CAPÍTULO QUATORZE: "PODRES PODERES"

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Coautora: AngiieCS

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7 de agosto de 1979.

Os meses foram se passando, e o meu relacionamento com Ciro foi se desenvolvendo mais e mais. Houve uma grande evolução, já que somos parecidos praticamente em quase tudo. Sem sombra de dúvida, Ciro é a pessoa perfeita para mim.

Hoje iremos nos reunir junto ao povo para uma revolta, como prometido com a UNE há um tempo atrás. O objetivo é chamar atenção do governo militar já que temos nossos direitos roubados; vivemos uma farsa.

Bem... Eu estou um pouco nervoso com o que isso resultará, pois me preocupo muito com meus parceiros... Não ponho tanta confiança, mas mesmo assim irei em frente.

Seguir com o plano é a prioridade, mas não posso negar que um mal pressentimento me consome por dentro, desde do dia da reunião na UNE...

Observo Ciro com preocupação, mal consigo esconder que estou com o coração saltando no peito, tentando subir por minha garganta.

Estou muito bem ciente de que ele nota que não estou feliz ou seguro, porém estamos tentando aparentar calma, estar sob o controle de tudo... Não sei por quanto tempo essa tecnica irá funcionar, sinceramente.

Além de Ciro, estamos reunidos com Ruy e os nossos vários colegas. Quase todos envolvidos na UNE estão conosco, entre outros ativistas, prontos para mais um desafio.

Obviamente Ruy nos comandaria, e eu não o subestimo, pois é um homem de respeito, de se confiar. Fui percebendo isso com o nosso tempo de convivência.

Nosso líder se prepara para pronunciar seu discurso antes que comecemos a nossa manifestação. Ele espera silêncio absoluto do público para começar a falar, tentando ser o mais calmo possível para que o povo siga seu exemplo.

— Agora é o momento, meus amigos e amigas. — ele olha em seu redor, atento a nós. — Tomem cuidado com o que está vindo pela frente, temos que ficar juntos. Não soltem as mãos de nossos aliados, e vamos juntos pela democracia!

— Por um Brasil grande novamente! — gritamos todos juntos, dando início ao nosso ato.

Começamos a caminhar juntos, sem justamente um rumo, mas cheios de esperança, apesar do medo. Em meu lado está Ciro, cheio de atenção e de determinação. Ele me olha e abri um sorriso, pegando em minha mão e a acariciando. Eu aceno com a cabeça, abrindo um sorriso fraco e cheio de nervosismo.

Sinto o sangue subindo a cabeça e o calor esquentanto minha pele. Algo me faz tremer em um arrepio e sinto minha nuca arder, como se queimasse por dentro.

Ouvimos a cavalaria militar se aproximando, o som dos galopes aumentando em nossos ouvidos quase ensurdecedoramente.

A adrenalina começa a correr em meu corpo e seguro a mão de Ciro um pouco mais forte. Algo ruim se aproxima, consigo sentir.

Me inclino sobre o ombro direito dele e suspiro quase sem voz.

— Não me solte...

A rua logo se torna mais movimentada e barulhenta, mas ainda assim organizada como o combinado. Além do mais, atos como esses não muito tolerados pelos militares, mas mesmo assim o faremos; não seremos impedidos.

Somos parados por um grupo de militares armados, ainda sem nenhum tipo de agressividade, um milgare.

— É melhor vocês saírem daqui antes que aconteça algo miserável. — um deles pôs-se a falar, dando um aviso. — Dou-lhes uma chance.

Ruy tenta nos acalmar, movimentando os braços de cima para baixo no ar lentamente, sem pronunciar algo. Provavelmente não havia encontrado as palavras perfeitas para usar nesse momento.

Com tudo isso, resolvi me manifestar, tentando ser cauteloso. Não pensei muito no que pronunciar, mas fui em frente, pois precisava dar um tempo a Ruy.

Tudo ficou muito confuso e nublado em minha memória. Escuto Ciro resmungar, escuto o galopar da cavalaria. Os militares avançam sobre a multidão e, inevitavelmente, solto a mão de Ciro em meio a confusão.

Sinto algo acertar minha nuca com toda a força e simplesmente apago. Daí, o pesadelo começa para mim. Para nós dois.

***

Quando desperto, estou meio vivo, meio morto, no meio fio da rua. Ruy está comigo, mas a rua está vazia agora. Panfletos e sangue sujando o asfalto. Mal consigo me mover, a dor latente na parte de trás de minha cabeça é agoniante.

— Fernando? Como você está?

— O-Onde está Ciro? — pergunto instintivamente, depois de longos minutos em silêncio, tentando juntar as palavras propriamente.

Ruy toma um longo suspiro, como se não desejasse falar o que devia ser dito.

— O camburão o levou, Fernando.

Sua fala foi como um tiro para mim, um tanto agonizante. Agora a única coisa que resta em mim é ansiedade... e o medo de perder uma das pessoas que mais amo para sempre.

— O QUE?! — abro os olhos com surpresa, assustado.

— É isso mesmo que você ouviu. — ele fala com certa frieza, triste. — Além dele, foi levado outros 11 militantes.

— Então... — digo um pouco confuso, tentando fazer com que tudo entre na minha cabeça de forma clara. - O que iremos fazer agora?

— Bom... Podemos fazer uma visita a ele daqui um tempo, se for autorizado.

— Iremos. — disse confiante, tentando deixar toda essa ansiedade de lado. — Temos que falar com os militares.

Amor Recíproco | Ciro & HaddadOnde histórias criam vida. Descubra agora