo do que penso - Não deixo que te voltem a magoar, prometo! - ''okey, Kiara, o que acabaste de dizer?''
O Harley dá uma pequena risada, enquanto limpa a lágrima do seu rosto - também não deixo que te façam mal...prometo - um abraço sai do meu corpo.
Apercebo-me de que o tempo ''base'' de um abraço se começa a aproximar e afasto o meu corpo voltando à posição inicial.
Seguimos floresta fora, ao som dos pássaros, até que o Harley trás de novo o assunto da minha fuga. Porque é que ele tem de ser tão curioso?
- Kiara, agora que te contei o motivo porque saí de casa...não me queres contar o teu?
Não me sinto em condições de negar, tendo em conta o que ele acabou de me contar e a confiança que depositou em mim para o fazer - Tudo bem. Eu conto, mas tens de prometer que, independentemente do que acontecer daqui para a frente, não falas nada disto a ninguém e muito menos que me viste!
-Prometo - diz, olhando para mim e de novo para o caminho trilhado.
- Eu fugi de casa por não me sentir eu naquele sítio. Sinto que tenho de agradar a todos e para isso ponho de lado a pessoa que realmente sou. Estando eu em casa ou na escola era igual para os meus pais. Era como se fosse uma criança em que nada do que dizia era levado a sério, como se não existisse. Falavam de mim como se fosse uma falhada, como se não tivessem motivos para se orgulharem de mim. Eu era sempre ''a outra'' que infelizmente tinha nascido e... - Não consigo terminar. Olho para baixo, fechando os olhos tentando esconder o líquido que flui dos meus olhos. Sinto um dedo quente acariciar a minha bochecha esquerda, levando consigo uma das minhas lágrimas.
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Breathe
RomanceKiara Cooper, uma adolescênte de 17 anos, que apesar da sua ingenuidade, sente-se demasiado presa à sua forma de ser a que foi estipulada e à falta de liberdade para exprimir as suas próprias opiniões. Acaba por fugir de casa numa noite de Inverno...