Dores

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Levantei com muita raiva. Sentindo que meu pé afundaria no assoalho, de tão forte que pisava. Abri a porta tão bruscamente, que assustei a menina.

Ignorei-a e segui pisando forte até a cozinha. Peguei a geléia, e isso teria sido suficiente, mas precisei gritar:

- Tá aqui a droga da sua geléia!

Quando dei por mim Luísa me encarava chorando e o rosto começava a ficar vermelho.

- Eu também não quero estar aqui! - Gritou de volta. - Odeio ter que estar aqui! Odeio que seu irmão tenha me mandado para cá! Odeio ter que ser adotada e intrusa! Odeio que minha mãe tenha morrido há três meses! Odeio, odeio, odeio! Odeio você! Sua família! Me odeio! Odeio tudo isso! Odeio ter que existir!

Quando terminou seu discurso cheio de ódio e lágrimas, Luísa jogou-se de joelhos no chão, logo após encolheu-se. Chorava tão alto que seria possível ouvir nas casas vizinhas.

E enquanto tudo isso acontecia, eu só conseguia observar.

Observei por longos minutos, até que os soluços diminuíram e eu finalmente consegui me mover.

- Luísa, eu...

- Não! - Gritou ainda encolhida. - Não diga que entende! Seja má, grite comigo, me xingue! Mas não minta sobre saber o que estou sentindo!

Outra vez fui pega desprevenida. Porém, dessa vez, me ajoelhei e a levantei para que também ficasse de joelhos.

- Eu entendo. De verdade. Meu marido morreu há seis meses. - Doeu como esfaquear um corte em processo de cicatrização. - Estou morrendo junto há exatos seis meses. Sei exatamente o que você sente.

- Não, não sabe. - Os soluços atrapalhavam a fala. - Você perdeu alguém substituível! Eu perdi minha mãe! Você ainda tem sua família, eu não. Não tenho nada! De um dia para o outro perdi ela e tudo! Sou adotada agora. Uma filha intrusa. E não a tenho mais. Não tenho mais minha mãe.

Eu quis dizê-la que não, que ele não era substituível. Mas optei por abraçá-la. Achei que ela não precisava de uma guerra sobre qual dor era maior, achei que ela só precisasse de um abraço naquele momento.

Não Espere Por Mim, AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora