Dorothea está tão surpresa quanto eu. Alina nunca lhe contou sobre aquele episódio de seu bisavô. Nem a família dela... Pela primeira vez eu a vejo chateada.
E isso não é surpreendente. Herr Muler deixou o cemitério com o rabo entre as pernas e nunca mais falou de Emil em sua casa. Ele colocou todas as coisas de seu filho em uma mala e trancou-o em um armário.
Nessa mala, lembram?
Herr Muler não pôde enterrar seu filho onde ele queria, mas tentou enterrar sua memória. Uma lembrança que hoje, finalmente, vem à tona, para sua neta, para mim e para todos vocês.
O relógio da sala mostra doze horas. É hora de ir. Eu me despeço de Alina e ela me dá um abraço que cheira a donuts e conhaque. Espero com todo o coração que nos vejamos novamente um dia.
Uma vez na rua, Dorothea se oferece para me acompanhar até a rodoviária, mas eu rejeito o convite. Eu tenho algo importante para fazer antes. Preciso fazer isso sozinho. Digo adeus a ela com um beijo na bochecha e ela cora.
Caminho para o túnel de escadas que leva à Igreja da Colina. Subo as escadas. Passo pelo instituto e tenho a sensação de que muitos fantasmas estão me observando de suas janelas.
Não demora e já estou no memorial.
Fico em frente ao túmulo de Emil e Xaver de uma maneira quase cerimonial. Acho difícil acreditar que estive lá no dia anterior. Parece que um século se passou.
Respiro profundamente. Olho para a lápide. E leio seus nomes de novo e de novo. Emil & Xaver, Xaver & Emil.
Olho em volta. Nada mudou, mas nada é igual.
Fico em silêncio por um longo tempo.Mas o silêncio não é assim.O vento dos séculos sussurra segredos no meu ouvido.
Pareço ouvir o riso de duas crianças de 16 anos que fugiram da aula. Que se escondem atrás de lápides no cemitério para fumar um cigarro. Que aquecem as mãos com a respiração um do outro. Que se olham nos olhos para descobrir neles uma explosão de esperança.
Que dão seu primeiro beijo. Um beijo que contém toda a felicidade de que sonhos compartilhados são feitos. Um beijo que entrelaça suas almas para sempre. Um beijo cheio de um amor que, por um momento, faz com que se sintam imortais.
Naquele momento, coloquei minha mão na pedra congelada. E com um fio de voz, quase como numa oração, eu digo:
"A história de vocês foi contada."
FIM!
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Emil & Xaver
RomanceA história a seguir é sobre o mistério que está por trás de uma lápide onde jazem dois soldados do Império Austro-Húngaro que lutaram e morreram na Primeira Guerra Mundial... e foram enterrados... juntos. PS: Essa história foi publicada originalment...