Capítulo dez

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Hora do pesadelo

O som de seus passos ecoava na sensibilidade do líquido no chão, caminhava em uma pequena poça escarlate. Não conseguia avaliar a podridão que estaria seus tênis agora, pois a escuridão, apesar de não ser total, impedia a identificação de qualquer coisa que estivesse a mais de trinta centímetros dos seus olhos.

O silêncio era torturante, mas ainda assim quando barulhos surgiam ela preferia que desaparecessem. Geralmente vinham em forma de passos que a seguiam, mas assim que ela parava para notar a presença de algo perto, os passos também paravam.

Às vezes o barulho vinha em forma de gemidos baixos de salas distantes, portas que escondiam cultos em seu interior, reuniões que jamais deveriam ser interrompidas. Nestes momentos, Nina afastava-se ainda mais.

Quando foi, não uma, mas duas vezes alertada sobre os perigos que ali continha, não levou tão a sério quanto deveria. Estava na parte mais escura de sua mente. É claro que ela não entendia nada disso, mas assim que degustou os primeiros passos naquele limbo cerebral se arrependeu dramaticamente por ter entrado.

Ali estavam todos os pensamentos descartáveis, inúteis e esquecidos por ela, a manifestação de total desgosto e lembranças boas que foram distorcidas em memórias ruins. A podridão que receava expressar em voz alta.

Mas Nina não poderia se tornar parte daquele cenário drástico, precisava seguir com sua jornada para sobrevivência. Por isso continuou caminhando na poça enquanto desviava de paredes laterais pegajosas e ignorava os chamados macabros da escuridão.

Um pequeno fecho de luz natural surgiu na fresta de um buraco lamacento da parede, como um assobio calmo numa manhã morna.

As batidas no peito da garota se intensificaram, seu coração havia acelerado, mas mesmo sua vontade foi espremida pela cautela em aproximar-se de território desconhecido sozinha e sem proteção, nem ela era tão ingênua.

Abriu espaço entre as paredes gelatinosas que impediam a entrada de luz e conforme a luminosidade passava a adentrar mais o ambiente, a gosma ficava ainda mais pegajosa, impossibilitando movimentos flexíveis. Nina percebeu a mudança, não se deixou consumir pelo desespero, mas agiu rápido. Começou a utilizar mais força para sair de perto do ambiente macabro, a luz já estava consideravelmente alta no ambiente e ela via janelas grandes não muito longe dela. Um corredor cinza vazio e portas de madeiras simples de cor marrom claro com pequenas placas com escritas indecifráveis naquela distância. Mas assim que avistou placas de sinalização próximas às grandes lâmpadas cilíndricas que emitiam luz branca, percebeu que se tratava de uma escola. Parando para pensar bem, as peças começavam a se encaixar, aquela era sua antiga escola!

Será que tem alguém perto?

— Socorro! Eu preciso de ajuda!

Sua voz fina não tinha um alcance alto e nenhuma sombra sequer se moveu de lugar. Nina estava ficando sem força e sentia que estava sendo puxada de volta para dentro da escuridão macabra, não estava mais somente ficando mais e mais presa às pegajosas paredes, não, elas agora pareciam estar puxando-a, como os mares do oceano. Quando se sentiu debilitada demais para continuar, caiu de joelhos no chão. Seria aquela a entidade maligna do qual Tecladinho falara?

Seu corpo estava quase todo preso agora pelo material misterioso que assumia vida. Braços e pernas quase completamente tampados, quando chegou até a altura do seu ombro, deixando somente o rosto de fora, uma reação inesperada toma conta da gosma. Ela simplesmente se recolhe rapidamente como uma cobra vomitando sua vítima de volta para terra, e tudo aconteceu tão rápido que Nina não teve os reflexos necessários para se manter de joelho e acabou desabando de cara no chão.

O Conto de NinaOnde histórias criam vida. Descubra agora