Cidade

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Seis meses. Já faziam seis meses que eu me torturava a viver sem ele. Lembro daquele dia como se fosse ontem:

Eu estava no sofá, de pijama, a xícara de café preto e amargo nas mãos. Agora era resultado de avanços e retrocessos, uma verdadeira média.

Minha mãe sentou ao meu lado e parecia insegura. Ela queria me pedir algo, eu podia perceber pela maneira como olhava de mim para a televisão e fazia o caminho inverso.

- Pode pedir, mãe. - Falei tomando outro gole de café.

- Ah... você sabe que estamos no mês de férias para as crianças, certo? - Ela perguntou como se fizesse todo o sentido.

- Como assim?

- Lembra que seu irmão adotou uma garotinha, a Luísa, há quase oito meses?

Fechei os olhos com força. Não, eu não lembrava, assim como não lembrava do resto do mundo também.

- Sim, lembro. - Menti por educação. - E o que tem isso?

- Ela vai passar duas semanas com a gente, aqui em casa.

- Quê?

- É. - Exibiu um sorriso amarelo. - Ela chega hoje, mas não vou poder buscá-la no aeroporto. Você poderia... ir no meu lugar?

Tentei não demonstrar espanto. Minha mãe estava, realmente, me pedindo para sair de casa? A minha resposta era: não. "Não quero".

Mas isso seria injusto. Nos últimos seis meses ela havia se dedicado muito a mim, e se preocupado bastante... aliás, nos últimos 25 anos. Tudo o que me pedia era para que eu fosse buscar a neta, que ela ainda não conhecia pessoalmente, no aeroporto. Como eu poderia me negar?

- Posso sim. - Bebi mais do meu café.

Quando o relógio marcou duas horas da tarde eu estava no elevador, em direção ao térreo. Poderia ir até o estacionamento e dirigir até o aeroporto, mas optei por ir de táxi.

Meu primeiro passo fora do prédio fez todo meu corpo tremer. Eu tinha observado o mundo por trás das janelas nos últimos seis meses, era estranho, e quase reconfortante, vê-lo de perto outra vez.

Já estava esquecendo o motivo de ter me escondido por tanto tempo, até que vi o restaurante onde ele me pediu em casamento, e tudo voltou. Tive vontade de mandar o motorista dar meia volta, para que eu pudesse voltar a chorar no meu travesseiro, no escuro do meu quarto, atrás das janelas outra vez.

Mas não fiz isso. Precisava buscar a menina no aeroporto. Prometi à minha mãe e ela contava comigo.

Não Espere Por Mim, AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora