Quase duas horas de atraso. Isso é algo que se faz a uma amiga? Parece que o universo está constantemente testando a paciência de Juliana.
Ela aguarda a amiga devolver o livro que precisa para o trabalho de amanhã na faculdade. Além de fazer o trabalho, ainda hoje precisa ir ao supermercado, depois pegar o resultado de exame da mãe, comprar remédio e buscar o sobrinho na escola. Isso tudo antes das cinco. E sua amiga atrasada. Quase duas horas ali naquele banco.
Se fosse um caso isolado, tudo bem, mas não, isso acontece sempre. Ela sente que ninguém se importa de fato com ela, por mais que se esforce.
Foi a mesma sensação quando emprestou a caixinha de transporte do cachorro pra prima, mesmo precisando da caixa ela só devolveu dois meses depois. Ou quando emprestou dinheiro ao namorado mesmo com o boleto da internet atrasado e até hoje nada. Teve a vez em que faltou a entrevista de emprego para atender o pedido de socorro da prima desesperada que na verdade só estava bêbada e carente. E agora que emprestou o livro pra amiga, mesmo precisando dele pra fazer o trabalho e nada dela aparecer.
Quase duas horas de atraso. Uma hora atrás ela disse que já estava chegando.
Juliana é a pessoa mais azarada do mundo, só pode. Olha aí todo mundo indo pra lá e pra cá. Olha aí esse povo todo feliz, fazendo suas coisas, viajando, trocando afetos. E ela ali, parada naquele banco fazendo tudo que pode por eles e nada recebe. Muito pelo contrário, ela é a filha ingrata, a amiga traíra, a namorada dramática, a aluna preguiçosa, a prima pessimista, aquela moça mal humorada. É o que dizem enquanto ela espera ali, sentada no banco a quase duas horas.
Quando é que virá a recompensa de todo este esforço pelo bem dos outros? Juliana aguarda, sentada.
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Contos de Elle Amy
General FictionUma foto, uma ilustração e um texto. Explorações de narrativas focadas em personagens do cotidiano.