― Chegamos ― anunciou o rapaz, quando a dupla já se deparava com uma clareira nevada no meio da floresta. De onde estavam, viam um grande círculo branco se formar por entre o tom verdejante de toda uma série de pinheiros de natal, um pequeno chalé despontando no meio como um barquinho no oceano.
Espantada de súbito, Sebastiana tinha os olhos nas árvores do lugar, que, tristes e apagadas, não tinham estrela alguma lhe concedendo magia. Era uma visão depressiva, aquela: como se, no coração do natal, o natal houvesse, de alguma forma, faltado. Como se a alegria e a felicidade fossem não mais.
― Remi? Remi! Isso são horas de você aparecer, garoto? ― uma voz bruta despontou bem de perto do chalé no centro da clareira, no que a dupla de duendes caminhava, intimada, àquela direção. Tirando o olhar das árvores desfalcadas, Noelo viu aparecer um duende barrigudo vindo para perto.
Era um cara um tanto mais alto do que duendes geralmente conseguiam ser, quem vinha, portando um chapéu cor de tronco na cabeça e um meio bigode que desistia de existir bem no meio.
― E quem é essa moçoila? ― quis saber o duende, indignado, quando todos já podiam se encarar bem de perto.
Rômulo engoliu em seco.
― Mestre Breterram, esta é Sebastiana, minha... minha amiga ― respondeu o rapaz, suficientemente encabulado para que Breterram olhasse estranho para Noelo.
― E o que essa tal Sebastiana está fazendo aqui? ― indagou.
E os globos oculares de Remi foram parar direto na neve onde o trio pisava. Sebastiana sentiu o desconforto comer-lhe por dentro, os dedos formigando, mas preferiu olhar Breterram direto nos olhos.
― Sou investigadora da Intrépida Guarda, meu senhor ― respondeu ela, de cabeça erguida. ― Venho aqui para averiguar o caso das estrelas de natal roubadas.
A cara de Breterram era a de quem acabara de ser atropelado por uma rena desgovernada enquanto esta era guiada por uma fada sem asas cega muito atrasada para chegar a uma festa de não-gala. Era a cara de quem viu a Mamãe Noel terminar com o Papai Noel e se mudar para uma dimensão onde o Natal fosse proibido. Era a cara de quem abre a caixa de presente na manhã de Natal e tira de lá uma pedra bem preta e fedorenta de carvão. A cara de quem não acreditava no que estava vendo. De quem não acreditava no que estava ouvindo. De quem achava graça.
― Você? Investigadora da Intrépida Guarda? Rá, rá! Conta outra, minha jovem. Já não basta eu ter de lidar com o desastrado do Remi, agora essa! Esse mundo já não é mais o mesmo, e não é por falta de aviso. Ai, ai. Mas ande logo, menina. Diga o que veio fazer aqui de verdade. O oficial da Intrépida Guarda apareceu aqui ontem, logo não haveria motivo para que outro viesse me importunar... Ainda mais hoje, que estou com pressa.
Cruzando os braços como se o duende tivesse acabado de vomitar sopa em suas roupas, Sebastiana encarou-o de baixo para cima, olhos estreitos e postura rígida.
― Escute aqui, meu senhor. O que estou lhe dizendo é a mais pura verdade e, caso não queira acreditar em mim por conta dessa sua visão de mundo sem sentido, espero que isto possa vir a ajudar. ― E ela ergueu na cara do duende um distintivo cintilante de oficial da Intrépida Guarda Real do Polo Norte. De pronto, que nem mágica, Breterram deu um passo para trás. ― Está vendo? Sou quem digo ser. Compreende?
Assustado como um rato, o duende alto fez que sim com a cabeça, tirando dela seu gorro para revelar sua careca lisa. Parecia outro duende completamente, de repente, e Sebastiana achou isso formidável, só para variar um pouco as equações. A moçoila nem desconfiava do poder que tinha aquele distintivo, mas finalmente começava a enxergá-lo ao certo: era quase como se a Intrépida Guarda existisse acima da lei, como se eles pudessem fazer de tudo. Interessante.
― Ora, é claro que compreendo o que a senhorita diz ― disse Breterram, forçando um sorriso. ― Eu só estava um pouco acometido pela pressa quando disse aquelas coisas, entende? Preciso estar na Estação Interdimensional em poucas horas, pois tenho uma viagem importante, e estava esperando seu amigo Remi aparecer para que ele pudesse cuidar das coisas enquanto me ausento. Tenho certeza que a senhorita pode perdoar a minha rudez.
Achando razoáveis as palavras do duende, Sebastiana decidiu que era bom fazer que sim, no que o sorriso do outro se transformou num sorriso de verdade.
― Antes de o senhor ir, contudo ― ela falou, confortável nas próprias botas. ― Quero que reúna pra mim seus funcionários, para que eu possa questioná-los sobre o que eles sabem acerca do roubo das estrelas. Creio que não será nenhum incômodo para o senhor providenciar esse pequeno favor, certo?
Parecendo incomodado com algo, porém ainda sorridente, Breterram fez que sim com a cabeça.
― Mas é claro, senhorita. Mas é claro.
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O Paradeiro das Estrelas
FantasyA população de Polo Norte entra em desespero quando estrelas do natal são roubadas na calada da noite, no que dois elfos azarados se vêem numa inquietante investigação pela misteriosa Floresta Áurea. Afinal, haverá uma conspiração enganando a todos...